Se visitar Portugal, coisa que Jair Bolsonaro ainda não conseguiu fazer, ao contrário do que aconteceu com quase todos os presidentes anteriores depois da redemocratização, ele será muito bem recebido. Sem desmarcações, afrontas, estranhamentos, cancelamentos, charges ou desaforos.
Os dois países vão continuar a gostar-se, independentemente de quem os governe, e uma visita do presidente brasileiro a terras lusas seria importante, até porque, como Marcelo Rebelo de Sousa sublinhou, os povos são sempre mais importantes (e duradouros) que os seus representantes.
Nos dias de hoje seria ainda mais importante que Bolsonaro visitasse Portugal. Por muitos motivos que interessam aos dois países: há cada vez mais brasileiros lá, eles cada vez fazem mais negócios, geram cada vez mais empregos, cursam em cada vez mais universidades e, por isso, precisam, como nunca, que os portugueses os sintam como verdadeiros irmãos.
Mas também porque os mais de 500 mil (brasileiros e luso-brasileiros) que lá vivem gostariam que o seu representante máximo os visitasse. E entre eles há, com certeza, muitos apoiadores que até gostariam de o ver por lá. Até Itamar Franco, o único que não visitou Lisboa sendo inquilino do Planalto, correndo o ano de 1995, assim que deixou o Brasil entregue a Fernando Henrique, logo quis ser embaixador em Lisboa.
É fácil aceitar que a profissão de "presidente" em um país continental como Brasil, mais ainda em um regime presidencialista com estas caraterísticas, é tarefa para heróis, mas isso não desculpa estados de espírito ocasionais, impulsos de última hora ou sentimentos truculentos. Engolir sapos (grandes e pequenos) faz parte da liturgia do cargo que Bolsonaro ocupa e criar fatos políticos a partir de birras, levezas ou piadas de mau gosto prejudicam a imagem internacional do Brasil e até a do pré-candidato.
Entende-se que em meio a uma disputa eleitoral tão importante como a que o Brasil agora vive, os ânimos estejam à flor da pele, mas tratar o presidente de Portugal com desconsideração é uma péssima ideia.
É verdade que Bolsonaro fala quase exclusivamente para a sua base eleitoral, que é constituída —como demonstra o Datafolha— fundamentalmente por eleitores mais masculinos, brancos, heterossexuais, velhos, ricos e escolarizados, mas mesmo entre esses será difícil encontrar muitas pessoas que não gostem de Portugal ou do presidente dos portugueses. As estatísticas provam exatamente o contrário.
Cancelar o "frango com farofa" ao presidente Marcelo joga contra as pretensões de reeleição de Bolsonaro. É mesmo um tiro no pé. Porque entre os indefectíveis do atual presidente há muitos que gostam de Portugal, admiram o presidente dos portugueses e têm até uma pontinha de inveja.
E só Deus sabe como ela cresce.
José Manuel Diogo - Diretor da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Brasileira, é fundador da Associação Portugal Brasil 200 anos
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