terça-feira, 28 de abril de 2020

NEGÓCIO DE FAMÍLIA

Bernardo Mello Franco,  O GLOBO
Jair Bolsonaro confunde a administração pública com um negócio familiar. Trata a Presidência da República como extensão da sua casa na Barra.
No dia da posse, o capitão instalou o filho do meio no Rolls Royce presidencial. Foi o primeiro ato de um mandato marcado pela influência indevida do clã em assuntos de governo.
Os filhos de Bolsonaro já nomearam e demitiram ministros. Ernesto Araújo era um diplomata inexpressivo, que nunca havia chefiado missão no exterior. Virou chanceler por indicação de um filósofo de Facebook e do deputado Eduardo Bolsonaro.
O general Santos Cruz é um militar respeitado, que trazia alguma racionalidade às reuniões no Planalto. Foi derrubado da Secretaria de Governo porque resistiu aos avanços do vereador Carlos Bolsonaro sobre as verbas de publicidade.
Ao pedir demissão, na sexta passada, o ex-ministro Sergio Moro acusou o presidente de tentar interferir na Polícia Federal. Desta vez, o objetivo seria travar as investigações sobre quem financia e controla as milícias virtuais.
A pretexto de se defender, Bolsonaro confirmou parte do relato. Confessou ter recebido um relatório sigiloso e disse que mandou trocar um superintendente da PF por causa das investigações do assassinato de Marielle Franco. “A PF de Sergio Moro mais se preocupou com Marielle do que com seu chefe supremo. Cobrei muito dele isso daí”, contou, confundindo a polícia judiciária como uma guarda presidencial.
No fim de semana, Bolsonaro apontou seus favoritos para os cargos que vagaram. Para o Ministério da Justiça, convidou Jorge Oliveira, atual secretário-geral da Presidência. Para a direção da PF, indicou Alexandre Ramagem, hoje no comando da Abin.
Oliveira é um ilustre desconhecido no meio jurídico. Seu currículo ostenta passagens como major da PM e assessor parlamentar. Ele ganhou espaço no governo porque é filho de um velho amigo do presidente. No ano passado, foi padrinho de casamento do Zero Três. Ramagem também deve o prestígio às ligações pessoais com o clã. Chefiou os seguranças de Jair na campanha e virou amigo de infância do Zero Dois.
Ontem, diante das reações negativas, Bolsonaro deu sinais que pode rever as escolhas. Melhor assim, mas nada indica que ele deixará de usar o cargo para proteger os filhos. O presidente está mais empenhado na blindagem da prole do que no combate ao coronavírus. Com o andar das investigações no Supremo, seus temores só tendem a aumentar.
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