No 1.º ano de seu papado, Francisco apontou como o problema
mais urgente que a Igreja enfrentava um tema surpreendente. Era o desemprego
dos jovens, também apresentado como um dos mais sérios males do mundo atual. Em
mais de uma ocasião o pontífice ecoou a preocupação, apontando o risco de uma
“geração perdida” e criticando uma sociedade que descartava os jovens.
Para o papa, o elevado desemprego jovem é problemático não
apenas pela falta de trabalho em si, mas pela falta de esperança. Os jovens
foram “esmagados pelo presente”. Ao contrário das pessoas mais velhas, não têm
lembranças para recordar. Mas tampouco teriam um amanhã para ansiar, como
deveria ser na juventude. “Você me diz: é possível viver esmagado sob o peso do
presente? Sem uma memória do passado e sem o desejo de olhar adiante para o
futuro para construir algo, um futuro? Você conseguiria ir adiante assim?”
Se a crise do desemprego jovem na Europa chamou atenção até
do Vaticano, os esmagados seguem largamente menosprezados por aqui. Nas
eleições de 2018, tiveram protagonismo, excepcionalmente, apenas na ideia da
“carteira de trabalho verde e amarela”. O plano foi apresentado na semana
passada e, apesar de desidratado, foi recebido com antipatia pela opinião
pública.
A taxa de desemprego ainda é de 27% entre os jovens de 18 a
24 anos. Apesar de alguma melhora desde o pior da crise, ela ainda supera 30%
em vários Estados do Nordeste e do Norte. Mesmo no período áureo do mercado de
trabalho, sempre foi o dobro da taxa geral, e nunca cedeu abaixo de 14%. Os
jovens são, de longe, os mais afetados pelo desemprego. Sem experiência,
qualificação ou contatos, são também embarreirados pelas mesmas regras
trabalhistas dos demais – ao contrário do que ocorre em países desenvolvidos.
No início do mês, o IBGE divulgou a Síntese de Indicadores
Sociais de 2018. Vivem abaixo da linha da pobreza 3 em cada 10 brasileiros
entre 15 e 29 anos.
A faixa etária é também destaque em outra estatística, sendo
os mais afetados pela violência urbana: são mais de 60% das vítimas de
homicídios. Em 2017, quase 36 mil jovens entre 15 e 29 anos foram assassinados
– novo recorde. Os nossos esmagados morrem.
É claro que a desgraça da juventude brasileira não deve
motivar qualquer intervenção estatal. Mas o contrato de trabalho verde e
amarelo está longe de ser uma iniciativa mal concebida. Ao contrário, vai ao
encontro da literatura científica mais nova sobre a experiência internacional.
As evidências mais recentes sobre políticas de emprego desse
tipo preconizam desonerações seletivas, com foco em grupos específicos (no caso
os jovens) e na contratação (apenas novas vagas estão desoneradas, vedada a
troca de antigos por novos). Essas são duas ressalvas que diminuem o custo da
mudança (e que marcam as principais diferenças da proposta com a desoneração de
Dilma).
O badalado Emmanuel Saez – o economista de Berkeley que
assessora a democrata Elizabeth Warren – publicou em outubro estudo sobre a
experiência recente da Suécia. Ele e coautores mostram que a desoneração feita
para jovens melhorou o emprego durante e após sua vigência (foi promovida pela
centro-direita, e desfeita pela esquerda). O efeito foi positivo, e crescente,
tanto para os beneficiados que saíram do programa porque ficaram mais velhos
(por exemplo, pelo ganho de experiência) quanto para os jovens que não foram
beneficiados pela desoneração (depois que ela se extinguiu).
A redução do custo lá foi de 12%, bem abaixo da redução do
custo de cerca de 30% do contrato verde e amarelo (principalmente INSS e FGTS).
Já Alessio Brown, do Instituto de Economia do Trabalho da Alemanha, compila
efeitos positivos de subsídios a contratação, focalizados, na Alemanha,
Austrália, Áustria, França, Polônia e Reino Unido (além da Suécia). Apesar da
maior burocracia e dos custos administrativos da política focalizada, ela teria
custo efetivo maior do que uma desoneração irrestrita.
O Congresso pode aperfeiçoar a medida: o financiamento pela
arrecadação com a contagem de tempo do seguro-desemprego para o INSS deve ser
substituído (afinal vigoram renúncias previdenciárias para faculdades e o agro)
e os com mais de 55 anos podem ser incluídos (apesar do baixo desemprego, desligados
têm dificuldade de reinserção). Outras políticas também merecem ser discutidas.
O essencial é que os esmagados não percam nossa atenção.
*Doutor em economia
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