O advento dos NFTs, sigla inglesa para "token" não fungível, permite que criações digitais, como fotos, filmes, ilustrações, memes, sejam autenticadas como originais e comercializadas sob as mesmas regras em que opera o mercado de arte. Estima-se que, no primeiro trimestre deste ano, essa modalidade de negócios tenha movimentado US$ 2 bilhões em todo o mundo, crescimento de 13.000% em relação a igual período de 2020.
Não tenho nada contra artistas ganharem dinheiro, muito pelo contrário. Mas confesso que a obsessão de nossa espécie para com os "originais" me incomoda um pouco. Não vejo como justificá-la de forma racional.
Especialmente no caso da arte digital, o original é indistinguível da cópia. O prazer estético que se tira de um é idêntico ao que se tira do outro, de modo que não faz sentido desembolsar mais dinheiro para usufruir daquele que é etiquetado como autêntico.
É claro que é possível que a relevância do original não esteja em seu "valor de uso", mas em algum aspecto lateral. Estou convencido de que é isso mesmo, mas receio que as perspectivas alternativas tampouco sejam abonadoras para a nossa espécie.
Uma possibilidade é que gostemos de originais para poder pagar mais por eles. Sei que parece louco, mas é algo que faz sentido do ponto de vista da sinalização conspícua, que é como os biólogos classificam a atitude do indivíduo que incorre em algo custoso para chamar a atenção de possíveis parceiros sexuais. Se eu gasto rios de dinheiro em algo inútil, estou sinalizando que sou podre de rico, sinal claro da superioridade de meus genes.
A outra possibilidade é que nos interessemos pelo original porque ele é o original, isto é, é aquilo sobre o qual o artista trabalhou e que, portanto, carrega algo de seu gênio. O nome técnico disso é essencialismo. É coisa de quem acredita em bruxas, mas o problema é que nossas mentes estão predispostas a isso.
Hélio Schwartsman
Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".
Ilustração de Annette Schwartsman para a coluna de Hélio Schwartsman de 16.mai.2021 - Annette Schwartsman
Nenhum comentário:
Postar um comentário