O pote de dinheiro do Ministério da Educação fica no FNDE. O
Fundo tem mais do que dinheiro, tem capilaridade. Através dele se fala com
prefeitos do país inteiro, porque de lá é que saem as obras para a construção
de creches e escolas, as compras de ônibus para o transporte escolar, a
distribuição de material escolar e o fornecimento de merenda. É isso que o
presidente Bolsonaro está entregando aos indicados de Valdemar Costa Neto, do
PL, e Ciro Nogueira, do Progressistas.
— Dos R$ 140 bi a R$ 150 bilhões do orçamento do Ministério
da Educação, dois terços são carimbados. Dinheiro para as universidades
federais, os institutos federais, os hospitais universitários. Dos R$ 50
bilhões do FNDE, uns R$ 14 bilhões vão para o Fundeb. O resto — uns R$ 36
bilhões — é o dinheiro almejado. Por isso, todos os prefeitos quando chegam a
Brasília vão lá falar com diretores e presidente do FNDE — explica o
catedrático da Universidade de São Paulo Mozart Neves Ramos, especialista em
educação, e ex-secretário de Pernambuco.
Binho Marques, ex-governador do Acre, e também especializado
em educação, acompanha o trabalho do Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação desde 1993, quando na gestão Murílio Hingel, no governo Itamar Franco,
o fundo, criado no governo militar, começou a ser aperfeiçoado. Esse fundo é
formado com o dinheiro do salário educação, mas, conta Binho, Hingel passou a
adotar critérios para liberação dos recursos. Depois, houve novas mudanças na
gestão Paulo Renato e nos governos do PT. O papel do FNDE foi ficando mais
técnico. A tal ponto que Binho acha que existe menos espaço para desvios.
— No passado, o FNDE era um balcão, bem bagunçado. Eu
comecei a trabalhar com ele, na condição de secretário de educação, num período
promissor, com o Hingel. Ele chamou os secretários para construir regras de
distribuição dos recursos. O Henrique Paim, que ficou muitos anos no MEC e foi
presidente do FNDE, democratizou esses programas. Digo isso tudo porque não é
como antigamente. O balcão deu lugar a um mecanismo com repasse automático por
número de aluno. Antes era balcão mesmo, levava mais quem chegava lá com um
deputado, senador, coisas desse tipo. Alimentação escolar, transporte escolar
ganharam um sistema diferente de distribuição e mecanismos de controle. Isso
reduz a manipulação política. O papel do FNDE ficou mais técnico, uma pessoa de
perfil político fica perdida por lá — diz Binho Marques.
É uma esperança, mas não há o que este governo e o ministro
Abraham Weintraub não consigam destruir. Os políticos lutam por esse cargo
exatamente por essa mistura irresistível entre dinheiro, capilaridade, muitas
licitações e distribuição de benesses aos municípios. A Secretaria de Educação
Básica, explicam os especialistas, é importante para definir políticas, mas
quem vai dar o dinheiro para a construção da escola ou da creche é o FNDE.
A entrega do FNDE no balcão de negócios do presidente
Bolsonaro com os partidos do centrão é uma tragédia a mais que se abate sobre o
Ministério da Educação.
— Já tínhamos um desafio enorme no meio de uma pandemia com
um presidente na contramão de tudo, e um ministro que não sabe o que é educação
— diz Mozart.
Binho Marques chama atenção para outro angustiante problema:
— A gente perdeu muito tempo discutindo o Fundeb sem a
participação do governo. Felizmente o Congresso, principalmente a deputada
Dorinha, teve um bom protagonismo. Mas agora veio a pandemia, o Fundeb não está
reestruturado e está perdendo recursos, porque depende diretamente do ICMS,
cuja arrecadação está diminuindo. Se cai o valor do Fundeb despenca o
financiamento à educação.
E no meio de tudo isso, há esse ministro.
— Parou tudo no MEC, o Ministério desapareceu — diz Binho.
A opinião é muito semelhante a de Mozart.
— Para se ter uma ideia, o Conselho Nacional de Educação é
que teve que fazer um parecer para orientar todo o sistema de ensino brasileiro
durante a pandemia, para a reorganização do calendário escolar, que atividades
podem ser contempladas no ensino à distância desde a educação infantil ao
ensino médio. Seria papel do Ministério — diz Mozart.
No meio desta devastação que virou o Ministério da Educação, Bolsonaro decidiu abrir um dos seus mais vistosos balcões de negócios para blindar seu mandato.
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