O presidente Jair Bolsonaro tem um projeto de poder muito perigoso. Ele, que cultiva desde o início de sua carreira os grupos militares, e sempre foi representante corporativo deles, como tenho debatido aqui nos últimos dias, tem marcado presença em várias formaturas, não apenas das três Armas – Exército, Marinha e da Aeronáutica -, mas também das polícias Militar, Federal, e Rodoviária Federal.
Dois projetos de lei que estão na Câmara, de autoria de deputados bolsonaristas, revelados pelo jornal Estado de S. Paulo, restringem o poder dos governadores sobre braços armados do estado, com mudanças na estrutura das polícias Civil e Militar, certamente saíram dessa tentativa de Bolsonaro de cooptar as Forças Armadas e as forças policiais auxiliares, que fazem parte do sistema de defesa nacional, mas não têm nenhum tipo de autonomia funcional, que sempre quiseram. Ainda dá tempo de pará-lo.
Transformar a PM numa polícia independente, que não seja uma força auxiliar, acaba criando uma quarta força armada, o que é temerário. Já há uma preocupação muito grande com essa bolsonarização dos quartéis e da Polícia Militar, com mais de quatro mil militares em diversos escalões no governo, da ativa e da reserva, inclusive no ministério, numa tentativa de influenciar ideologicamente as forças auxiliares e as baixas patentes das Forças Armadas.
O primeiro levante de uma PM na Nova República aconteceu em 1997 em Minas, e o ex-deputado Marcus Pestana, que era secretário do governo, lembra que o Estado Maior perdeu totalmente o controle da tropa. “Como se falava na época, os coronéis começaram a obedecer ao cabo (Cabo Júlio foi o líder simbólico na época)”. Conquistaram espaços parlamentares corporativos, e nunca mais os princípios da hierarquia e disciplina foram os mesmos.
Os projetos de seus aliados criam ainda uma nova estrutura na organização das Polícias Militares, com cargos de oficiais superiores. Teríamos, pois não creio que os projetos sejam aprovados, generais de quatro, três e duas estrelas nas Polícias Militares. Vários governadores estaduais, que perderiam na prática o comando das polícias militares e civis, estão se movimentando, e o de São Paulo, João Doria reagiu: “Não há nenhuma razão que justifique, exceto a militarização desejada pelo presidente Jair Bolsonaro para intimidar governadores através de força policial militar”.
Os projetos preveem mudanças na estrutura das polícias, estabelecendo mandatos de dois anos para os comandantes-gerais da PM, dos Bombeiros e delegados-gerais de Polícia Civil, escolhidos por uma lista tríplice. O ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, confirmou que seu ministério está acompanhando a tramitação dos projetos, e tem se reunido com representantes das categorias envolvidas e deputados federais.
As propostas de bolsonaristas são a concretização de um projeto de poder militar que sustente os avanços de Bolsonaro sobre as limitações que as instituições democráticas lhe impõem. O presidente da República usa seus poderes para, de um lado, dar protagonismo aos militares em seu governo, ao mesmo tempo que cuida de seus proventos e dos projetos que mais lhes são caros, como o submarino nuclear. Os projetos de defesa nacional são importantes, mas não poderiam ser prioridades neste momento de pandemia e crise social aguda. Ao mesmo tempo que se queixa de que o país “está quebrado” e que não pode fazer nada, Bolsonaro permite o contingenciamento de verbas sociais e para o combate da COVID-19, e proíbe o bloqueio das verbas militares.
Censura descabida
A anunciada decisão do ministério da Justiça de processar Rui Castro, e por tabela Ricardo Noblat, que transcreveu parte da crônica do primeiro, por um suposto incentivo ao suicído dos presidentes Trump e Bolsonaro, seria cômico se não fosse trágico.
Muito antes deles, Jair Bolsonaro, em campanha, convocou seus apoiadores no Acre a “fuzilar esses petralhas”, segurando um tripé simulando uma metralhadora. Ainda como deputado, Bolsonaro sugeriu que os militares na ditadura deveriam ter assassinado 30 mil brasileiros, a começar pelo ex-presidente Fernando Henrique.
Mas, na época, havia governos democráticos no país.
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