domingo, 17 de maio de 2020

PEQUENO IRMÃO

Editorial Folha de S.Paulo

As pretensões orwellianas de Ernesto Araújo são inversamente proporcionais a sua estatura como chanceler. Catapultado de carreira diplomática medíocre para a chefia do Itamaraty, ali se esmera a cada dia para provar-se paragão da pequenez e da subserviência.

Torna-se difícil discernir se o ministro ataca a imprensa para dar vazão às frustrações de delírios de grandeza ou se o faz para adular o presidente da República. Certo é que ambos se irmanam no obscurantismo que hoje rebaixa a imagem do país no exterior.

O Pequeno Irmão Araújo suspende agora o envio de notícias de veículos nacionais a representações brasileiras. Amplia-se a canhestra tentativa de privar diplomatas da cobertura inquiridora sobre o governo iniciada em outubro, quando reportagens desta Folha foram excluídas do boletim (“clipping”).

O chancelar busca emular, com palavras lustrosas e atos vis, a paranoia agressiva do chefe ­—como tudo que tenta, em vão. Bem mais potente que suas intermináveis postagens bisonhas em redes sociais, o megafone presidencial de Jair Bolsonaro se volta contra jornalistas com mais eficácia e dano.

Com regularidade, o mandatário açula a claque na saída do Palácio da Alvorada contra profissionais de imprensa, com qualificativos como “lixo” e “canalhas”. Alguns desmiolados reviraram lixeiras com restos de refeições na sala usada por jornalistas, em busca sabe-se lá de quê, e só produziram provas da própria abjeção.

Alguma surpresa com o fato de o ódio cevado por Bolsonaro escalar para agressões físicas, como as sofridas por dois repórteres-fotográficos em manifestação governista? Um deles foi chamado pelo presidente para uma conversa, apenas para ouvir novos impropérios contra a autonomia jornalística.

Bolsonaro almeja o mesmo que todo governante: anuência, concordância, elogios. A diferença do presidente fraco e inseguro em relação a antecessores está no recurso a expedientes autoritários de intimidação e chantagem velada.

Em reunião virtual com empresários, na quinta-feira (14), voltou a incitá-los a não anunciar em órgãos que o criticam. Bolsonaro quer asfixiar o mensageiro.

As instituições têm sabido frear os arroubos cesaristas do presidente. Até aqui, o silêncio que tenta impor à opinião pública só serviu para encorajar as vozes independentes —e estimular, no porão do Itamaraty, as cabrioladas de Araújo.

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