quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

GOVERNO ARGENTINO BUSCA UM NOVO RUMO

Míriam Leitão, O GLOBO
O economista Fabio Giambiagi esteve na Argentina já no governo Alberto Fernández e avalia que a atual política econômica pode conseguir um pequeno superávit fiscal este ano. A inflação deve cair, mas será por pouco tempo, já que a política é a de controle de preços. Depois, voltará a subir e pode chegar nos próximos anos a até a 100%. “Em matéria de preços é o velho peronismo de sempre. Eu assisti o lançamento do programa precios cuidados, parecia o Brasil dos anos 1980.”
Ele admite que a impressão que fica do governo Alberto Fernández é até melhor do que se imaginava. No pacote de ajuste fiscal há algumas medidas duras, mas os sindicatos não reagiram. Se fosse outro governo, eles já estariam na rua. “Agora os tigres miam”:
— Claro que o pacote é controverso porque faz o ajuste pelo lado da receita em vez de corte de gastos. O governo Macri havia reduzido o déficit para 1% do PIB, mas o pacote Ferández é de 1% a 1,5% do PIB, o que pode levar ao superávit.
A Argentina tem diversos outros problemas. Um deles, o mais grave talvez, é que não tem reservas, tem uma dívida alta e com parcelas em atraso. Essa fragilidade se agravou no governo Macri. Desde o período de Cristina Kirchner o problema vem sendo enfrentado através do cepo cambiário, que ninguém desconhece o que seja na Argentina: são medidas que limitam o acesso à moeda americana.
— O governo impôs de novo as retenciones, taxações de exportações, que geram muitas distorções, mas o governo está taxando onde está o dinheiro. O campo gira muitos recursos. A ideia da política econômica é que quem está pagando os impostos é quem votou em Macri. Há um IOF de 30% sobre aquisição de divisas. Como os ricos viajam mais para o exterior, eles pagam 30% sobre 63 pesos e aí vai para mais de 80. A cotação oficial está em torno de 60 pesos — disse Fábio.
Giambiagi acha que houve um fato complicado na Argentina. Quando o peronismo venceu com larga vantagem as primárias, a eleição virou apenas uma formalidade, e isso fez com que Alberto Fernández não tivesse incentivo para negociar. O dólar subiu rápido e Macri teve que tomar medidas de aumento de controle.
Quando assumiu, ele adotou esse ajuste pelo lado da receita. Atingiu não apenas os produtores rurais e os turistas, mas também os aposentados:
— Havia uma regra que vinha da reforma da Previdência de Macri, que foi na verdade a reforma de um indexador. Era um mecanismo tradicional de indexação. Fernández aboliu isso e deu um valor fixo para quem ganha menos e deixou sem regras as aposentadorias, acima de um determinado valor. Só vai corrigir se tiver condições. Imagina isso num país com uma inflação de 55%. Só que os sindicatos, por ser um governo peronista, não reclamaram.
Giambiagi acha que o temor de que a vice-presidente, Cristina Kirchner, mandaria em tudo não se confirma:
— No jogo de forças internas temia-se as ideias intervencionistas de Cristina. Mas houve de fato uma coalizão dentro do peronismo — e é engraçado falar em coalizão dentro de um mesmo partido — entre as muitas facções. Nesse acordo, Cristina ficou com quatro áreas. Justiça, Receita Federal, o Senado e a Província de Buenos Aires.
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