Do Blog do Noblat, O GLOBO
Para livrar-se do escândalo do mensalão em 2005, o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva entregou a cabeça do ex-ministro José
Dirceu, o coordenador de sua campanha vitoriosa à Presidência da República.
Para livrar-se do escândalo dos aloprados, quando assessores
seus forjaram, em 2006, documentos contra o PSDB, ele entregou as cabeças que
pôde, inclusive a do coordenador de sua campanha à reeleição, Ricardo Berzoini.
Pouco antes, havia entregado a cabeça do ex-ministro da
Fazenda Antonio Palocci quando restou provado que a máquina do seu governo fora
usada para quebrar o sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa.
Nada demais, pois, que Lula tenha se valido de sua mulher,
Marisa Letícia, para livrar-se da acusação de que ganhara o tríplex do Guarujá
como uma espécie de propina paga pela construtora OAS. Maria Letícia está
morta.
Foi tudo obra dela, segundo Lula. Foi ela que quis comprar o
tríplex — ele, não. Quando visitou o apartamento, enxergou nele mais de 500
defeitos. Mesmo assim, ela insistiu em comprar para fazer investimento, ele
não.
Marisa visitou o apartamento pelo menos duas vezes, lembrou
o juiz Sérgio Moro. Lula retrucou que nunca soube da segunda visita. Admitiu
tê-la acompanhado na primeira, da qual há registro fotográfico.
Moro perguntou sobre a reforma do apartamento, que ganhou
cozinha moderna, um elevador e outras melhorias feitas pela OAS. Lula afirmou
que não encomendou nenhuma reforma. Foi coisa de Marisa, portanto.
Diante da insistência do juiz em arrancar-lhe respostas mais
precisas e detalhadas, Lula novamente invocou Marisa: “Perguntar coisa para mim
de uma pessoa que já morreu é muito difícil, sabe? É muito difícil”.
O Lula eloquente, imbatível quando desafiado, dono de um
estoque inesgotável de frases prontas, deu lugar a um Lula reticente, quase
monossilábico em certos momentos, que tentava disfarçar o nervosismo.
Cobrou provas da acusação que pesa contra ele no processo.
Mas, quando uma delas foi apresentada, desconversou. Moro perguntou sobre um
documento rasurado de compra do tríplex encontrado no seu apartamento.
Lula respondeu: “Não sei, quem rasurou? Eu também gostaria
de saber”. E sobre o documento em si? Lula respondeu: “Não sei, nunca soube”.
Consultou rapidamente o documento e o devolveu ao juiz.
A OAS pagou o armazenamento dos pertences de Lula depois que
ele deixou o poder. Foi coisa de Paulo Okamoto, presidente do Instituto Lula,
garantiu o ex-presidente. Ele só soube disso muito mais tarde.
Moro não perguntou por que Lula aceitou que a construtora
pagasse uma despesa que somente a ele, Lula, caberia pagar. Foi um favor? Foi
propina? Foi uma maneira de agradecer pelos contratos que firmou com o governo?
Um interrogatório como o de ontem serve como peça de defesa
do réu. Mas serve também ao juiz para ajudá-lo a formar sua própria convicção a
respeito da inocência ou da culpa do réu. Como peça de defesa, foi pífio.
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