O veto de Jair
Bolsonaro a um novo programa de renda básica financiado com cortes de
benefícios previdenciários e assistenciais expõe com crueza os atuais dilemas
da gestão dos gastos públicos, com implicações para a vida dos mais pobres, a
economia e a política.
As diretrizes para lidar com tais questões, no entanto,
continuam indefinidas. Mais que isso, parecem emaranhadas no interior de uma
administração disfuncional e submetida a rompantes eleitoreiros.
A crise do Renda Brasil resulta disso. Se o presidente está
decidido a manter o teto de gastos e ampliar o Bolsa Família, tem de
aceitar corte
de despesas sociais, ou com o funcionalismo. Caberia à sua equipe
apresentar alternativas que considerassem esses limites e ao presidente, tomar
uma decisão.
Bolsonaro, entretanto, opta pela demagogia enquanto parece
esperar alguma mágica orçamentária. Posa como defensor dos pobres e procura
empurrar a solução do problema para outrem, como de costume. Nesta quarta (16),
como que transferiu
ao Congresso a responsabilidade de fazer os cortes impopulares a fim
de financiar o novo programa de renda básica.
A crise também ofereceu novas evidências da incapacidade do
presidente de inspirar confiança na sociedade e transmitir a mensagem de que há
um governo organizado e preocupado com a estabilidade política. Seu método,
comprova-se, é o ato impetuoso e conflitivo.
Transpareceu ainda a descoordenação dentro do próprio
Ministério da Economia, de tamanho desmedido e recheado de conflitos internos.
O ministro Paulo
Guedes, por sua vez, não parece ter condições políticas de definir
prioridades.
Guedes tornou-se notório pela constância com que anuncia
planos fabulosos que evaporam em poucas horas, sem produzir resultados.
Tampouco se mostra capaz de negociar seus projetos a contento com o presidente,
com colegas do Planalto, com a sociedade e com o Congresso. Acaba de romper com
o presidente da Câmara, Rodrigo
Maia, adepto das reformas.
A desordem e a indefinição suscitam desconfianças sobre o
rumo da política de contenção dos gastos públicos. Se o governo se revela
incapaz de tomar decisões difíceis e imagina que milagres podem financiar
programas necessários como o de renda básica, levanta-se a suspeita de que pode
sobrevir uma burla improvisada do teto de gastos.
A crise do Renda Brasil, portanto, é uma demonstração
concentrada de desgoverno. Ficam em suspenso a política fiscal, a economia e o
destino dos mais afetados pela pandemia. Instado pela realidade a tomar
decisões de governo fundamentais e construtivas, Bolsonaro se refugia no mundo
de sua campanha eleitoral permanente."
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