O Facebook derrubou na semana passada uma série de páginas e
contas de sua plataforma e também do Instagram por comportamento inautêntico
coordenado, ou seja, por se passarem por outras pessoas para enganar usuários
ou o algoritmo das duas plataformas. Ao contrário de outras ocasiões em que
conjuntos de páginas e contas foram derrubadas, desta vez a empresa deixou
claro quem eram os alvos: Roger Stone, colaborador de Donald Trump, e
assessores de membros da família Bolsonaro.
Como investigações desse tipo demoram semanas, elas
provavelmente foram deflagradas num contexto diferente do atual. Apesar disso,
não parece coincidência que tenham sido anunciadas no momento em que o Facebook
é acusado de ser condescendente com discurso de ódio pela campanha de boicote
“Stop Hate for Profit”.
A campanha foi montada por organizações de direitos humanos
e conseguiu a adesão de grandes marcas globais que estão suspendendo anúncios
no Facebook como meio de pressionar a empresa a rever uma posição considerada
tolerante com discurso de ódio, incitação à violência, discriminação e negação
do Holocausto.
Embora esses tipos de discurso sejam diretamente proibidos
pelas regras da comunidade do Facebook, a empresa adotou uma política de
excepcionalidade para quando o discurso emana de políticos.
O argumento é o de que o interesse dos usuários/cidadãos de
saber o que diz um político —por exemplo, o presidente dos EUA ou do Brasil—
prevalece sobre a necessidade de limitar a disseminação de um discurso nocivo.
Reportagens da imprensa americana mostraram, porém, que a
motivação para a adoção da excepcionalidade foi tentar gerar equilíbrio ao
aplicar as regras sobre agentes políticos da esquerda e da direita. Como havia
o entendimento de que uma aplicação rigorosa das regras impactaria muito mais a
direita e a empresa temia uma reação forte dos republicanos, optou pela
excepcionalidade que geraria mais equilíbrio.
Embora as grandes marcas que aderiram ao boicote não
representem uma parte significativa da receita do Facebook (que vem
principalmente de médios e pequenos anunciantes), o barulho causado por essa
adesão, assim como a publicação de um relatório de uma auditoria independente
muito crítico aos efeitos das políticas sobre os direitos civis colocou grande
pressão sobre a companhia que pode ter respondido com a derrubada de páginas e
contas ligadas a políticos conservadores e pode vir a ser complementada com
medidas como a suspensão de anúncios políticos no período eleitoral americano.
*Pablo Ortellado, professor do curso de gestão de políticas públicas da USP, é doutor em filosofia.
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