A pedido do presidente Jair Bolsonaro, o Congresso aprovou a destinação de R$ 1,7 bilhão do Orçamento da União para bancar um inoportuno reajuste de salário dos policiais federais – Polícia Federal (PF), Polícia Rodoviária Federal (PRF) e Departamento Penitenciário Nacional (Depen) – em 2022, ano em que Bolsonaro terá pela frente uma difícil campanha pela reeleição. Seria ocioso esperar republicanismo no trato do Orçamento de um Congresso fechado nos interesses paroquiais dos parlamentares e de um presidente obcecado por seu plano de manutenção de poder.
De acordo com o próprio Ministério da Justiça e da Segurança Pública, diretamente envolvido nas negociações com os parlamentares, o aumento para a categoria dos policiais federais poderá ter um impacto de R$ 11 bilhões nos próximos três anos. Como se não bastasse, o governo ainda pretende apresentar no início do ano que vem um plano para equiparar o salário máximo dos delegados da PF ao salário de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), teto constitucional do funcionalismo público, atualmente fixado em R$ 39.293,92.
O agrado aos policiais federais, um dos grupos que compõem a base eleitoral do clã Bolsonaro há décadas, desencadeou uma onda de descontentamento em outras categorias de servidores públicos. À imprensa, um ministro de Estado falou que o aumento aos policiais federais é uma “crise contratada” com as demais categorias. “Mexeram em um vespeiro”, disse outro. Ao Estado, o presidente do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central (Sinal), Fábio Faiad, afirmou que “reajustes salariais devem ser para todas as carreiras”. Em parte, Faiad tem razão. Bolsonaro agrada a alguns milhares de policiais com objetivos eleitorais e “esquece” que há cerca de 1 milhão de servidores federais sem correção salarial há cinco anos. Por outro lado, a reação do Sinal mostra que o problema maior, para as corporações do funcionalismo, não é a profunda crise sanitária, econômica e social que o País atravessa ou a falta de atenção do governo às prioridades nacionais, mas sim a iniquidade na distribuição dos reajustes.
A reação mais dura, no entanto, veio dos auditores da Receita Federal. O órgão foi diretamente afetado pelo aumento concedido aos policiais federais porque os recursos para bancar o mimo saíram, em grande parte, da alínea orçamentária destinada ao Fisco. De acordo com o Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita (Sindifisco), uma das mais organizadas e poderosas corporações do funcionalismo público, cerca de 500 auditores se “rebelaram” e pediram exoneração de cargos de chefia nos primeiros dias após a aprovação do aumento aos policiais federais. As baixas afetaram as dez regiões fiscais do País – São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Pernambuco, Alagoas, Rio Grande do Norte, Paraíba, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná – e, seguramente, causarão transtornos para os cidadãos durante as viagens para as festas de fim de ano. Unidades da Receita Federal, incluindo postos aduaneiros, ficarão “acéfalas”, segundo o Sindifisco, após os pedidos de exoneração em massa.
É essa a consequência da estreiteza política de Jair Bolsonaro. Incapaz de governar o País, ou seja, de pensar no interesse nacional e formular políticas públicas voltadas ao atendimento de necessidades de parcelas mais amplas da sociedade, o presidente age no varejo de suas ambições, uma política que seria mais assemelhada à vereança, se ao menos Bolsonaro tivesse interesse legítimo em melhorar a vida de uma comunidade particular. Mas não. O presidente é orientado apenas por seus interesses eleitorais e sua sede de poder. Ora são agrados aos caminhoneiros, ora são decretos favorecendo os armamentistas. Agora, concede-se aumento para servidores da área de segurança pública. Fossem as costureiras as que mais dessem votos para a holding política em que se transformou a família Bolsonaro, seguramente o Palácio do Planalto já teria pensado em alguma forma de subsidiar a compra de tecidos e máquinas de costurar. E assim Bolsonaro finge que governa o Brasil.
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