Editorial O Estado de S.Paulo
Como se tem visto, o debate sobre a reforma da Previdência
atiça intensas paixões políticas. Tal cenário pode dar a entender que se trata
de um tema profundamente controverso, que dividiria a população. É certo que a
discussão, por envolver quando e quanto cada um receberá de aposentadoria,
dificilmente deixa espaço para a indiferença. A controvérsia arrefece-se, no
entanto, quando se analisam os dados relativos à Previdência. O clima de
polêmica cede lugar à razão quando são apresentados números cristalinos, que
atestam pacificamente a necessidade de uma profunda reforma das regras
previdenciárias.
O primeiro dado a confirmar a necessidade de o Congresso
aprovar a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 287/2016 é o crescente
déficit da Previdência. Em 2016, o rombo causado pela Previdência nas contas da
União, dos Estados e dos municípios foi de R$ 305,4 bilhões. Longe de ser
temporário, esse desequilíbrio é estrutural e só tende a crescer, em razão do
envelhecimento da população.
É ponto pacífico que o Estado brasileiro não tem condições
de cobrir anualmente rombo dessa dimensão e, ao mesmo tempo, realizar suas
atribuições essenciais na área da saúde, educação, segurança, etc. Sob esse
aspecto, não há dúvida: as regras atuais da Previdência geram uma conta cara
demais para o contribuinte. O sistema atual exige que parte considerável do
dinheiro dos impostos, que deveria ser destinado aos investimentos e aos
serviços essenciais, seja utilizada para o custeio dos benefícios
previdenciários.
Além do rombo que o sistema previdenciário gera nas contas públicas,
há outro aspecto da reforma sobre o qual, quando se analisam os dados
objetivos, grande parte da polêmica some. Trata-se da comparação entre as
regras vigentes no País e as de outros países. O sistema pátrio é extremamente
benevolente, o que indica a existência de espaço para um melhor ajuste entre
receitas e despesas previdenciárias.
Veja-se, por exemplo, o tempo de contribuição exigido para a
aposentaria com o benefício integral. Alguns críticos da reforma tentam vender
a ideia de que as regras da PEC 287/2016 seriam injustas com o trabalhador.
De acordo com a redação dada pela comissão especial da
Câmara, para a obtenção de direito à aposentadoria integral será necessário,
entre outras condições, ter 40 anos de tempo de serviço. Ora, pouquíssimos
países no mundo oferecem aposentadoria integral a seus aposentados. A regra
geral é que a aposentadoria seja bem menor que o último salário, mesmo nos
países ricos.
Dados da Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE), que reúne países como Alemanha, Áustria, Dinamarca, França,
Noruega, Suécia e Suíça, mostram que, nesses países, o valor médio que um
trabalhador de renda média obtém com a aposentadoria representa 53% de seu
salário. Nos EUA, a renda média do aposentado é de 44,8% do salário da ativa.
No Chile é de 37,7% e no México, de 28,4%. Na Coreia do Sul, país tantas vezes
apontado como exemplo de produtividade e de recente desenvolvimento econômico,
a taxa de reposição da aposentadoria é de 45%. No Brasil, a relação entre
aposentadoria e valor do salário na ativa é atualmente de 70%. Não é nada de
outro mundo, portanto, reformar a Previdência para obter um melhor equilíbrio
das suas contas.
De acordo com a atual redação da PEC, quem entrar no mercado
de trabalho aos 25 anos de idade poderá se aposentar com salário integral aos
65 anos. Mesmo essa disposição, que parece enfrentar tantas resistências para
sua aprovação, é bem mais benéfica que as regras previdenciárias da maioria dos
países ricos.
É de fundamental importância para uma democracia o debate
público sobre as leis, especialmente aquelas que afetam de forma tão direta a
população, como é o caso da reforma da Previdência. Justamente por sua
importância, essa discussão deve estar baseada em dados reais. E não há dúvida
de que os números atestam inequivocamente a urgente necessidade de uma mudança
na legislação previdenciária.
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