segunda-feira, 22 de abril de 2019

ESPERANÇA É 2020

Cida Damasco, O Estado de S.Paulo
Pelo visto, mesmo quem considerava a recuperação da economia uma questão de torcer a favor ou contra o governo Bolsonaro, começa a jogar a toalha. Os indicadores do trimestre ainda não estão consolidados, mas os sinais são de que o PIB do período pode fechar com “crescimento zero” ou até “crescimento negativo”. Aqueles eufemismos aos quais os técnicos gostam de recorrer para amaciar a dura realidade da estagnação ou da recessão. Pior, a essas alturas já se acredita que o ano está perdido.
A esperança, nesse caso, foi protelada para 2020. Exagero? Há quem diga que sim, considerando-se que o governo, sensível a essa situação e a seus desdobramentos políticos, ainda poderia adotar pauta específica para injetar algum ânimo à economia. Essa aparente precipitação, porém, parece ligada a uma preocupação em não repetir o que aconteceu no ano passado – quando os primeiros meses foram de puro entusiasmo com a expectativa de um crescimento nas vizinhanças de 3% e os últimos meses de pura decepção, com a confirmação de que o resultado final do ano ficaria a um terço dessa marca. Por esse raciocínio, é melhor se preparar desde já, para a aterrissagem ser mais suave.
Dois importantes indicadores agregados do comportamento da atividade econômica comprovam que, para dizer o mínimo, a situação está desconfortável. Diagnóstico reforçado pelas filas quilométricas de trabalhadores à procura de um emprego e pela quantidade de lojas fechadas nas ruas e nos shoppings das grandes cidades. Depois de uma alta de 0,3% em janeiro, o Monitor do PIB da Fundação Getulio Vargas (FGV) apontou uma queda de 0,4% em fevereiro, que bateu na agropecuária, na indústria e no setor de serviços. Desempenho definido pela FGV como “modo de espera”.
O mesmo movimento foi detectado pelo Índice de Atividade Econômica do Banco Central, o IBC-Br. Fevereiro mostrou uma queda de 0,73%, a maior em nove meses, desde a parada dos caminhoneiros, em seguida a uma redução de 0,3% em janeiro. Na esteira desses resultados, ganha velocidade a descida das projeções para o fechamento do ano. Embora a Pesquisa Focus, do BC, ainda aponte um aumento de 1,95%, vários analistas já põem suas estimativas mais para perto de 1%. E, se essas apostas mais conservadoras emplacarem, 2019 será o terceiro ano consecutivo praticamente com o mesmo resultado medíocre – foi 1,1% tanto em 2017 como em 2018 –, depois da longa recessão que engoliu 8% do PIB.
Se há quase um consenso de que a economia brasileira não tem força suficiente para acelerar o crescimento neste ano, as recomendações para mudar esse quadro têm divergências. Os devotos do liberalismo radical acreditam que o crescimento só virá mais à frente, como consequência direta das reformas, especialmente a da Previdência, e o “natural” restabelecimento da confiança dos investidores. Na outra ponta estão os adeptos da tese de que será preciso acionar imediatamente instrumentos afiados de incentivo à demanda, mesmo levando-se em conta que alguns artificialismos, nessa direção, já tiveram sua eficiência testada e reprovada em outros governos. Sem isso, não haverá disposição de investimento, ainda que as reformas consigam vencer as resistências do Congresso e sejam aprovadas em tempo razoável.
Cada vez mais, contudo, ouvem-se vozes em defesa da combinação de duas coisas. Cuidar das chamadas mudanças estruturantes, mas também vitaminar alguns setores, como o da construção civil e obras públicas, para que eles garantam algum fôlego à atividade econômica, num prazo mais curto. Aqui é o caso de perguntar: cadê o programa de reativação de obras paradas, tão falado durante a campanha eleitoral?
Como se não bastassem as enormes dificuldades para se identificar e aplicar as terapias indicadas para reabilitar a economia, há ainda essa barafunda na política. Os três Poderes não se entendem e esticam a corda da normalidade democrática. Em pouco mais de uma semana, o presidente desautorizou, numa só penada, o superministro da Economia e a cúpula da principal empresa do País, o Supremo ressuscitou a censura à imprensa e desencadeou uma caça aos críticos nas redes sociais. E o Congresso se aproveita da confusão, dita a pauta conforme seus interesses, expondo a extrema fragilidade da articulação política do governo. Nesse cenário, quem se arrisca a pôr dinheiro para valer – e para ficar – na economia brasileira? Um ano perdido, “apenas”, talvez até seja lucro.
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