Presidente da Câmara entre 2005 e 2007, o ex-deputado Aldo Rebelo jogou um papel importante na sobrevivência do governo Lula ao mensalão. Em dois meses de crise, a administração petista estava nas cordas, até que Severino Cavalcante, que comandava a casa legislativa dos deputados, foi denunciado por receber propina de um cantineiro. Ele renunciou e Aldo bateu o oposicionista José Thomaz Nonô em uma disputa apertadíssima. Não se falou mais em impeachment de Lula.
O impeachment de Dilma Rousseff tornou-se um assunto no país assim que Eduardo Cunha foi eleito presidente da Câmara por 367 votos, derrotando Arlindo Chinaglia, em fevereiro de 2015. A correlação entre os fatos de 2005 e 2015 é irresistível. Muito mais que garantir avanço de agenda de governo, que na realidade não existe, o presidente da Câmara dá ou tira blindagem.
Distante hoje do calor dos fatos, Aldo é reverente a eles. O ex-deputado, por muitos anos integrante do Partido Comunista do Brasil, reconhece o protagonismo da presidência da Câmara como escudo ou espada, mas lembra dos limites nesta ação. “O presidente da Câmara pode muita coisa, mas muito mais podem os fatos. O avanço de um impeachment ou o seu bloqueio depende de circunstâncias políticas. Não acho que o presidente Jair Bolsonaro obterá proteção absoluta.”
O presidente da República está envolvido até o tutano dos ossos na operação para eleger ao comando da Câmara o deputado Arthur Lira (PP-AL). Presidente nacional do MDB, partido que foi um artífice tanto do impeachment de Collor em 1992 quanto do de Dilma em 2016, Baleia Rossi (SP) concorre com apoio da oposição.
Aldo respeita a capacidade de articulação política de ambos e não se arrisca a nenhum prognóstico, mas ressalta: “Um impeachment não se cria, ele aparece quando o sistema quer se livrar de um governante. Quando se unem a classe política, a mídia, o mercado, contra um governante, acabou. Nem o Lira e nem ninguém segura. Se arquivar o pedido, a pressão vêm por outros meios.” Do mesmo modo, Aldo não acredita que Baleia represente ameaça a Bolsonaro se estes fatores não estiverem postos.
O ex-deputado vê alguns trincamentos na sustentação de Bolsonaro, mas não enxerga impeachment no horizonte. “Ele não é mais o homem que permite uma agenda de mercado; Bolsonaro por onde anda diz que essa não é mais a agenda dele e não há outra para por no lugar. Mas quando olham para o Mourão, não vêem uma alternativa. No Temer, viam.”
O importante nesse momento para quem faz oposição, segundo Aldo, é desideologizar a disputa pelas mesas diretoras. “Não há corte ideológico. A questão a responder é se querem derrotar o governo ou não. Lira vencendo fortalece Bolsonaro, mesmo se viesse do Sendero Luminoso. Baleia ganhando enfraquece, mesmo se viesse da TFP. Em 2005, MDB, DEM e PSDB estavam divididos sobre Lula. Em 2015, estavam unidos em relação a Dilma. Agora podem se unir de novo. É importante observar esse movimento.”
Não há como deixar de notar nas eleições da Câmara um fenômeno: desde a vitória de Cunha, portanto há seis anos, a esquerda deixou de ser competitiva na disputa pela Mesa Diretora, mesmo com a fragmentação da centro-direita e com o PT se mantendo como a maior ou a segunda maior bancada desde então. O isolamento da esquerda no debate político brasileiro é inegável.
Quando um país tem uma vacina do governo e outra da oposição, é porque está perdido, no sentido literal e figurado. O duelo político entre o governador de São Paulo, João Doria, e o presidente Jair Bolsonaro rondou perigosamente o abismo, ao potencializar um questionamento indevido à Coronavac. O negacionismo do presidente e a ânsia do governo paulista ao divulgar os resultados da vacina, apenas em coletivas de imprensa atropeladas e com dados parciais, estimulou o erro que pode ser corrigido este domingo, com a análise da Anvisa do uso emergencial da Coronavac e da AstraZeneca.
Uma vacina com 50% de eficácia geral, aplicada de forma massiva, pode reduzir a pressão sobre o sistema de saúde e consequentemente o número de mortes? Retardar o início da vacinação, para se ter disponibilidade de uma vacina mais eficaz é uma opção? Há um relativo consenso científico de que a primeira alternativa é a correta.
A discussão é observada com perplexidade pelo médico Ricardo Parolin Schnekenberg, que reside em Londres e integra o grupo do Imperial College que acompanha os dados do Brasil. “Uma decisão de vacinação é coletiva, jamais individual. Jamais a população deve opinar sobre a vacina que vai tomar. Como ninguém questiona que vacina está tomando para qualquer outra doença”, diz.
No Reino Unido, com 66 milhões de habitantes, já foram aplicadas 3 milhões de doses de três tipos de vacinas, distribuídas pelo país conforme questões logísticas. A da Pfizer, por exemplo, tem um descarte alto, por ser muito perecível. Só é fornecida em grandes hospitais. A da AstraZeneca, que está entrando agora, mais resistente, está nos pontos de vacinação com menor fluxo.
O mesmo modelo deve ser aplicado no Brasil, mas com o desgaste de um debate desnecessário que derivou para uma absurda discussão sobre a obrigatoriedade da vacina, sem que ela estivesse assegurada.
Parolin relata que os erros do primeiro-ministro Boris Johnson no combate à pandemia foram muitos. O Reino Unido acumula 84,9 mil mortos, o maior número da Europa, sobretudo por resistir ao isolamento social, segundo o médico.
Em março, ainda se apostava em uma forma mitigada de restrição de atividades. A quantidade de testes era mínima. O próprio Parolin contraiu covid-19 e não foi testado. Quando Johnson fez o lockdown, procurou sair dele de forma prematura. O verão britânico foi quase de vida normal, relata.
A fatura chegou em setembro, com uma explosão de casos. A reação do governo foi a de fazer abordagens regionalizadas. Não funcionou.
O que Boris Johnson nunca fez foi correr atrás de uma ema com uma caixa de cloroquina, como lembra Parolin. Houve erro de estratégia, mas não mistif
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