A imagem de dois carros de combate leves do Corpo de Fuzileiros Navais, com motores fumando profusamente em frente ao Planalto, não poderia ser mais reveladora.
Os claudicantes veículos eram, afinal, o que mais se aproxima da definição de tanque no despropositado desfile militar concebido pela Marinha para que Jair Bolsonaro e Walter Braga Netto pudessem afrontar simbolicamente os Poderes Judiciário e Legislativo. Como previsível, o efeito foi exatamente o oposto do desejado.
O episódio remete aos estertores da ditadura em 1984, quando a emenda das Diretas Já sucumbiu sob cenas igualmente patéticas do notório general Newton Cruz, só para atestar o óbito do regime.
Para as Forças Armadas, foi uma derrota moral e um certificado adicional da enrascada em que os fardados se meteram ao apoiar Bolsonaro e ajudá-lo a montar seu governo. Não que fosse necessário, após a fúnebre passagem do general Eduardo Pazuello pela Saúde.
Naturalmente, é preocupante ver o comandante naval se unir ao ministro da Defesa e ao chefe da Aeronáutica como animadores dos delírios do bolsonarismo.
Mas a vacuidade da parada, que desviou blindados e um punhado dos tais tanques fumacentos de seu treinamento em Formosa (GO), acentuou o ar farsesco. Concorre para isso o silêncio do comandante do Exército, Força mais importante, Paulo Sérgio Oliveira.
Mesmo que os relatos de que o general se viu constrangido pelo desfile sejam convenientes, é por ora certo que a resistência a arroubos autoritários de Bolsonaro é ampla na cúpula militar, a despeito da identificação com bandeiras como a do voto impresso.
Parte disso se deve à noção da impropriedade que qualquer aventura fora da Constituição, como Bolsonaro já sugeriu lançar mão, a começar pela reação no exterior: o Brasil viraria pária a ser isolado.
Uma amostra disso se notou nesta terça (10), com o já ridicularizado presidente sendo descrito em veículos importantes como projeto de ditador de república bananeira.
À diferença de 1964, quando a reação militar a João Goulart tinha franco apoio dos EUA, na semana passada duas altas autoridades em visita a Brasília fizeram questão de apoiar o sistema eleitoral.
Em “Os Canhões de Agosto” (1962), a historiadora americana Barbara Tuchman descreveu como o sistema de alianças europeias levou de forma inexorável à Primeira Guerra, em 1914. No agosto de 2021, sob o blefe bolsonarista, são os militares que parecem rumar a um abismo por suas escolhas.
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