É inegável que reforma tributária ganhou novo impulso com o
envio da proposta do governo esta semana ao Congresso. Foram muitos meses de
espera para que o ambiente político estivesse amadurecido para o avanço das
negociações.
Nem é preciso dizer que a recessão econômica no rastro da
pandemia da covid-19 e a necessidade de retomada estão empurrando à força essa
agenda de mudança tributária, considerada até mesmo mais complexa do que a
reforma da Previdência pelos atores envolvidos com forças dispersas e poderosas
do setor produtivo, sistema financeiro e políticas. Vide a gritaria geral do
setor de serviços.
Mas para muitos que acompanharam, nas últimas duas décadas,
de perto o front das negociações das inúmeras tentativas de reforma tributária,
como esta colunista, é possível perceber que o ambiente favorável de agora
ainda não é o daquela situação em que se pode dizer “agora vai”.
Foi assim com a reforma da Previdência no governo Bolsonaro
depois do terreno semeado pelo governo Temer. A construção política em torno da
reforma é ainda titubeante, com as forças divididas em frentes de interesse
dispersos ainda sem convergência. O envio do projeto do governo obriga uma
resposta do Congresso.
Por muito pouco, ao longo dos últimos anos, estivemos
próximos desse momento. Na maioria dessas vezes, interesses políticos deixaram
a reforma escapar pelas mãos. A última vez que o Executivo chegou próximo de
ter os votos necessários para a aprovação da reforma foi em 2012. Já tem oito
anos que isso aconteceu!
É muito tempo. De lá para cá, as tentativas ensaiadas foram
de fatiar a proposta e enviar primeiro uma unificação do PIS/Cofins (dois
tributos federais que incidem sobre o consumo) para completar o início da
reformulação iniciada ainda no governo Fernando Henrique Cardoso. Desde então,
todos os ministros da Fazenda tentaram tirar o projeto da gaveta. Guido Mantega
tentou. Joaquim Levy, Nelson Barbosa, Henrique Meirelles e Eduardo Guardia
também tentaram.
Paulo Guedes, agora, conseguiu tirar o projeto da gaveta e
enviar ao Congresso. Não dá para negar o feito quando se observa o histórico
desses quase 20 anos. A dúvida é saber se não chegou tarde o acordo político
que viabilizou o envio do projeto de reforma fatiado do governo. Por mais que o
governo deva ser e será um dos protagonistas do debate da reforma no Congresso,
as lideranças já indicaram que vão tentar aprovar uma proposta mais ampla.
A posição dos governadores favorável a esse caminho tem
peso, como também a da indústria nacional que tem patrocinado a PEC 45 da
Câmara.
A grande questão agora é saber como o Congresso, depois de
um ano discutindo duas PECs de reforma (uma na Câmara e outra no Senado) vai
receber o projeto do governo, diz à coluna o economista Manoel Pires,
coordenador do Observatório Fiscal da Fundação Getúlio Vargas.
Pesquisador atento aos meandros da política em Brasília, onde
mora, Pires ressalta que a pandemia tornou mais favorável o ambiente para a
reforma diante da necessidade de o Congresso apresentar uma resposta para a
retomada econômica. Mas, por outro lado, ele observa que a crise econômica
atual fragilizou mais o setor de serviços, hoje menos tributado, que terá
aumento de carga tributária com o projeto de reforma de Guedes que impôs uma
alíquota única de 12%. Por isso, ele defende a proposta do ex-ministro Nelson
Barbosa de fixação de um prazo de transição gradual para a subida da alíquota.
Pode ser uma solução.
Manoel Pires chama a atenção que, mesmo depois de aprovada,
há um duro e penoso trabalho de regulamentação que levará tempo de negociação.
Afinal, vale nesse caso o ditado de que o diabo mora nos detalhes.
É de olho nesses detalhes que as empresas dos múltiplos segmentos já começaram a se movimentar freneticamente em resposta à proposta do ministro. Um bom sinal na direção do amadurecimento político da reforma. Enquanto representantes do setor de serviços criticam e ameaçam travar a reforma no Congresso, um grupo de empresários da indústria publica no Estadão artigo para reforçar a ideia de que não há mais tempo a perder e que é urgente que as convergências superem as divergências em favor do Brasil.
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