Na semana passada, o Congresso derrubou o veto do presidente
Bolsonaro ao projeto que aumenta o limite para receber o Benefício de Prestação
Continuada (BPC) de ¼ para ½ do salário mínimo. Segundo o Ministério da
Economia, isso significa um aumento de gasto obrigatório de R$ 20 bilhões em
2020 e R$ 217 bilhões em dez anos, o que tornaria impossível o cumprimento do
teto para o crescimento do gasto público. Uma decisão em total desacordo com as
necessidades do País.
No final de 2019, o governo enviou ao Congresso três
Propostas de Emenda Constitucional (PECs) que, em conjunto com a PEC da Regra
de Ouro, caso aprovadas, criariam condições para a redução dos gastos
obrigatórios do governo e tornariam o teto do gasto sustentável. A derrubada do
veto ao aumento do limite do BPC faz com que a aprovação dessas propostas seja
uma condição necessária, mas talvez não suficiente, para a manutenção do teto.
A pandemia da covid-19 é uma emergência que vai requerer
recursos públicos e, portanto, redução de outras despesas para que o teto seja
respeitado. Este é um dos objetivos do teto dos gastos: criar na sociedade
brasileira (população, Legislativo e Executivo) a cultura de ordenar e definir
prioridades no processo orçamentário. As quatro PECs que estão no Congresso
viabilizam essas escolhas ao diminuir os gastos obrigatórios. A opção seria
suspender ou flexibilizar o teto, como já sugerem alguns analistas. Por que não
adotar essa alternativa?
Um importante objetivo do teto é criar condições para uma redução
estrutural das taxas de juros da dívida pública brasileira, que, por décadas,
estavam entre as maiores do mundo. Por que a existência do teto atingiria esse
objetivo?
Para respeitar o teto, os gastos públicos terão de
permanecer constantes em termos reais até 2026. Ou seja, todo aumento de
receita terá de ser alocado para reduzir o déficit primário, ou a dívida
pública, ou a carga tributária. Portanto, qualquer crescimento real do PIB vai,
eventualmente, levar a uma redução da dívida como proporção do PIB. Afinal, se
o PIB cresce, crescem as receitas tributárias e, como os gastos estão
constantes, eventualmente vão sobrar recursos para diminuir a dívida.
Como a relação entre a dívida pública e o PIB é o principal
indicador de solvência do País, a existência de um teto é uma garantia de que o
grau de solvência do Brasil vai melhorar no futuro. Quando isso acontecer, a
demanda pelos títulos públicos e, portanto, seus preços deverão aumentar, com a
consequente queda das taxas de juros.
Mas os investidores só conseguem lucrar com suas aplicações
financeiras se forem capazes de antecipar os movimentos dos preços dos ativos.
Ou seja, se a expectativa dos investidores é de que os preços dos títulos vão
aumentar no futuro, a melhor estratégia é comprar hoje e esperar os preços
aumentarem para vender no futuro. Com a antecipação do movimento, o resultado é
um aumento dos preços e queda nas taxas de juros no presente.
Não deve ter sido por simples coincidência que as taxas
médias de juros reais pagas pelos títulos do governo brasileiro mostraram forte
redução (de 21% ao ano para 5% ao ano) desde que o teto para o crescimento do
gasto público foi aprovado, em dezembro de 2016.
Suspender ou flexibilizar o teto retira a restrição para o
crescimento do gasto público e destrói este mecanismo automático de ajuste, o
que fatalmente vai levar a uma reversão da trajetória de queda dos juros que
ocorreu nos últimos três anos e meio. E, com juros mais elevados, aumenta a
probabilidade de uma volta da recessão. Um tiro no pé.
Também não foi coincidência que, após a derrubada do veto ao
aumento do BPC, uma decisão que mostra total irresponsabilidade do Congresso,
as taxas de juros dos títulos públicos subiram acentuadamente. Um indicador
eloquente do que poderá estar à frente caso o teto seja flexibilizado ou
suspenso: a volta do paraíso dos rentistas!
* Professor do Departamento de Economia da PUC/Rio, é
economista-chefe da Genial Investimentos
Nenhum comentário:
Postar um comentário