José Paulo Cavalcanti Filho, Blog do Noblat
O 21º CinePE, que aconteceria entre 23 e 29 de maio, foi
adiado. Por conta de cineastas que protestaram pela inclusão, na programação,
de dois filmes: um, sobre o filósofo Olavo de Carvalho (“O Jardim das
Aflições”); outro, sobre o Real (“O plano por trás da história”). Retiraram
seus filmes da mostra gritando “Fora Temer!”. E se dizem defensores da
democracia. Perdão, senhores, mas vão ter que escolher. Uma coisa ou outra. Censores
ou democratas.
Não ficaram sozinhos, nesse gesto heróico. Logo outros, que
se intitularam críticos de cinema, assinaram Manifesto (15/5/2017) concordando
com o direito legítimo de não compactuar com a formação de uma tribuna para o
pensamento ultraconservador que ora se vê encorajado pelo governo Temer. Para
esses, mais importantes que os filmes em si, a liberdade de pensar e dizer, ou
a própria democracia, é gritar “Fora Temer!”. A chacun son temps, como no
provérbio francês.
A intolerância não tem pátria. Em Cannes, este ano, os
filmes “Okja” e “The Meyerowitz Stories” acabaram boicotados. Por virem de duas
empresas imperialistas, Netflix e Amazon. E por serem destinados a outras
telas. Não foram considerados filmes. E acabaram fora das premiações. O
presidente da HBO ponderou – Um filme é um filme, não importa se exibido em
cinema, televisão, computador ou celular. Com toda razão. Menos para os
cineastas bolivarianos que se deliciavam na bela riviera francesa.
Nos tempos de Hitler, um filme que falasse bem dos judeus
jamais seria exibido nos cinemas alemães. Caberia então perguntar, aos
cineastas/revolucionários de agora, se diriam lá o que dizem aqui – Vida e
cinema não se distinguem. Caso em que apoiariam o Kaiser.
Na ditadura militar, caso fosse proibida a exibição de filme
sobre um intelectual de esquerda, diriam todos que seria censura. Inclusive
esses mesmos cineastas/ revolucionários de agora, imagino. Já filme sobre um
intelectual conservador, eles protestam. Antes, era censura. Agora, só um gesto
democrático. Pungente e glorioso. Escusas, senhores, mas prefiro ficar com o
poeta Fernando Pessoa (Ricardo Reis, “Odes”, 30/7/1914), Só na ilusão de
liberdade/ A liberdade existe.
Não espanta que cineastas/militantes explicitem suas
ideologias. Em prática aberta de censura. O espantoso é que, agindo assim,
também se intitulem democratas. Democracia é algo diferente, senhores. É coisa
séria. É a arte de conviver. Inclusive com pessoas que não pensam como a gente.
Que não dizem o que gostaríamos de ouvir. Que fazem filmes, quaisquer de que
sejam, diferentes do que preferimos ver. O que esses corajosos cineastas
fizeram foi, digamos com todas as letras, censura. A mais clara. A mais
intolerante. A mais insensata.
A direção da CinePE respondeu educadamente. Mais do que
talvez devesse. Declarando respeito aos valores básicos da liberdade, quais
sejam o direito de expressão, o respeito à pluralidade e o combate ao
instrumento de censura. Mas, alvíssaras, tudo foi agora refeito. E o festival,
afinal, será realizado. Entre 27/6 e 3/7. A partir da próxima terça, pois.
Ainda bem. Em 1985, depois de 20 anos de chumbo, iniciamos, no Ministério da
Justiça, o movimento Censura Nunca Mais. É lamentável que, 32 anos depois,
ainda seja necessário dizer Abaixo a Censura.
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