Quem quiser que se iluda, o ministro da Economia, Paulo
Guedes, arde numa frigideira em plena Esplanada dos Ministérios. Ontem, o
subsecretário de Política Macroeconômica do Ministério da Economia, Vladimir
Kuhl Teles, deixou o cargo. Era o número dois da Secretaria de Política
Econômica do ministério, comandada por Adolfo Sachsida. Publicamente, alegou
razões pessoais. Na semana passada, dois membros do primeiro time da equipe de
Guedes haviam deixado a pasta: os secretários de Desestatização, Salim Mattar,
e de Desburocratização, Paulo Uebel. Guedes tem sinalizado para o mercado que
não pretende deixar o cargo, porém perde liderança sobre sua própria equipe.
A fritura de Guedes segue um rito que está se consolidando
no Palácio do Planalto como um método de descarte dos ministros. O presidente
Jair Bolsonaro prestigia o auxiliar publicamente, mas nos bastidores nada faz
para evitar que seja desgastado por notícias de que o ministro já não está mais
afinado com o presidente da República. Em termos de política econômica,
Bolsonaro pretende “furar o teto de gastos” e só falta encontrar um meio para
disfarçar a pedalada fiscal. Não à toa, todo o mercado já precifica a
flexibilização da política fiscal, com a Bolsa em queda e o dólar em alta. Mas
há duas leituras sobre o futuro de Guedes: uma de que acabará substituído no
cargo por Bolsonaro; outra, de que está lutando para ficar, fazendo o que pode
para aumentar os gastos do governo sem perder a narrativa da responsabilidade
fiscal.
Os dados estão sendo lançados no tabuleiro. A situação da
economia não é fácil. Bolsonaro sobrevoa o Nordeste em céu de brigadeiro, por
causa do abono emergencial, mas Guedes navega num mar proceloso. Ontem, o
relatório do Instituto Fiscal Independente, mantido pelo Senado, registrava queda
de 8% do PIB no segundo trimestre (menos mal, a previsão era um tombo de
10,6%); recuperação de alguns setores da indústria e do comércio; recessão de
6,5% em 2020. Redução do número de pessoas ocupadas de 93,3 milhões em junho de
2019 para 83,3 milhões em junho deste ano. Perda de receita líquida de 2,5% do
PIB no primeiro semestre; crescimento de 40,3% da despesa primária no semestre;
aumento de 9,7% da dívida bruta do governo entre dezembro 2019 e junho de 2020.
Abono permanente
O xis da questão é que os créditos extraordinários para o
combate à covid-19 já somam R$ 511,3 bilhões. Calcula-se que o deficit fiscal
deste ano deve chegar a R$ 800 bilhões, o que elevará a dívida pública a quase
100% do PIB. Perto desses valores, os R$ 35 bilhões a mais pretendidos pelos
ministros da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, e do Desenvolvimento
Regional, Rogério Marinho, seriam um aumento de mais de 6% do montante do que o
governo gastou com a pandemia. O problema é que não dá para enquadrar esses
gastos, que se destinam à realização de obras nos estados e municípios
controlados pelos aliados do governo, no programa de emergência aprovado pelo
Congresso. Por isso, Guedes somente se comprometeu com a liberação de R$ 5
bilhões.
Mas o problema maior não é esse. É o abono emergencial de R$
600, que alavancou a popularidade de Bolsonaro junto às parcelas mais pobres da
população, com reflexo, inclusive, na redistribuição de renda, transferida da
classe média para as famílias na miséria absoluta ou quase. Ele quer transformar
o abono emergencial na Renda Brasil, uma espécie de Bolsa Família turbinada,
isto é, três vezes maior do que o programa que herdou do ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva. Guedes precisa resolver essa equação. Se não atender ao
desejo de Bolsonaro, que mira a reeleição, terá de deixar o governo.
No fundo, consolidou-se na Esplanada dos Ministérios e no
Congresso um bloco político que deseja uma mudança de rumos na política
econômica. O velho nacional-desenvolvimentismo renasce das cinzas no Palácio do
Planalto.
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