Do O Povo
Homenagem - A história política cearense passou a ter uma
ausência física, mas não deixará de ter um dos maiores exemplos de luta pelo
que se pensa. Morreu neste sábado, aos 87 anos, o advogado Antônio Pádua
Barroso. Ele defendeu o primeiro civil durante a ditadura militar (1964–1985) e
advogou, de graça, a favor de mais de cem presos políticos. Além de atuar na
parte jurídica, Pádua sabia ajudar homens e mulheres torturados a manter a
integridade em nome dos próprios ideais.
O advogado descobriu um câncer de pulmão em setembro de
2015. A doença progrediu e uma cirurgia não era indicada. Há dois meses, uma
metástase cerebral foi diagnosticada e, desde o último dia 24 ele estava
internado. No dia anterior à internação, enquanto assistia televisão, o bisneto
lhe falava dos últimos aprendizados sobre mitologia grega. “Mesmo doente, ele
acompanhou tudo isso que vem acontecendo com nossa política. Com uma habilidade
emocional muito consciente. Mas, nas conversas, depois de rir muito, começava a
chorar. Como se soubesse que ia nos deixar”, conta a filha mais velha, Valéria
Barroso de Albuquerque, 56.
Das lembranças, o orgulho de ter um pai que nasceu pobre,
lutou para estudar, tornou-se procurador da República e fez inúmeros amigos e
história. “Ele era uma pessoa muito humilde. Para você ter ideia, a preocupação
dele era de como iam ficar seus cuidadores. Ele dizia que era advogado e tinha
uma banquinha no edifício Palácio Progresso”, lembra a filha.
As memórias sobre Pádua Barroso são ainda mais fortes para a
irmã, Ester Barroso, com quem dividiu livros, ideologias e luta contra a
ditadura. Ela recorda as orientações de leitura sobre Monteiro Lobato, a defesa
que ele fez após ela passar dez dias de solidão e tortura, além das tentativas
de expor a realidade da ditadura à imprensa e proteger quem dela sofria.
“Ele e a Wanda Rita (Othon Sidou, falecida em 19 de agosto
de 1993) foram os únicos advogados que defendiam presos políticos aqui no
Ceará. Quando eu fui presa e fiquei dez dias incomunicável, ele foi lá me
defender e queria saber se eu tinha sido torturada. Falei que não, porque senão
ele ia largar a mão na cara do delegado”, conta. O mais importante, segundo
ela, era que o irmão continuasse defendendo os outros presos.
Um dos clientes e amigos de Pádua, o jornalista Valdemar
Menezes, editor sênior do O POVO, diz que a atuação do advogado aconteceu no
período mais obscuro da ditadura. “Ele era muito destemido.
Apesar de toda a pressão sobre ele, sempre enfrentava tudo
com tranquilidade e firmeza”, relata. Há cerca de um mês, quando o visitou em
casa, Valdemar disse que houve muita emoção.
“Relembramos a fase das perseguições, contamos muitas
histórias. Ele fez questão de se levantar e me conduzir ao elevador antes de ir
embora. Ele sempre foi muito digno”, diz.
O enterro de Pádua Barroso acontece às 10 horas deste
domingo, no cemitério Jardim Metropolitano.
Frases
“Pádua era muito amigo, ia muito além do profissional.
Procurava auxiliar a família e encorajar que estava preso”
Valdemar Menezes, jornalista
“Iam prender ele, matar de tortura. Quem defenderia os
outros presos?”
Ester Barroso, irmã de Pádua Barroso, presa durante a
ditadura
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