Iniciativas para favorecer térmicas e outros grupos de interesse tornarão a eletricidade mais cara ao consumidor
Têm se tornado frequentes as pressões nos bastidores do setor elétrico contra o interesse do consumidor. Em projetos recentes de geração de energia, bilhões têm sido extraídos das contas de luz para subsidiar este ou aquele segmento. O exemplo mais eloquente foi a inclusão do proverbial “jabuti das térmicas” na lei que autorizou a privatização da Eletrobras. Sem nenhum sentido econômico, ela tornou obrigatórios leilões de termelétricas a gás em regiões onde não há gás. A obrigação torna necessária a construção de gasodutos para abastecê-las, com custo transferido à população.
A ação mais recente dos grupos de pressão no setor de energia se faz sentir no projeto do marco regulatório para usinas eólicas offshore, necessário para garantir segurança jurídica à diversificação da matriz energética brasileira. Uma profusão de novos “jabutis” sem relação com o tema incluídos no projeto aprovado na Câmara custará pelo menos R$ 27 bilhões por ano à conta de luz dos brasileiros, pelos cálculos da Abrace, associação que congrega grandes consumidores de energia.
Entre os “jabutis”, estão subsídios à energia solar, repasse de custos ao mercado livre (mecanismo de negociação por meio do qual consumidores escolhem seu fornecedor), mudanças na Conta de Desenvolvimento Energético, com encarecimento da energia para Sudeste e Nordeste e, naturalmente, incentivos a usinas térmicas. A lei de privatização da Eletrobras fixou em 8 gigawatts a reserva de mercado para térmicas a gás. Diante da baixa adesão aos leilões, a ideia é suprir parte dessa energia com hidrelétricas de pequeno porte, de custo operacional mais alto. Outro “jabuti” acaba com o teto antes estabelecido para o preço da energia das termelétricas, numa tentativa de torná-las mais rentáveis.
Por fim, o projeto aprovado favorece térmicas a carvão com a extensão até 2050 do prazo em que será permitido contratá-las. O carvão, vale lembrar, é a forma de gerar energia que mais contribui para o aquecimento global. Negociações internacionais procuram bani-lo da matriz energética planetária, e no Brasil seu uso é desnecessário.
As pressões não se limitam ao projeto que seguiu ao Senado. Na semana passada, o blog da colunista Malu Gaspar, do GLOBO, revelou a tentativa de transportar mais um “jabuti” para uma Medida Provisória de incentivo a empresas de energias renováveis. A emenda à MP retirava o custo de transporte do preço da energia oferecida pelas termelétricas, de modo a torná-las mais competitivas. Com a revelação da manobra, o Palácio do Planalto cancelou a solenidade de assinatura da MP.
Um país como o Brasil precisa de uma matriz energética limpa e diversificada, de modo a garantir a queda nas emissões de gases de efeito estufa e a segurança energética necessária ao crescimento econômico futuro. As térmicas têm seu papel nessa matriz, mas todo empreendimento — como a nova rede de gasodutos necessária para torná-las viáveis — precisa se justificar economicamente num mercado sem distorções. Do contrário, todo custo passará às contas de luz.
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