A passagem de Sergio Moro pelo
Ministério da Justiça em sua caminhada para o Supremo prometia ser a marcha
triunfal rumo à coroação.
Primeiro, institucionalizar o combate à corrupção tal como
feito pela Operação
Lava Jato. Na sequência, sentar-se na mais alta corte do país para não
deixar os corruptos impunes. Agora, graças aos tropeços políticos, o trajeto parece
mais um longo corredor polonês de humilhações. E de destino incerto.
Moro se apequena diariamente em sua relação com o governo do
qual topou participar. Teve sua indicação
de Ilona Szabó para o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária
vetada pelo presidente, pela qual teve de pedir desculpas públicas.
Aceitou o papelão de tirar foto com o ex-ministro
Vélez Rodríguez e anunciar a "Lava Jato da Educação". Mantém um
silêncio constrangedor sobre as fortes
evidências de corrupção que circundam a família Bolsonaro.
Tem sido sumariamente ignorado quando o assunto é liberar
as armas de fogo (o decreto mais recente foi anunciado publicamente
antes mesmo do parecer do Ministério da Justiça).
E agora observou o governo
abrir mão da promessa de manter o Coaf (Conselho de Controle de Atividades
Financeiras) sob sua alçada para facilitar a aprovação da reforma
administrativa junto ao Congresso.
Moro precisa mais de Bolsonaro do que o contrário. Para
virar ministro, largou a magistratura. Se sair do governo sem uma cadeira do
STF, fica sem nada e com a reputação manchada não só pelo fracasso de sua
gestão como pela subserviência e parcialidade demonstradas. Bolsonaro sabe
disso. E é por isso que em todas as ocasiões em que apoiar seu superministro
lhe custa alguma coisa, opta por desautorizá-lo.
Dizer
em público que indicará Moro para o STF é balançar na frente do
ministro a recompensa prometida; lembrá-lo de que todas as humilhações terão
valido a pena lá na frente. Mas 2020 está longe. Se Moro em cinco meses foi de
superministro e herói nacional a uma figura apagada e diminuída, será que nesse
ritmo ele dura mais um ano e meio?
E, se durar, será aceito pelo Senado? Rejeitar um indicado
para o Supremo seria inédito, indicaria o estágio terminal da crise entre
Executivo e Legislativo. Nos dias que correm, já não é impensável.
Assim, Moro vai engolindo todos os sapos que o governo lhe
apresenta, e ainda tem que fazer cara de quem gostou. Tem que trilhar um
caminho difícil entre a subserviência e a insubordinação. A cada passo em
falso, perde estatura.
A outra possibilidade seria abraçar de vez a política e se
lançar candidato. Mas se quiser manter sua força perante a opinião pública terá
que demonstrar força e não servilismo.
Bolsonaro usou a bandeira anticorrupção para crescer
politicamente sem jamais fazer nada pela causa. A realidade de seu gabinete (e
de seus filhos) parece mostrar um político imerso na pequena corrupção da
política brasileira e talvez com vínculos ainda mais sórdidos.
Moro continuará em silêncio, para não desagradar o chefe que
não lhe concede o mesmo respeito e cujas propostas populistas dificultam seu
trabalho?
Ou fará jus à reputação que construiu ao longo de anos de
perseguição implacável --e de alto grau técnico-- à corrupção no país? Melhor
arriscar tudo e permanecer um herói do que aceitar tudo e se transformar no
lacaio abjeto de um projeto de poder inescrupuloso.
Joel Pinheiro da Fonseca
Economista, mestre em filosofia pela USP.
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