Ir à Suíça para dizer como está o Brasil de hoje, isso não
faz sentido. Dilma Rousseff choveu, não no molhado, mas em uma inundação digna
de São Paulo. Os endinheirados a quem a presidente pediu investimentos
ocupam-se de ganhar dinheiro pelo mundo afora, o que lhes exige, e aos seus
assessores, estar bem informados para detectar oportunidades. No convescote dos
cifrões, mal denominado Fórum Econômico Mundial, por certo muitos sabiam sobre
o Brasil o que nem no Brasil se sabe.
A Dilma Rousseff que foi a Davos não é a Dilma Rousseff que
chegou à Presidência. Não é o oposto, mas é bastante diferente. Se nos
princípios ou nos fins, eis a questão. Fernando Henrique e Lula, mal ouviram
falar em Davos e seu pessoal, começaram a preparar as malas. A ida de Dilma, só
agora no ano final do mandato, reflete dupla concessão. Uma, na concepção de
políticas governamentais que a levavam a desconsiderar Davos, convicta de um
Brasil capaz de cuidar de si mesmo. Outra, no seu diagnóstico do momento vivido
pelo país e, em particular, pelo governo.
O capital estrangeiro -os cifrões de Davos- não precisa ser
buscado. Grandes indústrias automobilísticas não param de vir para cá, e as já
instaladas não cessam novos investimentos para crescer. Indústria e comércio de
alimentos, agronegócio, aquisições fundiárias, exploração e indústria
petrolíferas, as concessões/privatizações, são muitos os setores que têm
merecido a procura espontânea do capital estrangeiro. O problema é que grande
parte desse investimento não se destina à criação de novas atividades
econômicas, ou seja, ao crescimento econômico, mas a assumir o controle
acionário ou a propriedade de empreendimentos já ativos. É a chamada
desnacionalização.
O capital graúdo não é considerado, em geral, o grande
disseminador do crescimento econômico. Este vem pela multiplicação dos
empreendimentos, mesmo os pequenos, e pelo reinvestimento do lucro, para
ampliação do negócio. O dinheiro para empreender, porém, é muito caro no
Brasil, com a tradição crescentemente escorchante praticada pelo sistema
bancário. Além das exigências de garantias, dos prazos insuficientes e outras
dificuldades.
E o reinvestimento na indústria nacional já consolidada, ah,
esse tem um adversário terrível: o próprio empresário. Como regra natural,
lerdo, retardatário, incapaz de inovação, pedinte permanente de benesses do
governo, esse empresário trata de investir o lucro é em si mesmo: moradia nova,
carro de luxo, e todo o necessário ao exibicionismo de mais um novo rico. O
empresário brasileiro é, em geral, um atrasado -como pessoa e como dirigente de
empresa.
Mudar essa realidade interna era um objetivo implícito nas palavras
e na ação da Dilma Rousseff que assumiu a Presidência. Bem, quanto à atual,
ceder aos interesses de aumento dos juros já era estar no caminho para Davos.
Janio de Freitas, colunista e membro do Conselho Editorial
da Folha, é um dos mais importantes jornalistas brasileiros. Analisa com
perspicácia e ousadia as questões políticas e econômicas. Escreve aos domingos,
terças e quintas-feiras na Folha de S.Paulo.
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