O primeiro sinal para o início do espetáculo da sucessão
soou como um alarme. E os adversários de Jair Bolsonaro na disputa à
Presidência acordaram, embora tarde. Luciano Huck, que já teria decidido
disputar, permanece indiferente ao tempo e não se anuncia. O que não lhe tira a
vantagem de ser o candidato mais perto do povo, mas aprofunda sua desvantagem
de distanciamento do mundo político. Desperdiça a campanha municipal como
palanque ideal para uma aproximação necessária da máquina indispensável à
disputa eleitoral.
Empenhado em tirar efeito das providências do Estado no
combate à pandemia, João Doria está em situação oposta. Candidato mais próximo
da máquina política, está sem condições, no momento, de mergulhar no burburinho
municipal e misturar-se ao povo.
Ciro Gomes, sem mandato ou cargo que fixe sua imagem, e
desgastado pela memória de embates anteriores, parece não ter um plano de
recomeço. Talvez ainda intimidado pelo jogo petista que já voltou às mesas de
bar: Lula poderá ser candidato? Fernando Haddad terá fôlego?
Sobre Sérgio Moro o que ressalta é a falta de iniciativa
para transpor o paredão artificialmente erguido para que sua candidatura se
viabilize. Falta-lhe de um tudo e, como para os demais, o tempo de construção é
agora.
Um novelo que precisa ser urgentemente desfeito sob pena de
a reeleição de Bolsonaro se consolidar muito cedo. O candidato no futuro que
está no cargo presente pode abusar da oferta de benesses ao eleitorado e aos
cabos eleitorais. Se acrescentar a estas vantagens a de não ter adversário,
quando se sabe que terá, apenas adia-se a brecha da fraqueza.
Fortes candidatos a deputado federal, fundamentais na
campanha presidencial, devem sair do quadro de perdedores das eleições
municipais. O projeto em que vão se engajar precisa estar claro, no dia
seguinte. Enquanto Bolsonaro for o único palanque presidencial na campanha
municipal, sua vitória é presente de mão beijada.
Política é isto, correr atrás. Sem ritual, dispensando
apresentação e até o próprio anúncio de sua nomeação, o experiente Ricardo
Barros assumiu a liderança do governo com apenas um aviso aos navegantes. Mas é
como se tivesse dito o que todos ouviram: “Coube-me, como professor, formar a
aliança majoritária; basta me dizerem, no momento certo, para quê”. Com um
profissional no papel de formulador da tática e da estratégia, retaguarda
coberta, Bolsonaro foi cuidar dos disparos de canhão.
Colocou nas ruas uma campanha na clássica tradição
brasileira. Para os pobres, demagogia. Dinheiro na veia da especulação, para os
ricos. Daí, a questão. Até quando o assistencialismo continuará decidindo as
eleições no Brasil? País, o nosso, que se projeta na fusão de imagens políticas
da Venezuela, da Bolívia e da Argentina, para consolidar o pobre retrato
eleitoral da maltratada SudAmerica.
O sociólogo e ex-presidente Fernando Henrique Cardoso prevê
que assim será enquanto a desigualdade se mantiver brutal. E a indiferença da
classe dominante recrudescer, por interesse eleitoral ou inação. “Ela (a classe
dominante) não se abala.”
Não está fechado o espaço para um projeto alternativo ao
assistencialismo, mas, como se sabe, não há partidos interessados em
apresentá-lo. Não é impossível, também, que alguém, individualmente, vocalize
um caminho novo, como admite o ex-presidente. “Mas é preciso que o povo
acredite.”
A opinião pública sente-se traída. Bolsonaro conseguiu fazer
crer que romperia com a era PT. Na primeira oportunidade, assumiu métodos e
medidas que combatia.
Há, sim, uma expectativa de que ainda aparecerá alguém capaz
de provar que a era Bolsonaro precisa ser encerrada. Se não, e a economia não
atrapalhar, o populismo demagógico, mais uma vez, vestirá a faixa.
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