Na sexta-feira 10, Jair Bolsonaro surpreendeu a plateia com
um aviso: “Talvez venha um tsunami na semana que vem”. O presidente não deu
explicações, mas acionou o alerta de crise em Brasília. Três dias depois, a
onda se ergueu no mar. O Ministério Público quebrou os sigilos do
primeiro-filho, Flávio, e de outras 85 pessoas ligadas ao clã.
A investigação começou no gabinete do Zero Um, que foi
alçado de deputado estadual a senador. Não se sabe onde terminará, e nem se o
presidente acabará entre os afogados.
Até aqui, o Ministério Público já afirmou que o escritório
parlamentar de Flávio abrigava uma “organização criminosa”, com “clara divisão
de tarefas” para desviar dinheiro público.
A ponta mais visível do esquema é a “rachadinha”, o truque
de embolsar parte dos salários de assessores. Os dados bancários poderão
esclarecer outas suspeitas, como a conexão da família presidencial com as
milícias.
O faz-tudo Fabrício Queiroz continua sumido. Foram dele os
cheques que abasteceram a conta da primeira-dama com R$ 24 mil. Se não
bastassem as transferências para Michelle, o presidente fez questão de trazer o
foco do inquérito para si.
“Querem me atingir, venham para cima de mim”, desafiou. Ele
reclamou de “esculacho”, mas não explicou a evolução patrimonial do herdeiro.
No mesmo dia, recitou a palavra “impeachment”, que ainda não estava na boca dos
adversários.
O tsunami não foi a única onda gigante da semana. Na quarta,
protestos pela educação se espalharam pelo país. O presidente chamou os
manifestantes de “imbecis”, o que deve engrossar novos atos contra o governo.
Na sexta, Bolsonaro divulgou um texto apócrifo, afirmando
que o país “é ingovernável” sem os “conchavos” que ele se recusaria a fazer.
“Que poder tem, de fato, tem o presidente do Brasil?”, questiona a mensagem.
O texto descreve Bolsonaro como refém das “corporações”,
entre elas o Congresso, a Justiça e até as Forças Armadas. No fim, traça um
cenário de “ruptura institucional irreversível, com desfecho imprevisível” e
recomenda a venda de ativos brasileiros.
O tom apocalíptico lembra a carta-renúncia de Jânio Quadros,
outro presidente que chegou ao poder com discurso messiânico. Na campanha, ele
brandia uma vassoura com a promessa de limpar a “bandalheira” da política. No poder,
perdeu-se em atitudes e medidas excêntricas, como a proibição da briga de galo
e do maiô de duas peças.
Em agosto de 1961, Jânio escreveu que desejou “um Brasil
para os brasileiros”, mas foi “esmagado” por “forças terríveis”. A renúncia,
sete meses depois da posse, foi uma tentativa frustrada de emparedar o
Congresso. “Imaginei que o povo iria às ruas, seguido dos militares, e que
seria chamado de volta. Deu tudo errado”, ele confessaria, três décadas depois.
Bolsonaro já imitou o antecessor nas cruzadas conservadoras.
Censurou a propaganda de um banco público porque não gostou dos figurantes e
ofendeu homossexuais ao dizer que o país dispensa o “turismo gay” porque “nós
temos famílias”.
Ao flertar com a radicalização, o presidente sugere que o
fantasma de Jânio continuará a nos assombrar.
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