Filme mostra que música de Adoniran é trilha sonora natural
para SP
Adoniran
Barbosa tem tanta identificação com a cidade de São Paulo que sua
música é uma espécie de trilha sonora natural para imagens da metrópole. Por
isso, "Adoniran
- Meu Nome É João Rubinato", documentário de Pedro Serrano, é uma
viagem pelas ruas da cidade —uma trip nostálgica além do artista.
Adoniran é um personagem, uma das personas de João Rubinato,
que nasceu na cidade de Valinhos, no interior paulista, em 1910, mas desde a
primeira metade do século passado tentava o sucesso em São Paulo. Seu desejo
era chegar a um estrelato como o de Francisco Alves, o maior cantor do Brasil
na época. Adoniran simulava o vozeirão, corria atrás de oportunidades no rádio,
mas depois ficou claro que dentro de Rubinato havia uma figura única na música
brasileira.
O filme tem farto material e expõe as mudanças de Adoniran.
Já com o pseudônimo incomum, passou a criar sambas que davam vazão a seu jeito
muito peculiar de falar, uma espécie de dialeto que tinha algo do imigrante
italiano com alguma coisa do tipo interiorano.
Essa expressão única gerou sucessos como "Saudosa
Maloca", ainda nos anos 1950, e seu maior hino, "Trem das Onze",
que, embora criada na mesma década, só iria estourar nas paradas em 1964,
quando Adoniran se associou ao grupo Demônios
da Garoa para uma gravação antológica. A canção nunca o abandonou, até
sua morte, em 1982.
Um dos lados mais agradáveis do documentário é recapitular a
carreira no cinema. Adoniran estreou em 1946, no filme "Caídos do
Céu", com Dercy
Gonçalves e Walter Dávila, sem grandes pretensões. Mas depois, em
1953, estaria no elenco de um dos clássicos do cinema brasileiro, "O
Cangaceiro", dirigido por Lima Barreto, com diálogos escritos por Rachel
de Queiroz.
É interessante que o lado do Adoniran ator, pouco celebrado,
seja resgatado justamente num documentário de cinema. Nos anos seguintes, ele
seguiu carreira nos filmes, mas a partir de um certo momento o
Adoniran cantor foi se tornando tão popular que ele começou a ser chamado
para interpretar ele mesmo, sem estar a serviço de um personagem. Sua
última aparição nas telas foi em 1977, em "Elas São do Baralho".
A riqueza de imagens sobre Adoniran no rádio, no cinema e na
TV surpreende. O trabalho de pesquisa para o documentário merece todos os
elogios, mas há algumas opções de formato que podem ser questionadas.
Muitas vezes, é difícil entender por completo o que Adoniran
fala. Talvez o recurso de legendas pudesse ser utilizado, sem comprometer a
narrativa. Há também um excesso de imagens de moradores de rua. É compreensível
a associação dos menos privilegiados com boa parte da lírica do compositor, mas
o recurso chega a cansar.
Por fim, há um texto magistral do crítico literário Antonio
Candido, que expressa a força de Adoniran na construção de uma arte genuína,
incomparável. Mas é um texto feito para o papel. Narrado durante a projeção de
imagens na tela, é um tanto difícil de acompanhar, não é fluente como deve ser
um texto em audiovisual.
Mas "Adoniran - Meu Nome É João Rubinato" vale a
pena. Mais ainda porque a projeção no cinema é precedida de "Dá Licença de
Contar", um curta de ficção baseado nas histórias nos sambas de Adoniran.
Com direção talentosa do mesmo Pedro Serrano, traz o cantor
Paulo Miklos numa composição impecável como Adoniran.
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