Walcyr Carrasco, ÉPOCA
Ouvi falar que os perus estão preparando uma manifestação na
Avenida Paulista, contra o Natal. Ou uma pós-Natal, contra o abate
indiscriminado de seus pares. Mais ou menos como aconteceu com os petistas em
relação aos cargos comissionados logo após o início do governo Temer. Ou como
ocorre com ex-ministros e coligados despencados dos cargos após denúncias
irrefutáveis. Rebelam-se e prometem não votar qualquer coisa que interesse ao governo.
Esquecendo-se de que foram eleitos não numa espécie de Mega Sena política, para
ganhar apartamentos e afins, mas para melhorar o país. Ahn? Ah, bom, não
disseram que país. Muitos países devem ter melhorado com esse dinheiro farto
que correu para os bolsos dos vencedores da Mega Sena. Em Miami, por exemplo, o
mercado imobiliário cresceu com a venda de apartamentos de altíssimo luxo. Em
Paris, também. Oi? Era aqui? Ui!
Por incrível que pareça, eu quase fiz uma peça infantil
sobre a revolta dos perus contra o Natal. Tinha 17 anos, e ensaiamos a peça
alguns meses. Era profissional, sim. Eu seria um pintinho. Na época era magro e
não corria o risco de ser confundido com o peru como hoje. Nunca estreamos. A
produtora e autora foi presa pelo governo militar, por motivos políticos. Nada
a ver com a peça, penso eu. Embora perus em revolta tenham algo contra a ordem
estabelecida. Talvez tenha sido uma sorte. A peça, olhando assim à distância,
era horrível. E não gostaria de ter na minha biografia uma peça fazendo
piu-piu. O ano passou depressa. Juro! Nem um autor de novelas de fértil
imaginação como eu poderia imaginar todas as tramoias políticas destes últimos
meses. E tanta lavagem de roupa suja. Inclusive, se eu tivesse escrito uma
novela assim, ninguém teria aprovado. Por falta de nexo.
Há dois lados da questão, sempre. Por exemplo, o
impeachment. Ou golpe? Vamos supor uma outra realidade. Se o país estivesse às
mil maravilhas, com um crescimento econômico absurdo e Dilma lançando um
programa tipo bolsas Louis Vuitton para as companheiras da classe trabalhadora,
de tanta largueza, haveria impeachment? Aquela raspada fiscal nem seria
comentada, a não ser por adversários ferrenhos. Mas a situação econômica chegou
ao limite. Em situações assim, governos caem. No extremo, até pegaram Maria
Antonieta, que era uma rainha com sangue divino. Sangue divino ou não,
guilhotina! Olha que estamos muito longe de uma Revolução Francesa, que afinal
tinha seus idealistas. Já nós... Eu só quis explicar de maneira prática o que
penso. Mas aí me pergunto: do que adianta pensar? Os políticos não dão nem
mesmo satisfações sobre o que fazem com nosso dinheiro. Basta ir à Zona Sul de
São Paulo. Instalaram-se gigantescos pilares para construir um monotrilho, que
destruiu a paisagem. Horrendo. O metrô teria sido a solução moderna e eficaz.
Sabe-se lá por que (é melhor nem perguntar muito por quê) preferiu-se o
monotrilho. Obra do Estado. Abandonada há um bom tempo. Estão lá os pilares,
enfeiando a cidade. Ninguém dá a menor satisfação sobre a obra. Minha proposta
é chamar grafiteiros e transformar os pilares abandonados em uma exposição
permanente de arte. Há um outro lado da questão, sempre há. Falta de verbas
etc. Se não havia verbas, por que começaram? Esta é uma revista nacional. Falei
de São Paulo, onde moro. Olhe em torno. Sempre haverá uma obra inacabada perto
de você. Eu, se prometo alguma coisa e não cumpro, pelo menos peço desculpas,
dou meus motivos. Eles, não. Agem como se não tivessem nada a ver com isso.
De uma em uma chegamos ao fim do ano com os políticos como
candidatos a perus de Natal. São eles os assados nas conversas. Nos ânimos. A
prova: o vencedor nas urnas em São Paulo, João Doria, fez uma campanha dizendo
que não é político. Ganhou em primeiro turno. Embora candidatar-se em si já
seja um gesto político, mas enfim... Surgem movimentos onde os líderes não
querem se candidatar. Mas protestar, denunciar. Políticos são presos. E se
descobrem coisas, sim, dignas de Maria Antonieta, como a ex-primeira-dama que
botava colar e brinco no valor de R$ 1 milhão. A voz surda das ruas clama:
ninguém quer políticos, embora alguém deva tomar conta de tudo isto aqui.
Assim como os perus, a safra de políticos se renova sempre.
E todos fazem glu-glu. Essa questão tem um lado só. Comemoramos este Natal com
um peru na mesa e vários políticos no xilindró. Algo mudou. Falta aos políticos
perceber.


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