segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

REEMBOLSO IRREGULAR

Da Folha de S.Paulo
“Bolsonaro vem aí! O Brasil vai endireitar e o Brasil vai mudar de verdade.”
A entusiasmada declaração do deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), compartilhada em redes sociais, é do dia da oficialização da candidatura do presidente eleito. O evento ocorreu no Centro de Convenções SulAmérica, no Rio de Janeiro, em 22 de julho.
Registros da Câmara mostram que Onyx, que assumirá a Casa Civil, pediu e obteve reembolso dos cofres públicos por passagens de ida e volta de Brasília para o aeroporto Santos Dumont, nesta data, em um valor de R$ 3.720. 
Ao todo, há no sistema da Câmara informação de reembolso para Onyx de mais de 70 bilhetes cuja origem ou destino são aeroportos do Rio e São Paulo, somando R$ 100 mil.
Desde 2017, ele integra o grupo de parlamentares que coordenou a pré-campanha e a campanha de Bolsonaro.
As regras da cota de atividade parlamentar —verba que congressistas têm para atividades do dia a dia— não permitem o uso para fins eleitorais. 
A cota é “destinada a custear gastos exclusivamente vinculados ao exercício da atividade parlamentar”, segundo ato da Mesa Diretora. 
Os dados da Câmara indicam que Onyx utilizou dinheiro público também no momento mais dramático da campanha: a facada em Bolsonaro em Juiz de Fora (MG), no dia 6 de setembro. 
Há reembolso ao deputado no valor de R$ 469 por uma passagem aérea com saída do aeroporto Presidente Itamar Franco, o mais próximo da cidade mineira, para Congonhas, em São Paulo, nesse dia.
No dia seguinte, 7, Onyx deu entrevista coletiva na porta do hospital Albert Einstein, em São Paulo, para onde o então presidenciável foi transferido.
A Câmara registra reembolso para o deputado de outros quatro bilhetes nos dias 6, 7 e 8 de setembro. De São Paulo para Porto Alegre, de Porto Alegre para o Rio, do Rio para São Paulo e, por fim, de São Paulo de volta a Porto Alegre. 
As viagens de Onyx para São Paulo e Rio que foram reembolsadas pela Câmara se tornaram mais frequentes à medida que a campanha se intensificava, a partir de julho. Uma equipe de coordenadores de sua campanha trabalhava em São Paulo.
As duas cidades também se tornaram QG da campanha porque o então candidato ficou 23 dias internado no Einstein, em setembro. Quando teve alta, foi para sua casa no Rio, onde ficou até o fim da eleição.
Em outro exemplo, Bolsonaro se reuniu entre o primeiro e o segundo turno no Rio com membros da União Democrática Independente (UDI), partido chileno de direita. Onyx também participou.
Há registro de reembolsos de passagens neste dia do então parlamentar de Porto Alegre para o Rio e depois do Rio para Brasília. O valor total foi de R$ 2.700.
Há ainda passagens de assessores do deputado para acompanhá-lo em viagens ao Rio ou a São Paulo.
Um dos principais discursos do novo governo é o da diminuição de gastos públicos. Onyx é um dos divulgadores desse lema. 
Em entrevista coletiva na semana passada, ele disse que abrirá mão de seu cartão corporativo e comentou também sobre viagens em avião da FAB (Força Aérea Brasileira). 
“Eu vou abrir mão do meu cartão corporativo. Mas acabar com ele ainda é uma coisa que vai ser discutida. Aquela coisa de pagar jantar, pagar vinho, pagar uísque não sei quantos anos, nesse governo não vai ter não”, afirmou. 
“Eu vou dar meu exemplo pessoal. Desde que eu fui nomeado ministro da transição, eu poderia ter usado avião da FAB, eu nunca fiz isso”, disse.
Onyx foi questionado pela Folha sobre a utilização de dinheiro da Câmara para deslocamentos fora das regras permitidas pela Câmara, mas não respondeu até a publicação da reportagem.
Bolsonaro também usou sua cota parlamentar para custear viagens pelo país em 2017 e, no primeiro semestre deste ano, para participar de eventos em que era mencionada sua pré-candidatura à Presidência. 
Na época, seu chefe de gabinete afirmou que o deputado não estava em campanha “seja para qual cargo for” e que as despesas ressarcidas pela Câmara “foram realizadas em consonância com os preceitos legais e regimentais.”
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FELIZ ANO NOVO !

Caros leitores, amigos mais um ano termina. 2018 foi um ano de muitas conquistas e recordes para o blog Sou Chocolate e Não Desisto, resultado de muito trabalho nestes 13 anos de existência.
A cada ano, ganhamos mais repercussão na internet, entre blogs e sites que reproduzem nossas postagens. Nas redes sociais como Facebook, Twitter e Instagram, o Blog tem se destacado.
A todos leitores, amigos e parceiros, muito obrigado! Desejo um Ano Novo de realizações, muito amor, paz e esperança. Feliz 2019!. Abraço, Valério Sobral.
Em 2019, o blog Sou Chocolate e Não Desisto completa 14 anos. Vem novidades aí!
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POLÍTICOS PARA SE FALAR BEM

Artigo de Fernando Gabeira
Hoje gostaria de elogiar dois políticos brasileiros. Não se assustem: estão mortos.
Um deles é Afonso Arinos, cujas memórias, “A alma do tempo”, acabam de ser publicadas na íntegra pela Top Books, um feito editorial, pois constam de 1.779 páginas, incluídas as notas. Nos últimos dez dias, consegui ler 400. Não posso falar ainda sobre o livro no conjunto. Mas o que li até agora é o bastante para lamentar ter perdido, por alguns anos, a chance de conviver com Arinos no Congresso. Quando cheguei, já não estava mais.
Essa hipótese de convivência nem existiu com Joaquim Nabuco, autor de “Minha formação”. Só mesmo na fantasia poderia estar ao seu lado, fazendo perguntas, ouvindo e anotando seus discursos.
Arinos e Nabuco, no meu entender, têm muito em comum. Longas passagens pela Europa, famílias de políticos ilustres. Nabuco e Arinos escreveram sobre seus pais. Nabuco, “Um estadista do Império”, Arinos, “Um estadista da República”, dois livros já indicam uma certa continuidade histórica entre os dois.
Nabuco foi um dos líderes da campanha pela Abolição. Afonso Arinos é o autor da lei brasileira contra a discriminação racial. O que José Guilherme Merquior diz sobre Arinos, num dos prefácios de “A alma do tempo”, talvez seja válido também para Nabuco: “o sabor das elites que aprendem com a história e acabam por liderar as mudanças construtivas.”
A principal tentação é a de afirmar que existem políticos interessados no país, capazes de se bater por grandes ideias, algo bastante diferente do que se pensa hoje. Gilberto Freyre destaca essa qualidade em seu conterrâneo Nabuco, acentuando que é importante conhecê-lo num momento em que os políticos parecem mistificadores e o Congresso, uma inutilidade dispendiosa.
Minha vontade de estudar e escrever sobre as semelhanças entre Nabuco e Arinos não é tanto extrair uma lição de moral de sua experiência política e sua passagem brilhante pela vida pública.
No fundo, é mais a constatação de um tempo perdido, uma certeza de que essas estrelas não acontecem mais em nossa constelação dirigente. A hipótese é de que a política perde importância, e essa decadência está associada ao próprio declínio do Estado, que aos poucos vai perdendo suas clássicas funções.
De qualquer forma, num passe de realismo mágico, seria interessante reviver essas duas figuras e passear com elas no panorama desolador de Brasília.
Nabuco certamente ficaria mais assustado, pois morreu muito antes da mudança da capital. Arinos viu a cidade nascer, passou por ela dois meses após sua fundação. Suas observações na época coincidem com as minhas hoje.
Arinos critica a inadequação dos prédios de Niemeyer para os órgãos públicos. Acha que não têm a privacidade necessária. O mesmo tenho dito sobre o Congresso, com pouco espaço específico para articulações. Ele reclama de não ter visto um cavalo arriado, uma galinha viva nas ruas de Brasília. Vi algumas carroças, mas galinha, só nas mesas.
O mais interessante, no nascimento de Brasília, foi sua intuição de que havia algo errado nas relações humanas e que aquilo indicava um potencial de corrupção nos círculos superiores.
Outro dia, li um relato na revista “Crusoé” sobre o que se passava em alguns gabinetes da Câmara, deputados comendo pão com linguiça, pedaços de galinha e trocando imagens de mulheres nuas na telas de seus telefones. O que diriam Nabuco e Arinos diante dessa paisagem? Possivelmente, buscariam refúgio na literatura.
No meu último mandato, o nome de Nabuco surgiu como um meteoro num debate na Câmara. Um deputado me perguntou: “Quem é esse cara? Deve ser do PFL de Pernambuco, suponho”. “Ah, bem”, disse ele, e continuou o bate-boca.
Ambos, Nabuco e Arinos, de uma certa forma foram acusados de distância do país, de serem intelectuais com os olhos na Europa. Ao falar de Nabuco, Arinos explica bem o que há por trás de uma falsa impressão:
“A personalidade nacional coexiste muito bem. Nenhum diplomata brasileiro mais universal e mais nacional que Joaquim Nabuco. Nabuco é como um parque brasileiro antigo, cheio de mangueiras, de jaqueiras, de bogaris e que, de longe, dá a impressão de ser um parque inglês. É como um dos velhos jardins da Rua São Clemente”.
Artigo publicado no O Globo, em 31/12/2018
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sábado, 29 de dezembro de 2018

UMA PEQUENA DOSE DE JÂNIO

Artigo de Fernando Gabeira
O futuro ministro da Cidadania, Osmar Terra, falou em proibir o álcool em algumas circunstâncias e provocou polêmica. Creio que as pessoas entenderam que Terra queria proibir o álcool de forma geral.
A experiência no Brasil, no entanto, já mostrou que em certos momentos é possível controlar o consumo com êxito na redução da violência. Para isso é necessário um mapa preciso dos incidentes violentos, indicando hora e lugares onde acontecem.
Não concordo com a visão geral de Osmar Terra sobre política de drogas. Mas também não concordava com a visão proibicionista do velho e saudoso Elias Murad. Uniam-me a Murad, assim como a Osmar Terra, não só a amizade cotidiana, mas uma certa humildade diante desse complexo problema, para o qual ninguém pode dizer que tenha todas as únicas respostas certas.
Basta ver, no momento, a devastação humana que o consumo de opiáceos está provocando nos Estados Unidos. É um desafio para o governo Trump, mas suas raízes o antecedem.
Mas a democracia nos faz experimentar. No Brasil, com a vitória conservadora, é razoável que a política de Terra seja desenvolvida. No Canadá, por exemplo, o governo rumou noutro sentido, legalizando a maconha. Dizem os jornais que a Marlboro entrou no negócio e suas ações subiram mais que as da Bombardier, a correspondente canadense da Embraer.
Não sou ingênuo a ponto de apresentar uma única variável, o sucesso econômico, como critério para analisar uma política dessa envergadura. Apenas registro: a democracia abre o caminho para diferentes experimentos.
Esse pequeno debate em torno do anúncio de Osmar Terra me fez refletir sobre o passado, mais especificamente o período Jânio Quadros. Sem querer comparar governos, registro apenas que naquela época havia também uma combinação entre temas conservadores nos costumes e medidas amargas na economia.
Nos costumes, os temas são muito mais voláteis do que a constância insuperável do preceito econômico que nos proíbe de gastar mais do que produzimos, ao longo de muito tempo. Nenhum governo federal se importaria hoje em proibir brigas de galo, como Jânio fez. Mesmo temas mais amplos, como as vaquejadas e os rodeios, deslocam-se para o Congresso e o STF.
O que diria, então, da proibição do biquíni? Isso provocaria um movimento maior que a revolta das vacinas nos tempos de Osvaldo Cruz. Talvez nem isso, apenas uma explosão nacional bem-humorada.
O interessante em Jânio não era a coexistência dessas duas pautas, que, em outro nível, existem também no governo Bolsonaro. O interessante era como Jânio as combinava.
Sempre que era forçado a tomar medidas econômicas impopulares, Jânio lançava uma dessas proibições que eletrizam a opinião pública. Era muito mais confortável canalizar as atenções para o biquíni do que para as combalidas finanças nacionais.
Não creio que Bolsonaro siga o mesmo caminho. Nada neste período preparatório sugere o cinismo e a sofisticação de Jânio. Além do mais, parece-me que Bolsonaro realmente acredita nos temas de comportamento que defende e vai brigar por eles com o entusiasmo de quem se batizou no Rio Jordão.
Mais que semelhanças, vejo no governo Bolsonaro o fim de algo que surgiu no governo Jânio: a chamada política externa independente, que estabeleceu relações diplomáticas com países socialistas, Cuba incluída. Ainda sem julgar o mérito dessas políticas, tudo indica que o peso ideológico na gestão Ernesto Araújo vai revolucionar as bases do trabalho de Afonso Arinos. Portanto, as comparações entre os governos Jânio e Bolsonaro não podem ignorar essa descontinuidade.
Por falar em Afonso Arinos, recebi nas vésperas do Natal o monumental livro de memórias, intitulado A Alma do Tempo. Um verdadeiro ato de heroísmo do editor José Mario Pereira, da TopBooks. O livro tem 1.790 páginas. Ainda não cheguei à metade do caminho. Cuidarei dele em outros textos.
Os últimos anos foram muito focados na experiência do PT, no máximo, no governo tucano, que lhe antecedeu. Com a ajuda de Arinos e, certamente, de Joaquim Nabuco, ambos atores e intérpretes da saga política familiar, é possível olhar um pouco mais para trás, puxar fios mais longos da meada histórica.
A primeira tarefa, e nisso creio que as memórias de Arinos ajudam, será examinar a experiência de Jânio. Não cheguei no livro plenamente a ela. Mas já no início há referências à instabilidade de Jânio.
Collor foi também uma experiência conservadora. Mas parecia voltado para a economia, para um consumo cosmopolita, uma clássica defesa do meio ambiente.
Bolsonaro pertence aos tempos modernos, em que, segundo Umberto Eco, se desenha um populismo qualitativo de TV ou internet, no qual a resposta emocional de um grupo selecionado de cidadãos pode ser apresentada e aceita como a “voz do povo”. A diferença é que ele chegou ao poder não pela resposta emocional de um grupo selecionado, mas pela vontade da maioria do povo brasileiro. Em outras palavras, até aqui, tudo bem.
Até onde minha vista alcança, os primeiros sobressaltos estão ao norte. Maduro assume dia 10 e a Colômbia propõe que os outros países não reconheçam seu novo governo. Por sua vez, o próprio Maduro andou apreendendo um navio da Guiana, reavivando aquele velha querela em torno de Essequibo, problema que vem desde o século 19 e envolve uma região rica em minérios e um mar potencialmente com muito petróleo. E ainda por cima disse que o general Mourão tem cara de louco. Mourão serviu na Venezuela, conhece a gênese do bolivarianismo.
Vai ser preciso cabeça fria naquela fronteira, concentrar no trabalho humanitário. Provocações podem surgir. Maduro está precisando de inimigos para garantir a coesão interna.
O Brasil só precisa de paz para se reconstruir.
Artigo publicado no Estadão, em 28/12/2018
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sexta-feira, 28 de dezembro de 2018

BYE, BYE, GLOBO

Alexandre Garcia, um dos jornalistas mais conceituados do País, após 30 anos pediu demissão da Rede Globo.
O motivo não foi revelado, mas especula-se que Alexandre Garcia possa a vir fazer parte da equipe de comunicação (?) do governo Bolsonaro.
Garcia que foi uma espécie de porta-voz do último presidente da Ditadura Militar, se credencia para o novo governo militar de Bolsonaro.
Caso se concretize, Garcia manda às favas sua biografia.
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VOCÊ COMPRARIA CARRO USADO NA MÃO DO QUEIROZ ?

Do Blog do Josias
A boa notícia é que Fabrício Queiroz está bem. A ótima notícia é que o 'faz-tudo' de Flávio Bolsonaro emergiu do seu álibi hospitalar para revelar ao país que não é o sujeito desonesto que muitos imaginavam. Ao contrário, o amigo do clã Bolsonaro é um exemplo a ser seguido.
Se você está desempregado ou recebe um salário abaixo das necessidades, seus problemas acabaram. Largue tudo o que não está fazendo. Reorganize-se como um Queiroz. E realize o sonho da movimentação bancária "atípica". Ele repousa sobre quatro rodas. E está ao alcance de todos.
"Eu sou um cara de negócios, eu faço dinheiro", declarou Queiroz ao SBT. "Compro, revendo, compro, revendo. Compro carro, revendo carro, sempre fui assim. Gosto muito de comprar carro de seguradora. Na minha época lá atrás, comprava um carrinho, mandava arrumar, revendia. Tenho uma segurança."
O resultado, como se sabe, foi estupendo. Entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, Queiroz movimentou R$ 1,2 milhão na sua conta bancária —média de R$ 100 mil por mês. Coisa incompatível com os cerca de R$ 23 mil que Queiroz recebia como motorista e segurança de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio e policial militar.
Queiroz poderia ter atuado como laranja do filho mais velho de Jair Bolsonaro. Ele poderia ter transformado sua conta em esconderijo para ocultar um pedágio extraído dos contracheques dos assessores do gabinete de Flávio Bolsonaro. O 'faz tudo' poderia ter efetuado vários saques na boca do caixa para distribuir dinheiro vivo aos Bolsonaro por baixo da mesa. Mas Queiroz estava apenas —quem diria?!?— comprando e revendendo automóveis.
 A crise poupou Queiroz. Tudo poupou Queiroz. Ele parecia ter descoberto a camuflagem perfeita para passar pelo mundo incólume. Disfarçado de assessor do primogênito da dinastia Bolsonaro, Queiroz comercializaria veículos a vida inteira sem que ninguém suspeitasse. Mas de repente…
Sobreveio a Operação Furna da Onça, que pilhou uma penca de deputados estaduais fluminenses no contrapé. Acionado, o Coaf mapeou o vaivém atípico de dinheiro nas contas de dezenas de assessores da Alerj. Entre eles Fabrício 'Compro e Revendo' Queiroz.
Não fosse pela indiscrição do Coaf, Queiroz poderia se abster de declarar "não sou laranja", pois ninguém suspeitaria que sua conta pudesse abrigar uma espécie de caixa dois com verbas da folha do gabinete de Flávio Bolsonaro.
Queiroz tampouco precisaria justificar os R$ 24 mil repassados à futura primeira-dama Michelle Bolsonaro —"O nosso presidente já esclareceu. Eu tive um empréstimo de R$40 mil e eu passei dez cheques de R$ 4 mil."
Num mundo sem Coaf, Queiroz também não teria de fugir de uma pergunta sobre os oito assessores de Fabrício Bolsonaro que realizaram depósitos regulares em sua conta —"Esse mérito de dinheiro eu queria explicar ao Ministério Público."
Agora que já veio à luz a explicação "plausível" que Flávio Bolsonaro dissera ter escutado do seu ex-assessor há 20 dias, a plateia já pode tirar suas próprias conclusões. Descobriu-se que Queiroz atribui a movimentação bancária atípica de R$ 1,2 milhão à compra e revenda de carros. Não foi exibido um mísero documento.
Quanto aos depósitos feitos na conta atípica por oito assessores de Flávio Bolsonaro, Queiroz nega a existência de uma "caixinha" fornida com verbas da folha do gabinete. Mas ele se nega a explicar o que motivou tantos depósitos. Alega que prestará os esclarecimentos ao Ministério Público. De resto, Queiroz ecoa o lero-lero sobre o "empréstimo" de R$ 40 mil supostamente recebido de Jair Bolsonaro. Mas não exibe comprovantes nem explica as razões que levaram um correntista atípico a pedir dinheiro emprestado.
 A certa altura, Queiroz resumiu numa frase o objetivo de sua aparição às vésperas da posse de Jair Bolsonaro. "Quero pedir desculpa à família Bolsonaro. Tira a imprensa deles. Vem em cima de mim. Eu sou o problema, não eles."
Quem não quiser fazer papel de bobo deve iniciar a avaliação sobre o caso respondendo rapidamente uma indagação tão simples quanto embaraçosa: Você compraria um carro usado na mão do Queiroz?
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quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

BRASIL SANGRENTO

Do blog Conta OutraSuper Interessante

Brasil = EUA, Canadá, Marrocos, Argélia, Tunísia, Líbia, Egito, China, Mongólia, Malásia, Indonésia, Austrália, Nova Zelândia, Coreia do Sul, Coreia do Norte, Japão, Portugal, Espanha, Reino Unido, Irlanda, França, Bélgica, Holanda, Luxemburgo, Alemanha, Itália, Suíça, Dinamarca, Noruega, Suécia, Finlândia, Estônia, Letônia, Lituânia, Polônia, República Tcheca, Eslováquia, Áustria, Hungria, Belarus, Ucrânia, Romênia, Moldávia, Bulgária, Eslovênia, Croácia, Bósnia-Herzegóvina, Sérvia, Montenegro, Albânia, Grécia e Macedônia
O Brasil teve 59 mil assassinatos em 2015. Dez anos antes, eram “apenas” 48 mil. São mais homicídios do que os 52 países listados no mapa. Mas 52 é um número grande demais, e essa lista inclui muitos países pequenos e ricos, você pode argumentar, e com razão. Certamente incluir a achocolatada Suíça (57 assassinatos em 2015) ou o endinheirado Grão-Ducado de Luxemburgo (QUATRO em 2014) deturparia a quantidade de nações comparadas. Além disso, somos um gigante de 8,5 milhões de quilômetros quadrados e 207 milhões de habitantes. Não seria injusto comparar com esses países pequetiticos? Até mesmo a França, que tem um dos maiores territórios da Europa, é do tamanho da Bahia, apenas o 5º maior estado brasileiro.
Então tome o continente inteiro de uma vez. A Europa tem 10,1 milhões de quilômetros quadrados, área um tanto maior, mas ainda assim comparável à do Brasil. Mas são 743 milhões de pessoas – muito mais do que aqui. Ainda assim, o continente inteiro teve 22 mil assassinatos no último ano contabilizado. O Brasil (com uma população mais de três vezes menor), teve quase o triplo.
Ok, mas é Europa. O continente que parece ter aprendido com suas intermináveis guerras desde que Adolf Hitler foi sorrir no inferno. O continente que se tornou, salvo guerras regionais aqui e atentados terroristas acolá, um lugar pacífico. Esqueça um pouco a xenofobia e os nacionalismos recentes. Pense no continente dos carrinhos pequenos, das bicicletas, vielas medievais, waffles, baguetes, chocolates, vinhos, cervejas, queijos, praias (artificiais ou não) de nudistas, música eletrônica controversa, direitos humanos mais respeitados que a média, Bjork, príncipe Harry, Lego. Lego, caramba! Comparar com o Brasil? Fala sério.
Então pegue a Indonésia. Maior país de maioria muçulmana do mundo, 1,9 milhão de quilômetros quadrados, 253 milhões de almas. Um arquipélago grande, populoso e pobre: ainda assim, foram 1,2 mil assassinatos em 2014. Se for comparar conosco, não dá para o gasto: basta o Espírito Santo de 2016 para chegar ao mesmo número.
E os Estados Unidos, cheio de crimes, atiradores compulsivos, nacionalistas raivosos e repressão policial? Foram 15,7 mil homicídios em 2015, em um território de 322 milhões de humanos. Isso dá 4,8 por 100 mil habitantes. No Brasil, 28,9 – é como se alguém de Lagarto (SE), Assis (SP) ou Iguatu (CE) convivesse com o fato de que 30 moradores da cidade foram assassinados no último ano.
Mas calma, você ainda pode argumentar que os dados de muitos países são menos confiáveis que os do Brasil. Esse mapa mesmo inclui a Líbia, país dilacerado pela guerra desde 2011. As 156 vítimas no país em 2015 foram consideradas alheias ao conflito, mas, ainda assim, pode-se torcer o nariz para o dado. Mas é também justamente pela dificuldade em quantificar esses crimes em um cenário belicoso que as guerras não entram na conta. Afinal, guerra é outra coisa. O último dado disponível da Síria é de 2010, antes da guerra: 463 assassinatos, taxa de 2,2 por 100 mil. Naquele ano, o Brasil teve 53 mil, com taxa de 27,8.
Em tempo, a Guerra Civil da Síria já matou, na média das estimativas, 350 mil pessoas, o que pode colocá-la na lista das 100 matanças mais mortíferas da história.
O Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), que agrega os dados de todos os países, define o seguinte: “Dentro da grande gama de tipos de morte violenta, o elemento primordial do homicídio intencional é sua completa ligação com o perpetrador direto, o que consequentemente exclui mortes causadas por guerras e conflitos, mortes autoinfligidas (suicídio), mortes devido a intervenções legais ou motivos justos (como autodefesa, por exemplo) e mortes quando houve negligência do perpetrador mas este não tinha a intenção de tirar uma vida (homicídio não intencional).”
Guerras postas de lado, voltemos à violência urbana e rural. O mapa ainda tem Rússia, país que não é lá um sinônimo de paz. Foram 16,2 mil assassinatos em 2015, uma taxa de 11,3 mortes do tipo a cada 100 mil pessoas. Já a gigante China, com seu 1,3 bilhão de habitantes, registrou 10 mil homicídios em 2014 – mas, aqui, cabe a ressalva de que, apesar da queda expressiva de crimes nos país nas últimas décadas, os números oficiais são enganosos. Assassinatos ocorridos juntamente com roubo ou estupro podem ser descartados da estatística.  Ainda assim, os números chineses precisariam ser 36 vezes maiores para se equipararem aos brasileiros.
Se for ver com lupa, quase todo mundo vai ter asterisco e nota de rodapé. Metodologias que podem variar um pouco, burocracias falhas, corrupção governamental. Só que o problema é que mesmo se duvidarmos dos dados de todos os países, o Brasil tem tanta vantagem nesse terrível ranking que fica difícil demais contra-argumentar. Você pode fazer variações do mapa. Tem uma no Reddit que troca os Estados Unidos por um punhado de nações na África Subsaariana e no Sudeste Asiático. Entre os países mais sanguinários em números absolutos, o único que se compara ao Brasil é a Índia, com 41,6 mil homicídios em 2014. O problema, lembrar não custa nada, é que a população da Índia é mais de seis vezes maior que a nossa.
O resto dos 10+ da lista está em um patamar bem inferior: México (20,7 mil), África do Sul (18,6 mil), Nigéria (17,8 mil), Venezuela (17,7 mil), os já citados Rússia e EUA, Paquistão (13,8 mil) e Colômbia (12,7 mil). Ou seja, troque os 52 países do mapa, que inclui, como vimos, países bonitinhos, fofos e civilizados, e troque por um punhado de lugares aonde você passaria férias, mas sempre ouviria da sua mãe: “cuidado por lá, é muito violento”. Combo 1: México + África do Sul + Colômbia: 52 mil. E países acossados pelo terrorismo? Combo 2: EUA + Rússia + Nigéria + Paquistão = 63,5 mil. Só um pouco mais que o Brasil.
E em termos proporcionais? Aí o Brasil cai para 14º. Todos os países com uma realidade ainda mais violenta (de novo, sem incluir aqueles em estado de guerra) são África do Sul, Venezuela e pequenas nações da América Latina, Caribe e África.
Mas talvez esses números e países que não nos dizem muito não sejam o problema em enxergar o tamanho da encrenca. Porque o Brasil pode ser o país com o maior número de assassinatos por ano, mas ainda assim você pode morar no Jardim Paulista, em São Paulo, tão pacífico quanto a Suécia. Ou em Nossa Senhora da Apresentação, o bairro mais violento de Natal, a cidade mais violenta do Brasil e a 10ª do mundo. Só no primeiro semestre de 2017, o bairro da capital potiguar registrou 40 homicídios .
Um bairro, em seis meses, teve mais assassinatos do que 66 países e territórios computados pelo UNODC.
Nossa Senhora da Apresentação, em um semestre, é mais violento que a Croácia inteira em um ano.
Um último porém. O Brasil do mapa é o de 2015. Em 2016, ficou pior. Chegamos a 61,6 homicídios. 
***
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quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

MORTO A TIROS

Do G1
O ex-governador do Espírito Santo Gerson Camata, de 77 anos, foi assassinado na tarde desta quarta-feira na Praia do Canto, em Vitória. O crime ocorreu em frente a um restaurante. Segundo a polícia, o ex-governador foi morto com um tiro no ombro depois de uma discussão com um ex-assessor, causada por uma ação judicial movida por Camata contra ele. Marcos Venício Andrade, ex-assessor de Camata, confessou o crime e foi preso.
O Samu chegou a ser acionado, mas o ex-governador morreu no local. Segundo a polícia, o autor dos disparos fugiu após cometer o crime, mas foi preso logo depois e presta esclarecimentos no Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). A arma usada não tinha registro e foi apreendida.
De acordo com o Secretário Estadual de Segurança Pública, Nylton Rodrigues, o suspeito foi preso e declarou, em depoimento, que a motivação foi uma ação judicial movida contra ele por Camata, que resultou no bloqueio de R$ 60 mil de sua conta bancária.
“Na tarde de hoje, o assessor foi tirar satisfação ao encontrar Gerson Camata na rua, na calçada, próximo a uma banca de revista e a uma padaria. Neste encontro, iniciou uma discussão verbal, onde o assessor sacou a arma e efetuou o disparo contra o ex-governador”, explica Rodrigues.
Camata foi governador do Espírito Santo entre 1982 e 1986, exerceu três mandatos como senador, de 1987 até 2011. Ele ainda foi vereador de Vitória, deputado estadual e deputado federal.
Depois de ser baleado, Camata ficou caído na calçada. A família esteve no local do crime. Depois da perícia da Polícia Civil, o corpo Departamento Médico Legal (DML) de Vitória. No início da noite, os parentes ainda não tinham liberado o corpo. A ação será feita por um sobrinho de Gerson, Edmar Camata.
Prisão
A Secretaria de Estado da Segurança Pública e Defesa Social (Sesp) divulgou que o suspeito do crime, Marcos Venício Andrade, de 66 anos, foi preso e encaminhado para prestar depoimento na sede do Departamento de Himicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), em Vitória. Marcos é ex-assessor de Gerson Camata e autor do disparo que tirou a vida do ex-governador.
Durante depoimento, Marcos confessou à polícia ser o responsável pelo crime.
A defesa de Marcos não quis comentar sobre o assunto. Informou apenas que o suspeito vai passar a noite na Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), na Capital, e na manhã desta quinta-feira (27) será levado para o Centro de Triagem de Vitória.
Suspeito e vítima tinham relação conflituosa
Marcos Andrade trabalhou como assessor de Gerson Camata por quase 20 anos. Em 2009, contudo, a relação entre eles ficou comprometida quando Marcos denunciou um suposto crime de caixa 2 cometido por Camata ao jornal "O Globo".
Em entrevista, Marcos afirmou que Camata recebia mesadas de empreiteiras, apresentava recibos falsos de contas eleitorais e obrigava funcionários a pagar, com salários do Senado, suas despesas pessoais.
Gerson Camata negou as acusações à época. Ele afirmava que Marcos sofria de problemas psicológicos e que suas acusações não deveriam ser levadas em consideração.
O processo continua ativo na Justiça do Espírito Santo.
Biografia
Gerson Camata nasceu em Castelo, no sul do Espírito Santo, em 1941. Começou a vida profissional como jornalista e apresentador no programa Ronda Da Cidade, na Rádio Cidade de Vitória. Era formado em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Vitória.
Camata começou na vida pública como vereador da capital do Espírito Santo em 1967, no mandato seguinte, em 1971, foi eleito Deputado Estadual. Foi Deputado Federal por dois mandatos, de 1975 a 1983, governador do Espírito Santo em 1983 e foi por três vezes senador pelo estado, de 1987 até 2011.
Camata foi o primeiro governador democraticamente eleito depois da Ditadura Militar, no período de reabertura política.
Gerson é casado com Rita Camata, ex-deputada federal. Ele deixa dois filhos.
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GABINETE COMPARTILHADO

Alessandro Vieira, Filipe Rigoni e Tábata Amaral, Congressoem Foco
Uma renovação histórica. A maior das últimas duas décadas. Esse foi o saldo das eleições de 2018. Na Câmara de deputados foram 52% do parlamentares eleitos que não faziam parte dos atuais corredores da câmara baixa. Já no Senado foram 85,19%.
No entanto, a verdadeira renovação que interessa ao país não é a de pessoas, mas sim a de práticas. É na nova legislatura que veremos quão profunda foi de fato essa mudança.
Essas eleições foram travadas ao redor da ruptura com uma política tradicional caracterizada pelo patrimonialismo e clientelismo. Da construção de um Brasil contemporâneo onde privilégios não têm vez. Transparência, combate à corrupção, respeito ao dinheiro público, proximidade com os eleitores. Em uma palavra: inovação.
O desafio agora é traduzir a inovação das campanhas em inovações nos mandatos. É desse clamor por um novo Congresso que surge um novo modelo de mandato parlamentar: o gabinete compartilhado.
Um espaço de inovação e eficiência no Congresso. Uma estrutura para apoiar a ação conjunta dos três diferentes parlamentares, de três diferentes partidos, unindo câmara e Senado. Um time de alto desempenho definido por um processo seletivo nacional. Talentos da sociedade e do próprio legislativo, do direito à ciência de dados. Gerando não só economia, mas resultados. Isso é o que definiram parlamentares que abrem mão do protagonismo individual em nome de um projeto coletivo. Ao invés de gabinetes separados, eles vão fazer o primeiro “co-working” do Congresso Nacional.
O gabinete compartilhado também cumpre uma missão para fora dos muros do Congresso.  Um dos grandes motores da renovação política de 2018 foram os movimento de renovação, dentre os quais o Acredito.
Eles buscam aproximar a sociedade da política. Derrubar barreiras de entrada para novos talentos. Para isso, o gabinete se manterá próximo das demandas da população, usando as mais recentes tecnologias. Mais ainda, será espaço de formação das novas  lideranças políticas que o Brasil tanto necessita.
Por trás do gabinete, três parlamentares que materializam o conceito de nova política. Um delegado cuja carreira foi pautada no combate à corrupção e foi eleito após uma das campanhas mais baratas no Brasil feita pelas redes sociais.
Uma jovem que, da periferia de São Paulo à Universidade de Harvard, defendeu a educação como o pilar de um novo Brasil.
O primeiro cego do congresso que busca construir um Brasil pautado pela ciência e a  inovação, levando para a economia nossa capacidade de continuar nos reinventando.
A renovação política passa por pessoas, mas é com exemplo que mostraremos que um novo Brasil é possível.
* Alessandro Vieira é senador eleito por Sergipe; Filipe Rigoni é deputado federal eleito pelo Espírito Santo; Tábata Amaral é deputada federal eleita por São Paulo. Os três novos parlamentares são líderes do Movimento Acredito. Texto escrito especialmente para o Congresso em Foco.
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terça-feira, 25 de dezembro de 2018

MORRE SIGMARINGA SEIXAS

Do G1
O advogado e ex-deputado federal Luiz Carlos Sigmaringa Seixas morreu nesta terça-feira (25), em São Paulo, aos 74 anos. Ele estava internado no Hospital Sírio-Libanês, onde fez transplante de medula para combater uma mielodisplasia – um tipo de falência da medula óssea na produção de células.
Segundo a família, ele conseguiu fazer o transplante, mas com baixa compatibilidade. Após a operação, o jurista ficou com baixa imunidade e foi atacado por uma infecção.
O corpo de Sigmaringa Seixas será sepultado em Brasília. O velório deve começar às 8h desta quarta (26) no cemitério Campo da Esperança, na Asa Sul, e o enterro está previsto para as 16h30.
Nascido em Niterói (RJ) e formado em Direito na Universidade Federal Fluminense (UFF), ele se mudou para Brasília na década de 1970. Na capital, tornou-se conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF) de 1976 a 1984.
O jurista ficou conhecido por defender presos políticos e estudantes durante a ditadura militar. Com a abertura democrática, foi eleito parlamentar.
Sigmaringa Seixas foi eleito deputado federal para a Assembleia Nacional Constituinte de 1987, pelo PMDB-DF, e transitava com facilidade no ambiente político.
Ele teve outras duas passagens pela Câmara dos Deputados, sempre por diferentes partidos: pelo PSDB, de 1991 a 1995, e pelo PT, de 2003 a 2017.
Em 1994, o advogado foi candidato ao Senado pelo PSDB, mas recebeu 10,51% dos votos e não foi eleito. As vagas ficaram com Lauro Campos (PT) e José Roberto Arruda (PP).
Repercussão
O presidente da República, Michel Temer, postou uma mensagem de luto no início da tarde de terça-feira (25): "Lamento imensamente a morte do grande advogado e homem público, Sigmaringa Seixas, um lutador pela democracia brasileira. Meus sentimentos de pesar à familia e amigos".
A morte também foi lamentada pelo governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg (PSB), nas redes sociais. "Sempre investiu no diálogo para buscar soluções para o Brasil", escreveu. Ele decretou luto oficial de três dias na capital.
A presidente nacional do PT, senadora Gleisi Hoffmann, chamou o advogado de "lutador incansável pela justiça e pela democracia em nosso país".
Em nota, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) manifestou profundo pesar. O presidente nacional da Ordem, Claudio Lamachia, diz no texto que Seixas teve atuação "memorável tanto na defesa dos Direitos Humanos como também na dedicação a advocacia".
"Com longa dedicação a política, foi deputado federal constituinte e teve atuação marcada pela defesa das causas humanistas", diz a OAB. Seixas foi conselheiro da entidade no DF entre 1976 e 1984, além de consultor da Anistia Internacional e vice-presidente do Comitê Brasileiro de Anistia no DF.
O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, afirmou em nota que Sigmaringa Seixas "deixou sua marca como homem público, deputado constituinte e advogado primoroso, sempre pronto a lutar pelos Direitos Humanos, pela Democracia e pela Liberdade em nosso País, trabalhando com humildade pelo bem comum, sem buscar os holofotes. Entre as características de sua personalidade, estavam a discrição e a vocação para o outro."
Além de Toffoli, o ministro Gilmar Mendes também manifestou pesar pela morte do advogado. "Um mestre na arte da conciliação e da tolerância, um agregador por natureza e vocação", diz a mensagem publicada no Twitter".
O pai dele, o também advogado Antônio Carlos Sigmaringa Seixas, morreu aos 94 anos em 2016.
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FELIZ NATAL !


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A todos os amigos, leitores, parceiros do blog Sou Chocolate e Não Desisto, votos de um Natal de paz,  fraternidade, amor e felicidade. Feliz Natal ! Abraço, Valério Sobral.

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segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

O BODE NA SALA

Artigo de Fernando Gabeira
No final de ano, costumo tirar uma semaninha de descanso. Continuo lendo e escrevendo. Mas tento me libertar dessa gigantesca máquina de informação que nos bombardeia, incessantemente, com notícias, imagens, logotipos, memes, posts e tuítes. É uma forma de sobreviver ao estresse, à produção de cortisol que inibe a glicose no hipocampo e danifica a memória. Com o tempo, um cérebro absolutamente informado corre o risco de ser um cérebro em pandarecos.
Mas, como sou brasileiro, tomo minhas precauções. No início do mês, escrevi um artigo intitulado “Cuidado com dezembro”. É o mês que os políticos preferem para suas decisões absurdas, pois há férias, e o espírito de Natal embala as pessoas comuns. O artigo era resultado de uma experiência de meio século, pois seu ponto de partida foi o AI-5, em 13 de dezembro de 68.
Vivendo e aprendendo. As táticas parecem cada vez mais sofisticadas. Marco Aurélio decidiu numa canetada libertar 169 mil presos (segundo a Procuradoria-Geral da República), Lula inclusive. Não deu certo. Era claro que não daria. Lula nem chegou a arrumar as malas.
No meio do ano, acompanhei da Rússia uma tentativa semelhante. Para mim, era evidente que não daria, mas a cena política teve sua dose de drama. A decisão de Marco Aurélio era tão absurda que durou apenas algumas horas. Foi derrubada, e todos que a temiam respiraram aliviados.
O que há de novo neste dezembro é a tática do bode na sala. A libertação de 169 mil presos cumpriria esse papel. O bode foi retirado, e poucos se deram conta de que Lewandowski autorizou um aumento do funcionalismo, que Rodrigo Maia promulgou uma lei que permite às cidades gastar mais, e os deputados deitaram e rolaram nos projetos de isenção fiscal e aumento do Fundo Partidário. Eles sabem que isso tudo resulta em quebradeira, mas contam, como sempre contaram, com alguma forma de aumentar impostos.
A relativa frieza não é incapacidade de me indignar. Apenas tento economizar energia, sobretudo depois de um ano tão intenso como foi 2018.
Se mergulhar acriticamente no turbilhão de notícias e polêmicas nacionais, estou perdido. De um modo geral, tenho acesso a elas depois de um dia de trabalho na rua ou no mato.
Às vezes, consigo uma precária conexão no hotel e caio num intenso debate sobre Jesus na goiabeira. Sinceramente, por mais calorosos que sejam os argumentos, minha pergunta não faz sentido, apesar de falarmos o mesmo idioma: eram goiabas brancas ou vermelhas?
Isso porque andei lendo um texto sobre Karl Barth, e sua mensagem é clara: traduzir a revelação divina em termos que não são os da fé está destinado ao fracasso.
Na infância, a árvore de preferência é a jabuticabeira. Havia a chácara de um turco, e subíamos para colher algumas jabuticabas. Os empregados às vezes respondiam com tiro de sal e atingiam o bumbum dos meninos. Doía.
Assim como no sertão de Guimarães Rosa, Deus, se vier, terá de vir armado; na chácara do turco, Jesus teria de vir acolchoado.
Observo que, nos Estados Unidos, alguns escritores acham que o ano de 2018 foi de muita raiva. Isso aconteceu também no Brasil. Eles propõem a catarse e a reconciliação como antídoto.
É um remédio fácil de receitar. O difícil é encontrar a fórmula. Em dois lugares importantes, Minas e São Paulo, a diplomação dos deputados, que sempre é uma cerimônia tediosa, resultou em pancadaria.
Um livro chamado “Seis propostas para o próximo milênio” aconselhou a leveza como uma das qualidades para o século XXI. No Brasil de hoje, consigo apenas uma semaninha para levezas. Perco uma parte de dezembro advertindo sobre armadilhas da época e entro janeiro com um pé atrás, desde o naufrágio do Bateau Mouche e o deslizamento na Enseada do Bananal, em Angra.
Muito possivelmente, teremos um ano melhor. Se não houver reconciliação, apenas um pouco mais de tolerância já pode ajudar. O resto são chuvas de verão, seu potencial destruidor, e cerca de 500 cidades brasileiras com um índice absurdo de infestação de Aedes aegypti, o mosquito de dengue e chicungunha.
Mas isso já e falar de volta às aulas, em pleno período de férias. Por enquanto, vamos saudar o bode na sala: não soltaram 169 mil criminosos. Cobraram apenas alguns bilhões pela gentileza.
Artigo publicado no Jornal O Globo em 24/12/2018
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AS DELÍCIAS DAS VÉSPERAS

Ricardo Soares, DOMTOTAL
Pois então é véspera. Véspera de mais alguma coisa. De um peru, de um futuro, de um veludo vermelho e quente sob um abacaxi tropical. Véspera de Natal, de pseudo-encantamento  , de trégua ao tormento, véspera de cerveja no isopor e de intoxicação alimentar.
Então segue sendo véspera de alumbramento, de renovação de esperanças, de destemperanças travadas durante o ano, de retratos revistos que doem nas almas. Vésperas de recordações passadas, recordações das casas dos nossos mortos, de cais que já não ancoram navios remotos, vésperas de velhos natais não festejados em alto mar quando a legião de imigrantes que somos se aproximavam das costas do porto de Santos.
Pois as vésperas subiram as serras, ancoraram em cidades, colocaram flores nos jarros, rezaram pais nossos ao lado das rabanadas, pediram aos santos e santas mais prosperidades nos altares. Mais do que natais eu gosto das vésperas. Porque elas sempre são o que está por vir e não a ressaca de um natal que passou com a certeza de que seguimos sendo quem somos. Mortais de ossos frágeis a serem mal compilados em livros de histórias.
Ricardo Soares é diretor de tv, roteirista, escritor e jornalista. Publicou 8 livros, dirigiu 12 documentários.
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sábado, 22 de dezembro de 2018

MORRE DURVAL FERRAZ

Cláudio Teran, Facebook
Uma das pessoas mais gentis que conheci partiu na noite da sexta-feira 21.12) o ex-vereador e professor Durval Ferraz, aos 70 anos.
A morte encerrou seu sofrimento. Acamado há três  anos ele sofria de uma doença neurológica muito grave e degenerativa, que o afastou de tudo. Dada a fragilidade contraiu uma pneumonia que encerrou sua história neste plano.
A CARREIRA
Durval foi um petista raíz. Entrou para a política via militância estudantil. Professor de História, foi um dos primeiros quadros do PT a vencer uma eleição em Fortaleza, tornando-se vereador.

E se destacou na oposição ao PMDB e ao então Prefeito Juracy Magalhães. Durval comandou a primeira CPI a desnudar a prática do prostiturismo em Fortaleza, com repercussão nacional.
Em seus quatro mandatos criou a Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal, e foi a primeira voz a defender as chamadas minorias através da atuação parlamentar.
Na esteira do sucesso dele na política, o PT foi conseguindo eleger quadros como João Alfredo; Nelson Martins; Luizianne Lins; Arthur Bruno; José Maria Pontes, entre outros.
Durval tentou ser deputado estadual em duas ocasiões, sem sucesso. Depois que deixou a Câmara ao perder a quinta tentativa de reeleição, serviu como secretário da Educação na cidade de Horizonte.
E também deu aulas de Religião em escolas de Fortaleza, adepto que era da chamada Teologia da Libertação. Desiludido com o PT trocou o partido pelo PSB no declínio de sua liderança.
EPITÁFIO
Guardarei de Durval Ferraz a gentileza e a refinada educação que lhe saltava dos olhos, e bastava olhar para ele. Distinto por excelência,  convivia com os adversários políticos sem perder a leveza e a fleuma inabaláveis.
"Vai chegar um tempo em que a compra de votos vai tornar a política um vale tudo sem credibilidade e tomada por oportunistas", dizia Durval no final dos anos 80. A frase eu guardo de lembrança das muitas entrevistas que ele me concedeu.
SERVIÇO RELIGIOSO
O velório ocorre a partir das 8 horas deste sábado (22.12). O enterro será às 11 horas, no Cemitério Jardim Metropolitano...
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quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

ALVO DE PROCESSO

Da Carta Capital
Uma das deputadas mais votadas nas últimas eleições, Joice Hasselmann, filiada ao PSL de Jair Bolsonaro, responde a mais um processo por fraude. A jornalista tem um longo histórico de acusações por plágio. Desta vez, por causa de um processo movido por um dos personagens citados no livro “Delatores”, soube-se que o “livro-reportagem” assinado por ela na verdade foi apurado e escrito por outro repórter.
Ou seja, Hasselmann assina uma obra baseada em coleta de dados e análise de documentação que não passou por seu crivo. “Delatores” trata de um tema delicadíssimo, com implicações judiciais: as informações prestados por colaboradores premiados no âmbito da Operação Lava Jato.
A história veio à tona em decorrência de um processo movido contra Hasselmann por Hermes Freitas Magnus, um dos delatores citados no livro. Magnus, empresário que denunciou um esquema do falecido deputado José Janene na Petrobras, reclama de “inverdades” contidas no livro.  
Na ação judicial, o empresário apresenta documentos que mostram como as tratativas sobre o material publicado se deram entre ele e o escritor contratado, que teria tentado fazer com que Hasselmann corrigisse as informações imperfeitas antes da publicação, sem sucesso.
A deputada eleita nega  as acusações e garante que apurou as informações e escreveu a obra sem auxílio de ninguém. “Meu livro é meu. Não tem nada de ‘ghost’. Isso é pilantragem”. Magnus, afirma, é um “aproveitador em busca de holofotes e dinheiro.”
O jornalista apontado como ghostwriter disse a CartaCapital que, por força de contrato de confidencialidade, não irá se pronunciar sobre o tema. A editora não respondeu às ligações até a publicação desta reportagem.
 Entenda o caso
Magnus, proprietário da Dunel Indústria e Comércio, figura na Operação Lava a Jato como um denunciante que revelou, em 2014, a existência de um esquema  de lavagem de dinheiro posto em prática por Janene, então um dos próceres do PP.
No livro “Delatores. A ascensão e a queda dos investigados na Lava Jato”, assinado por Hasselmann, Magnus figura como participante dos esquemas investigados, tendo se tornado delator premiado posteriormente. Ou assim seria registrado o episódio nas páginasa. É que, antes do lançamento do livro, no início do ano passado, a jornalista e a editora promoveram o livro. Em uma das propagandas, havia um trecho com afirmações consideradas falsas pelo empresário.
Magnus decidiu então entrar em contato com a autora do livro e a editora. E soube que “Delatores” não havia sido escrito por Hasselmann, mas pelo ghostwritter. Diante da informação, o empresário passou a pleitear do jornalista contratado para fazer o trabalho pela futura deputada que alterasse o termo “delator” por “denunciante”. O pedido foi atendido.
Não satisfeito, Magnus solicita a mudança na propaganda do livro  circulava pela internet. O jornalista contratado informa, porém, que a alteração está fora de seu alcance. Tudo isso consta em conversas pelo aplicativo Whatsapp, cuja reprodução fotográfica consta no processo judicial movido contra Hasselmann e também abaixo.
Sem ter os pedidos atendidos, o empresário decidiu escrever diretamente para a editora, para Hasselmann e para o ghostwriter:
Magnus pede na Justiça uma indenização de 2 milhões de reais. A deputada eleita ainda não se manifestou no processo, mas gravou um vídeo em que exibe a sua contrariedade por estar sendo acionada judicialmente. “Vá pro raio que te carregue e leve todos esses vagabundos aí que estão envolvidos na Lava Jato com você. Vai pedir pro Geddel 2 milhões sem vergonha. Pilantra de quinta categoria.” Sobre ter ou não contratado um ghostwritter, a “autora” do livro não se pronunciou.
A advogada Ana Júlia Moraes, sócia das áreas de Resolução de Disputas e Arbitragem de W Faria Advogados, explica que não há qualquer tipo de crime na prática de se contratar um ghostwritter. O problema não seria, portanto, jurídico, mas apenas de natureza ética, ainda mais quando alguém se apropria da fa fama por ter escrito um livro investigativo, one afirma ter apurado e desvendado questões ligadas a uma das maiores operações policiais do Brasil.
“Não há ilegalidade na formalização de um contrato de terceirização de obra literária, desde que as vontades das partes envolvidas estejam livremente pactuadas e sejam respeitadas”, explica a jurista. “Se o real autor da obra consente em não aparecer ao grande público, não tem nada de ilegal”, conclui.
Outros casos de Joice: plágio e uso indevido da marca
Joice Hasselmann tem em sua carreira outro caso envolvendo apropriação intelectual de trabalho feito por outros jornalistas. Ele veio à tona em 2015, quando o Sindicato dos Jornalistas do Paraná reuniu mais de 60 reportagens que ele havia reproduzido em seu blog pessoal que tinham sido escritas por outros jornalistas do Estado. O resultado da apuração do sindicato pode ser visto aqui.
Ela foi denunciada por 23 jornalistas que tiveram seus textos copiados. Ainda assim, jamais assumiu a responsabilidade pela apropriação das reportagens. Em sua conta de Facebook, afirmou: “Lamentavelmente o meu novo auxiliar não seguiu as minhas orientações básicas de dar crédito às matérias de outros veículos e estou tendo esses problemas”. A culpa, era, portanto, do estagiário.
Atualmente, a deputada eleita sofre ainda um outro processo, desta vez por uso indevido da marca, movido pela revista Veja e pela Editora Abril. Seu número: 1038197-42.2016.8.26.0100
Joice foi funcionária da publicação, e lá apresentava um jornal via internet. De acordo com a Editora Abril, que já venceu op processo em primeira instância e aguarda agora que a apelação de Joice seja julgada, mesmo após ter sido demitida pela revista, a jornalista continuou tentando fazer parecer que ainda trabalhava para a Veja. Para tanto, fez uso do nome “Veja Joice”para seu programa na internet e também de uma linguagem visual muito próxima da que existia no jornal apresentado por ela na Abril. A jornalista nega, afirma ser mera coincidência.
Veja as imagens dos dois jornais de internet, aquele em que ela apresentava na revista e, abaixo, o que passou a apresentar em site independente. Os comentários nas imagens são dos advogados da Editora Abril.
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terça-feira, 18 de dezembro de 2018

DUAS ÉTICAS

Do Blog do Luiz Carlos Azedo, Correio Braziliense

Todo governo recém-eleito pode muito, inclusive em relação aos Congresso e ao Supremo, mas não pode tudo. É uma espécie de beabá da relação entre os Poderes e com a sociedade, mas isso não significa que tudo será como antes no quartel de Abranches, como alguns imaginam. Estamos diante de um governo visceralmente diferente de todos os que passaram pela Esplanada dos Ministérios, inclusive o do ex-presidente Fernando Color de Mello, cuja eleição é a que mais se aproxima da de Jair Bolsonaro do ponto de vista eleitoral, com a diferença de que a eleição do primeiro foi solteira e não desarticulou o sistema partidário que depois o apeou do poder.
A eleição de Collor foi beneficiada pela “cristianização” da candidatura de Ulysses Guimarães. Não se pode dizer exatamente o mesmo do ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles, que era um estranho no ninho peemedebista. Mas a adesão de forças políticas por gravidade no segundo turno foi igualzinha. Outra semelhança é a ausência de uma base parlamentar articulada em termos de coalizão partidária. Na política externa, Collor foi multilateralista, enquanto Bolsonaro é “trumpista”; na política econômica, o ex-presidente transformou seu projeto liberal num estelionato eleitoral, por causa do confisco da poupança, enquanto Bolsonaro promete fazer ajuste fiscal de arrombar, para viabilizar seu programa ultraliberal.
O senso comum aponta para um governo conservador na política e nos costumes, assumidamente de direita do ponto de vista ideológico. Essa é a cara do governo nas redes sociais, escolhidas como terreno mais favorável para o embate com as forças derrotadas na eleição. O novo modelo de comunicação do governo reproduz a estratégia vitoriosa da campanha eleitoral, mas será que vai funcionar? Bolsonaro (PSL) anunciou, por exemplo, que realizará uma live semanal no Facebook para comunicar as ações de governo, repercutindo-a no Twitter. Esse é o padrão do presidente norte-americano Donald Trump. Há um certo desconhecimento de que a comunicação do governo é institucional e dela depende a interação com a sociedade no dia a dia.
Segundo Bolsonaro, “o poder popular não precisa mais de intermediação” e graças a isso manterá uma comunicação direta com os eleitores. Embute a ideia de uma democracia plebiscitária, que não respeita a oposição nem as minorias; com sinal trocado, é o mesmo equívoco de setores de esquerda que defendem a democracia direta, ou seja, a substituição da democracia representativa, a subalternização dos demais poderes constituídos da República, principalmente o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo o analista político Murilo Aragão, esse modelo pode funcionar muito bem enquanto o governo goza de grande popularidade, mas tende a gerar tensões com os grandes meios de comunicação e o sistema político tradicional.
Orçamento
“A exploração das redes, assim como certas ações de Bolsonaro, como conceder uma de suas primeiras coletivas de imprensa, após ter vencido a eleição presidencial, em cima de uma prancha de surfe, ou aparecer na semana passada vestindo camisa Nike, ou realizar flexões e praticar tiro em visita à sede do Bope, ajudam a manter a imagem de “mito” e de político “antissistema”, avalia Aragão. Na rotina da administração pública, porém, a vontade política do governante não basta, é preciso ter legitimidade nas ações. Ou seja, é absolutamente necessária uma justa relação entre a chamada ética das convicções, que move os políticos, e a ética da responsabilidade, que pauta a alta burocracia, tensão clássica da democracia. Nesse aspecto, há contradições instaladas no governo que podem ser determinantes para sua imagem futura
Talvez o epicentro dessa contradição já esteja instalado no Itamaraty, onde o novo chanceler Ernesto Araújo surpreende os colegas a cada dia. Toda uma geração de embaixadores está aterrorizada com a possibilidade de deixar os postos e amargar um fim de carreira no ostracismo. Mas essa tensão também ocorre no superministério criado para o ex-juiz federal Sérgio Moro, escalado para combater a corrupção na administração pública e enfrentar o problema do crime organizado. A primeira tarefa do novo ministro da Justiça tem maior caminho andado, por causa da Operação Lava-Jato; a segunda é o grande problema, como está patente no caso do Rio de Janeiro, onde o novo governador Wilson Witzel cedeu às corporações e deu status de secretários ao Chefe da Polícia Civil e ao Comandante da Polícia Militar, jogando por terra o trabalho feito pelos generais interventores para reorganizar o sistema de segurança fluminense.
O maior desafio do governo Bolsonaro, porém, é a gestão da economia. O Orçamento da União de 2019, estimado em R$ 3,381 trilhões, com previsão de crescimento de 2,5% do PIB e com inflação da ordem de 4,25%, engessa o novo governo. O salário-mínimo será reajustado em 5,45%, chegando a R$ 1.006 em 1º de janeiro. Já a taxa básica de juros (Selic) deve fechar 2019 em 8% ao ano e o dólar, em R$ 3,66, de acordo com a estimativa. A previsão de deficit para as contas públicas foi mantida em R$ 139 bilhões, mesmo patamar de 2018, incluído o reajuste de 209 mil servidores civis ativos e 163 mil inativos em 2019. Para o ministro da Economia, Paulo Guedes, para mexer nisso aí, tem que aprovar a reforma da Previdência a toque de caixa. É aí que entra a política e a necessidade de cortar na própria carne para dar bom exemplo.
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segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

AO VIVO, MAS FAKE

Artigo de Marina Silva, PODER 360
A frase do presidente eleito, Jair Bolsonaro, na solenidade de diplomação, “o poder popular não precisa mais de intermediação”, até poderia provocar espanto e ser confundida como uma crença nas formas diretas de democracia, mas não se trata disso.
É verdade que a relação entre representantes e representados pode ser mais direta e os governantes podem consultar a população a qualquer instante, mas a ausência de filtros não é necessariamente algo virtuoso e pode, ao contrário, significar um desprezo pelas instituições republicanas e um artifício para não dar esclarecimentos convincentes sobre denúncias ou críticas que o governante venha a receber.
Em suas “lives” nas redes sociais, o presidente eleito dá indícios de querer governar na base da conversa casual e desinformada. Simula espontaneidade, mas segue um roteiro pré-definido para tirar o foco do que interessa.
Agora mesmo, falou várias barbaridades sobre os temas ambientais pra somente ao final comentar rapidamente os indícios de ilicitudes na movimentação milionária da conta do ex-assessor de seu filho deputado.
Dizendo apenas que se algo estiver errado, que se pague pelo erro cometido, deixa de dar explicações claras e transfere a responsabilidade. Fica parecendo que o combate enérgico à corrupção expirou a validade em menos de um mês.
O que não foi dito “sem intermediação“, terá que ser explicado às instituições. O que foi dito sobre as questões ambientais, já enseja crítica direta e pública.
Comecemos pela tal “indústria de multas destinadas a ONGs“, sobre a qual o presidente eleito mostra total desconhecimento. O sistema de conversão é simples: os infratores podem destinar 60% da multa em projetos de recuperação ambiental.
O Ibama abre um edital para apresentação de projetos e qualquer instituição pode participar –órgãos da administração pública federal, estadual ou municipal, institutos de pesquisa, universidades e ONGs. Com boa execução e fiscalização, essa pode ser uma forma rápida e eficiente de corrigir os problemas e repor os prejuízos causados pelos crimes ambientais.
Fica uma dúvida: Bolsonaro passou a atacar o Ibama por ter sido multado ao pescar em uma unidade de conservação? Ora, ele poderia financiar um bom projeto de recuperação ambiental e agora, como presidente eleito, reconhecer o zelo e eficiência dos fiscais que o autuaram.
Sobre sua vontade de integrar o índio à nossa sociedade, por serem “seres humanos iguais a nós“, isso pode ser tudo, menos uma demonstração de respeito. Nenhuma liderança ou organização indígena propõe que suas terras sejam zoológicos ou redomas de isolamento.
Inúmeros povos estão construindo ou já construíram os planos de gestão ambiental das suas terras e estão desenvolvendo seus produtos e relações comerciais, mesmo sem apoio governamental.
Os índios dispõem de centenas de organizações próprias, elegeram mais de 150 vereadores nas últimas eleições municipais e, agora, disporão do mandato da deputada federal Joênia Wapichana (Rede/RR), que representa, inclusive, as comunidades da TI Raposa Serra do Sol, que desenvolvem o mais inovador projeto de geração de energia limpa (eólica + solar) de Roraima.
O presidente eleito repete o mantra retrógrado de que a “licença ambiental atrapalha obras“. Mantém a visão ultrapassada da natureza como obstáculo ao desenvolvimento, e não diz que muitos problemas no licenciamento devem-se a projetos mal feitos, sem estudos adequados de viabilidade.
O pior é estender essa visão ao Acordo de Paris e às questões ambientais do planeta, construindo argumentos falsos para tirar o Brasil do mutirão de combate às mudanças climáticas e condenando a população brasileira a sofrer as graves consequências que já são visíveis em muitos lugares.
Já vivemos o aumento das doenças infecciosas, a desertificação de áreas semiáridas, a redução dos recursos hídricos, as concentração de chuvas rápidas e intensas nas áreas úmidas –com impacto negativo na agricultura e inundações nas grandes cidades– e vários outros problemas que se agravam rapidamente com as mudanças climáticas.
Todos os governos brasileiros trabalharam –ou tiveram que aceitar a contribuição dos cientistas– desde 1992 até definir os compromissos que nosso país assumiu no Acordo de Paris, firmado em 2015. São prioridades de nossa nação, compromissos voluntariamente assumidos sem qualquer imposição externa que atentasse contra a soberania do país.
Para alcançar suas metas, o Estado brasileiro precisa manter o que deu certo nas últimas décadas, corrigir as falhas e desenvolver novas iniciativas em diversas áreas. Precisamos assegurar 45% de energia das fontes renováveis, restaurar e reflorestar 12 milhões de hectares de vegetação e acabar com o desmatamento ilegal, sobretudo na Amazônia.
São políticas positivas para o país. Elas ampliarão os investimentos públicos e privados para aumentar a eficiência energética, estimularão o desenvolvimento de tecnologia e criarão condições para geração de novos empregos urbanos e rurais.
E não é verdade que a recuperação de florestas fará o país perder o controle sobre suas terras, como diz o novo presidente. Nenhum pedaço do Brasil ficará sob controle de outro país, é exatamente ao contrário: a devastação é que favorece o tráfico e a perda das riquezas nacionais.
Esses discursos verborrágicos, que colocam os índios e os brasileiros pobres como inimigos, inventam conspirações inacreditáveis e negam as evidências científicas, são artifícios ideológicos para justificar uma postura política. Mais que isso, servem para gerar especulação financeira e estimular uma nova onda de saques dos recursos naturais do Brasil.
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GURUS, CHARLATÕES E CURANDEIROS

Artigo de Fernando Gabeira
Volto de Goiás, onde revisitei o centro de João de Deus, em Abadiânia, e o sítio de Sri Prem Baba, em Alto Paraíso. Duas cidadelas espirituais, atingidas em níveis diferentes por um dos tradicionais adversários do espírito: a carne.
Na década dos 80, visitei o ashram de Rajneesh em Poona, na Índia. Faz anos, portanto, que me interesso pelo tema. Não tenho uma opinião formada, como os autores Joel Kramer e Diana Alstad, que escreveram o livro “The Guru Papers”, cujo subtítulo é: “máscaras de um poder autoritário”.
Eles afirmam que a relação entre guru e discípulos é uma espécie de deslocamento das estruturas sociais autoritárias para o âmbito das relações pessoais. Há algo, no entanto, que minha experiência individual leva a uma concordância com eles: religiões milenares não conseguiram alterar a fragilidade da natureza humana.
Mas isso não é uma grande novidade. O avanço da ciência e da tecnologia também não significou necessariamente um avanço ético.
Kramer e Alstad tratam mais de gurus de origem oriental. No capítulo em que descrevem seu poder sexual sobre os discípulos, destacam duas condições que o favorecem: o celibato e a promiscuidade, no fundo uma ausência de vínculos que deixa o discípulo mais vulnerável.
Alguns gurus de origem oriental vêm de sociedades mais rígidas. No Ocidente, tentam aplicar algumas de suas técnicas e rituais sob o argumento da liberação de impulsos reprimidos.
Em muitos casos, a relação com a discípula é vista como uma espécie de uma graça que a distingue dos outros. Mas há também a tentação de formar haréns com as escolhidas.
No caso de Sri Prem Baba, esses elementos não estão presentes. Mesmo porque, apesar de formado na Índia, ele é brasileiro, oriundo de uma sociedade mais liberal.
Ainda assim, ao me referir de passagem ao caso que teve com uma discípula, afirmei que era relativamente consensual. Isso porque o poder do guru é muito grande. Ao seguir um guru, somos convidados a nos render. Como lembram os autores, paixão significa abandono, deixar rolar: render-se, de uma certa forma, é um caminho para a paixão.
O caso de João de Deus é diferente. Ele é famoso por curar. Quando o entrevistei, percebi alguns traços do rude garimpeiro e uma certa ignorância sobre as forças ou entidades que lhe comunicavam o poder de curar.
Muito possivelmente, a relação entre um paciente e o curandeiro não tem as características de rendição emocional entre guru e discípulo.
Ora é uma necessidade de sobrevivência, ora a superação de um doença que impossibilita a vida plena, ou mesmo uma tentativa de contornar a condenação à morte pela medicina tradicional.
Ironicamente, no caminho para Abadiânia, soube que na cidade próxima, Alexânia, um padre foi condenado por abuso sexual. O mesmo aconteceu em Anápolis, onde João de Deus mora.
O mais irônico ainda é constatar que a concentração de poder nas mãos do guru ou do curandeiro os deixa espetacularmente fragilizados diante da vida.
No mundo político, as delações premiadas são validadas por provas. No universo espiritual, entretanto, basta a palavra do outro para desfechar uma onda de condenação. E isso vale inclusive para os campos onde o poder masculino se impõe: basta ver a comoção que o movimento feminista provocou no universo das artes nos EUA.
As religiões podem melhorar nossa vida porque ajudam a carregar o fardo da mortalidade. Mas os seres humanos, pelo menos foi meu aprendizado de vida, continuam frágeis e limitados como sempre foram.
Por isso, com o olhar de hoje, vejo como charlatanismo a proposta de Che Guevara de criar um novo homem. Na verdade, somos e seremos muito menos importantes do que julgamos ser. Creio que morreria de tédio num mundo perfeito. Por isso, dispenso a crença na vida eterna e procuro me ajeitar com minha condição de simples mortal.
O roteiro da minha viagem era o cinturão espiritual em torno de Brasília, uma espécie de contraponto à permissividade do universo político, onde a carne não chega ser um adversário considerável, no máximo uma distração na longa ordem do dia.
Artigo publicado no Jornal O Globo em 17/12/2018
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CORTINA DE FUMAÇA

Da Agência Pública

Na noite de 13 de novembro, centenas de professores se reúnem numa audiência pública contra o projeto Escola sem Partido, na Assembleia Legislativa de São Paulo. Cansados, apreensivos e irritados, eles parecem refletir as condições gerais da categoria. Alguns dias antes, uma pesquisa da Varkey Foundation tinha mostrado que o Brasil passara da penúltima para a última colocação no ranking de valorização dos professores.
“Vamos ver se o pessoal vai conseguir falar hoje”, diz um assessor do deputado Carlos Giannazi (Psol), responsável pelo encontro. Diante da dúzia de policiais militares que fazem a segurança do evento, a fala soa exagerada. Não é.
Pouco antes das 19 horas, uma mulher sobe ao palco e agita uma bandeira de Israel. A irritação da plateia vira raiva. Professores, alunos e seus apoiadores se levantam e berram em uníssono: “Machistas, fascistas não passarão!”. No palco, a mulher se anima. Aponta os dedos para o público com o gesto de metralhadora imaginária popularizado pelo presidente eleito Jair Bolsonaro. Quando o coro engrossa, ela muda o gesto. Ergue os dois dedos do meio. “Eu vou lá. Vou meter a mão nela”, diz uma espectadora na penúltima fila. A frase soa como figura de linguagem. Não é.
O deputado Giannazi sobe ao palco e consegue que a manifestante pró-Escola sem Partido desça de lá. Mas não há refresco. Um deputado recém-eleito pelo PSL –partido de Bolsonaro – consegue um microfone. Douglas Garcia. Ele começa a falar, mas é encoberto por vaias da plateia. Na mesa, Giannazi esbraveja. Em um lapso, os dois futuros colegas estão atracados, um agarrado à lapela do paletó do outro. A plateia vem junto.
A mulher lá de trás como que se teletransporta para o lado do palco e cumpre o prometido: mete a mão na que tinha agitado a bandeira israelense. Professores, deputados e militantes do presidente eleito rolam no chão aos socos. Policiais tentam intervir. Um deles gesticula assustado, mandando o colega chamar reforço.
Por volta das 19h30, a polícia consegue retirar os militantes do PSL e a audiência tem início. O economista e professor da Unicamp filiado ao Psol Plínio de Arruda Sampaio Jr. é um dos primeiros a falar. “O objetivo real do Escola sem Partido é negar a educação à nossa juventude”, diz. “Eles não querem pessoas que pensem. Eles querem pessoas que sejam vítimas de fake news. É disso que eles precisam.”
Arquivado ontem pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados, o Projeto Escola sem Partido não é o único fator de risco para os professores, e não apenas porque ele pode ser novamente proposto na próxima legislatura. O enfraquecimento dos 2,5 milhões de professores do país se daria principalmente por meio do aumento do ensino a distância (que substituiria docentes por aulas gravadas) e da expansão das instituições particulares em detrimento das públicas (que tenderiam a precarizar as condições de emprego e carreira).
Na época da audiência, o temor dos professores provinha de três fontes: de falas do presidente eleito, que prometeu educação a distância desde o ensino fundamental (a partir dos 6 anos) e propôs um sistema de vouchers para alunos de baixa renda; do plano de governo do PSL, que também fala, de forma genérica, em ensino a distância e em mais parcerias entre universidades e empresas privadas; por fim, da figura do superministro da Economia, Paulo Guedes, que tem tudo para funcionar como um catalisador tanto do ensino a distância quanto do incentivo à privatização.
Guedes já se mostrou disposto a influenciar diversas áreas do governo, e com a educação não deve ser diferente. Foi dele, por exemplo, a ideia dos vouchers, segundo reportagem da revista Piauí. O sistema foi testado na Universidade do Chile, onde Guedes deu aulas, à época sob intervenção da ditadura de Augusto Pinochet.
A influência de Guedes no futuro das políticas educacionais, contudo, pode ter motivações que vão além de sua visão neoliberal da economia. O futuro ministro atuou com investimentos no setor de educação privada e de educação a distância.
De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), o futuro ministro captou R$ 1 bilhão de fundos de pensão, entre eles Previ (Banco do Brasil), Petros (Petrobras), Funcef (Caixa) e Postalis (Correios). Os primeiros aportes foram feitos em janeiro de 2009, com prazo previsto de seis anos de duração.
Apenas o Fundo de Investimento em Participações (FIP) BR Educacional levantou R$ 400 milhões. Em outubro, as operações de Guedes com os fundos de pensão foram alvo de uma investigação pelo MPF e levaram à abertura de inquérito pela Polícia Federal, no final de novembro.
A apuração se originou na Operação Greenfield, que mira esquemas de pagamento de propina em fundos de pensão com base em relatórios da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc). Ainda em estágio preliminar e agora correndo em segredo de justiça, o inquérito investiga se houve gestão fraudulenta envolvendo Guedes e os responsáveis pelos fundos.
“O aporte de recursos nesse fundo foi feito às cegas, como que num voto de confiança na equipe de Paulo Guedes”, diz o MPF em um dos documentos sobre o caso.
O primeiro aspecto que chamou atenção da promotoria foi a cobrança de uma taxa de administração de 1,75% sobre o capital subscrito, não sobre o capital de fato investido. Como o capital do fundo vai crescendo aos poucos, as despesas relativas sobem muito quando a cobrança é feita dessa forma. Só no primeiro ano, os custos de gestão somaram R$ 6,6 milhões, 19% do patrimônio líquido médio do fundo no período.
No mesmo documento, o MPF elenca uma série de outras suspeitas. Paulo Guedes era ao mesmo tempo presidente da gestora que captava investimentos e conselheiro de investimentos da nima, uma das empresas de educação que receberam aportes do fundo. Além disso, os R$ 62 milhões aplicados no primeiro ano foram injetados numa única empresa ligada a Guedes, a HSM Educacional S.A. Em seguida essa companhia comprou outra, de um grupo argentino, a HSM do Brasil. Segundo a versão da Previc, o fundo pagou pelas ações dessa empresa R$ 16,5 milhões a mais do que o valor de mercado.
A HSM, na época, era apenas uma marca, não estava realmente em operação, o que tornaria a operação mais suspeita. Ainda segundo a Previc, a ideia era que essa empresa gerasse lucro com eventos, mas ocorreu o contrário: perdas em cascata, principalmente com a remuneração de palestrantes (quase R$ 12 milhões entre 2011 e 2012). Entre eles, estava Paulo Guedes. Em 2013, o fundo remanejou seus investimentos adquirindo outra empresa, a Gaec Educação, dessa vez com um ágio de 1.118% sempre de acordo com informações da Previc.
Atualmente parte dos fundos criados por Guedes está no portfólio da Bozano Investimentos, e uma fatia do dinheiro aplicado ali é reinvestida em oito empresas de educação. Entre elas estão a “Ser Educação”, que tem uma rede de universidades com 150 mil alunos; a “NRE”, com focos em cursos de medicina e 8 mil alunos; e a “Q Mágico”, que vende soluções para ensino digital e ensino a distância.
Além do dinheiro dos fundos de estatais, os fundos de educação da Bozano contaram também com investidores estrangeiros de peso. Em 2014, o grupo alemão de mídia Bertelsmann anunciou um aporte de € 30 milhões (cerca de R$ 100 milhões à época). Na ocasião, Thomas Mackenbrock, presidente do grupo em São Paulo, comemorou a parceria com a Bozano.
“O fundo BR educacional garante acesso antecipado a empresas brasileiras inovadoras em um campo que está repleto de oportunidades graças à digitalização progressiva e à crescente demanda por educação na América Latina. Na Bozano Investimentos, encontramos um parceiro com conhecimento profundo do mercado educacional brasileiro.” Nas palavras do executivo, aquela seria uma parceria “única e mutuamente benéfica”.
Em 2015, o grupo Bertelsmann voltou a aplicar com a Bozano, dessa vez num montante maior, de R$ 800 milhões, e com um foco mais claro: escolas de medicina. À época, a iniciativa foi vista como mais um passo importante na internacionalização do grupo que ajudaria a sedimentar o setor de educação como um pilar importante no portfólio da empresa.
Procurado pela reportagem, o conglomerado não quis comentar um possível conflito de interesses na ponta de seus investimentos. “O senhor Paulo Guedes é fundador e CEO da Bozano Investimentos. Para questões relativas a Paulo Guedes, portanto, procure a Bozano Investimentos”, foi a resposta enviada por e-mail.
A Bozano Investimentos também preferiu responder por e-mail. “Conforme já anunciado, Paulo Guedes já se afastou totalmente de suas funções na empresa para exercer atividade pública. Além disso, todas as providências já estão sendo tomadas para que ele deixe a sociedade, rigorosamente em conformidade com as leis vigentes.” Não houve na resposta nenhuma referência à investigação do MPF, mencionada pela reportagem no contato inicial.
A reportagem procurou também a defesa de Guedes na investigação, que se manifestou por e-mail: “A defesa de Paulo Guedes reafirma a lisura de todas as operações do fundo que, diga-se de passagem, deu lucro aos cotistas, incluindo os Fundos de Pensão. Espera também que a investigação – agora corretamente conduzida no âmbito da Polícia Federal – apure as incoerências do relatório irregular produzido na Previc”.
Por fim, ainda no capítulo dos possíveis conflitos de interesses, é preciso citar Elizabeth Guedes, irmã do futuro ministro, que ocupa a vice-presidência da Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup). Ela também não respondeu aos pedidos de entrevista da Pública, mas em entrevista ao jornal O Globo no início de novembro negou que sua posição gere algum constrangimento. “Minha função na Anup não tem nenhuma relação com ele”, disse referindo-se ao irmão.
O ex-sócio de Guedes
O engenheiro Rafael Martinez foi vice-secretário de Educação do Rio de Janeiro e secretário de Educação de Resende. Além disso, foi também sócio de Paulo Guedes, por quem ainda hoje nutre considerável admiração. “O Paulo é um cara extremamente democrático”, disse em entrevista à Pública. “Controlava um sistema de partnership onde todo mundo tinha voz, independentemente do quanto investia.”
Para Martinez, a investigação do MPF não se sustenta. “O fundo BR Educacional deu um retorno para os cotistas de mais de 300% em sete anos. Foi um lucro bem grande e ajudou a diminuir o prejuízo que o governo do PT causou nos fundos de pensão”, disse. Ele acredita que as ingerências de Guedes na educação serão limitadas. “É natural que a atuação dele como gestor público e como investidor seja a mesma, que ele defenda ideias liberais. Mas não acredito que isso tenha alguma ligação com a irmã dele ou com o fato de que ele tem investimentos em educação”, disse.
Como ex-gestor da área, Martinez tem críticas ao Escola sem Partido, mas não considera o projeto de todo ruim. Para ele, a forma como a proposta está sendo feita é errada, mas há casos em que professores forçam a mão. “Existe, sim, uma predominância de ideologia de esquerda nas escolas. E muitos professores tentam passar essa ideologia para os alunos e contar a história de forma enviesada”, disse.
E vê com bons olhos o crescimento de instituições privadas: “A gente pode até questionar a qualidade de alguns grupos privados, mas de fato teve muito investimento em novas escolas, em novas faculdades, e isso acabou gerando um aperfeiçoamento da qualidade geral.”
Apesar dessa visão que pode parecer simpática às ideias do novo governo, Martinez é cauteloso em relação ao que foi esboçado até o momento. Para ele, se o país investir num sistema de liberalismo puro, onde a escola que atrair aluno sobrevive e prospera enquanto as outras definham, o resultado pode ser um desastre. “Isso funciona para uma loja de roupas, não para educação”, disse. “Pode levar dez anos para uma escola ir morrendo aos poucos. E, enquanto isso, os alunos e as famílias sofrem as consequências.”
O ex-secretário apontou problemas no sistema de vouchers, se o governo distribuir um valor fixo e permitir que as famílias o complementem, algo similar ao que ocorreu no Chile. “Um sistema que era para ser mais equânime, garantindo que todas as crianças recebessem o mesmo valor, acabou favorecendo famílias de alta renda”, disse.
O exemplo chileno
O sistema de vouchers no Chile foi criado no governo do ditador Augusto Pinochet em 1980. Ele garantia um valor fixo por estudante, que podia ser usado em escolas públicas ou privadas. Paralelamente a esse processo, os gastos com educação pública caíram pela metade entre 1980 e 1990, de 5% do produto interno bruto para 2,5%. E só se recuperaram depois da democratização e de uma série de governos de centro-esquerda.
O governo fez pouco para fiscalizar as escolas que trabalhavam com o modelo e o problema da desigualdade ficou patente. Estudantes mais pobres tinham dificuldade em usar vouchers – ou porque não conseguiam completar mensalidades ou por questões geográficas. Pelo menos 63 dos 345 municípios chilenos não chegaram a ter escolas que aceitassem vouchers, e a maioria deles ficava em regiões rurais ou pobres.
Como mostrou uma reportagem recente do Washington Post, muitas escolas continuaram a sofrer com falta de verba após a flexibilização do sistema, principalmente as localizadas em regiões carentes, as que recebiam estudantes de alto risco e as que tinham número baixo de matrículas. O percentual de estudantes da rede pública nunca se recuperou. Caiu de 78% do total, em 1981, para 39%, em 2013.
Para a diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais (Ceipe) da Fundação Getulio Vargas (FGV), Cláudia Costin, esses mesmos problemas seriam mais intensos num país com as dimensões e a diversidade do Brasil. “Temos 81,7% dos alunos em escolas públicas”, disse. “Não é possível substituir todas essas escolas por particulares. Quem é que vai querer ter escola pra população ribeirinha no meio da floresta amazônica, no alto das favelas do Rio?”
Ainda segundo Cláudia – que foi ministra da Administração e Reforma do Estado e secretária municipal de Educação no Rio de Janeiro –, há vários projetos sociais que permitem acesso de alunos carentes a escolas particulares. Mas geralmente é uma cota, voltada para os mais brilhantes. “Não se constrói equidade dessa forma”, disse.
Para ela, a solução seria buscar o caminho oposto: investir em educação pública de qualidade e aumentar a valorização do professor. De um lado, remunerando melhor, de outro tornando mais seletivos os processos de seleção. Além de se dificultar o ingresso nos concursos, seria possível, por exemplo, criar-se uma nota de corte artificialmente mais alta nos vestibulares de educação e pedagogia.
Privatização descontrolada
Se o caso do Chile faz prever graves problemas na prometida implantação do sistema de vouchers no ensino básico, já temos bons exemplos do impacto negativo que a privatização descontrolada pode causar no ensino universitário. Segundo o último censo da educação superior, mais de 75% das matrículas em graduação do país ocorrem em instituições particulares.
Esse movimento de expansão do ensino universitário privado começou em 1997, quando um decreto do então presidente Fernando Henrique Cardoso permitiu que as instituições de ensino superior tivessem oficialmente fins lucrativos. Entre 1998 e 2004 as matrículas na rede privada aumentaram 126%; foram 46% na rede pública.
Com a expansão do Fies – o sistema de financiamento governamental que permite matrícula em instituições particulares –, esse crescimento se concretizou. Segundo o Tribunal de Contas da União (TCU), entre 2010 e 2015, período de maior expansão do programa, grandes redes de faculdade privada viram disparar seus lucros: o da Kroton subiu 22.130%, o da nima, 820%, o da Estácio, 565% e o da Ser Educacional, 483%. Enquanto isso, de acordo com um relatório do Tesouro Nacional, o Fies custou aos cofres públicos R$ 32 bilhões em 2016, ou pouco mais do que os gastos com o Bolsa Família no mesmo ano.
Apesar do crescimento, as instituições privadas não parecem capazes de oferecer a mesma qualidade que as públicas. No último Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade), por exemplo, as universidades federais tiveram 43% de instituições com conceito 4 e 16% com conceito 5 – o mais alto do teste. Já nas particulares, esses percentuais foram de 19% e 3%.
Disputa de gigantes no ensino fundamental
No tabuleiro do ensino fundamental, a movimentação das peças já começou. Na esfera governamental, tramita no Senado um projeto de lei que quer permitir o pagamento de creches com o dinheiro do Fundeb. Na esfera privada, a Kroton anunciou recentemente a compra da rede de escolas do ensino básico Somos, numa operação avaliada em R$ 6 bilhões. A nima – a mesma que recebeu capital dos fundos de Paulo Guedes – estabeleceu parceria com a escola Lumiar.
Jogadores internacionais também estão se posicionando no ataque. Em 2017, a gestora de fundos americana General Atlantic elevou as participações na SAS, empresa que oferece livros didáticos e consultorias para mais de 700 escolas no Brasil.
“Estamos num momento de disputa bastante significativa sobre a natureza da nossa política educacional”, afirma Salomão Ximenes, professor da Universidade Federal do ABC e membro da ONG Ação Educativa. “No ensino superior, esse tipo de configuração, de grandes grupos privados, oligopolistas, que praticamente dominam o setor com um ensino de baixo custo e de baixa qualidade financiado pelo Estado, é uma realidade.”
Para Ximenes, o terceiro pilar esboçado pelo novo governo – a expansão da educação a distância – faz parte desse pacote de enfraquecimento da educação pública e da figura do professor.
“Educação a distância na educação básica é um retrocesso. Aumenta a desigualdade entre os estudantes de classes populares, de redes mais distantes, e os estudantes de elite, que terão professores bem formados, bem qualificados, presentes. É uma péssima forma de enfrentar o déficit de formação dos professores, que é estrutural no Brasil”, diz.
A exemplo do avanço da rede privada, a educação a distância já é uma realidade no Brasil. Atualmente, de acordo com o censo da educação, um em cada cinco alunos do ensino superior está matriculado num curso a distância. Em 2017, o setor avançou 17,6%, o maior salto desde 2008.
Em abril, o BNDES lançou uma linha de crédito de R$ 20 milhões para “incorporação de tecnologias digitais na educação pública”. Em novembro, o Conselho Nacional de Educação (CNE) liberou até 30% de conteúdo ministrado a distância para o ensino médio. Os resultados, por sua vez, não são dos melhores. Apenas 2,4% dos cursos a distância receberam nota máxima no Enade, ao passo que foram 6,1% dos cursos presenciais.
A distância e no improviso
“As universidades brasileiras têm feito cursos a distância de maneira improvisada”, diz o presidente da Associação Brasileira de Ensino a Distância (Abed), Fredric Litto. “Tentam repetir modelo presencial, e isso não é bom.” Para Litto, que também é professor emérito da USP, é preciso muito tempo, dinheiro e planejamento para criar materiais de qualidade. E mesmo assim o ensino a distância não pode ser usado indiscriminadamente. Ele é mais eficiente como complemento das aulas presenciais, como alternativa a pessoas que não têm acesso à sala de aula ou para alunos que estejam muito motivados.
Segundo Litto, a ideia de se usar o ensino a distância na educação básica não faz sentido. “Quanto mais jovem for o aluno, mais complicado é o uso de EAD [ensino a distância]. No ensino fundamental, pode-se ter atividades, usar celulares ou computadores com jogos e vídeos explicativos, mas nunca se pensar no conteúdo a distância como um curso completo.”
Para o professor, nascido e educado nos Estados Unidos, os brasileiros têm mania de achar que um mesmo sapato serve para todo mundo. “Eu não vi nenhum plano escrito do que eles pretendem fazer”, disse referindo-se ao plano genérico do novo governo. “Mas sei que não se pode substituir salas de aula presencial de jovens.”
Mais um ministro blogueiro
No final de novembro, depois de ter tido um primeiro nome vetado pela bancada evangélica, Bolsonaro anunciou, pelas redes sociais, o novo ministro da Educação. “Gostaria de comunicar a todos a indicação de Ricardo Vélez Rodríguez, filósofo autor de mais de 30 obras, atualmente professor emérito da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, para o cargo de ministro da Educação”, escreveu o presidente eleito.
O nome, indicado pelo guru intelectual de Bolsonaro, Olavo de Carvalho, pegou a imprensa e os brasileiros de surpresa. Alguns dias antes, Vélez Rodríguez havia postado em seu blog o texto “Um roteiro para o MEC”, em que já afirmava ser cotado para o ministério. Mas ninguém prestou atenção.
Apesar do título, o texto não traz de fato um roteiro claro. Fala em um sistema focado nos municípios, em “mais Brasil, menos Brasília”, critica uma suposta burocracia “gramsciana” que elaborou as “complicadas provas do Enem” e pragueja contra a “doutrinação de índole cientificista e enquistada na ideologia marxista”.
Vélez Rodríguez critica ainda a atuação de empresas financeiras ligadas a fundos de pensão. “Ao longo das últimas décadas, produziram um efeito pernicioso, qual seja o enriquecimento de alguns donos de instituições de ensino, às custas da baixa qualidade em que foram sendo submergidas as instituições docentes, com a perspectiva sombria de esses fundos baterem asas quando o trabalho de enxugamento da máquina lucrativa tiver decaído.”
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