O acordo de compra do controle acionário do Twitter por Elon Musk provocou uma previsível onda de reações. Até aqui, as análises sobre o futuro da plataforma se ancoram em algumas poucas informações, em boa parte oriundas de tuítes do próprio megaempresário.
Ainda que seja cedo para prever com alguma precisão o que ele pretende fazer a partir do negócio de US$ 44 bilhões, parece inevitável o debate sobre a liberdade de expressão na internet.
Em diferentes plataformas e em vários países, o assunto dá margem a ideias perigosas. Mesmo que bem intencionadas, medidas unilaterais de controle do que pode circular nas redes adentram o pantanoso terreno de restrição à manifestação do pensamento —assegurada, no caso brasileiro, pelo artigo 5º da Constituição de 1988.
Nos Estados Unidos, a sombra provocada por esse debate já se faz sentir. Apenas 1 em cada 3 norte-americanos considera que todos os seus conterrâneos têm liberdade de expressão completa, conforme mostrou pesquisa encomendada pelo jornal The New York Times e pelo Siena College.
Esta Folha há muito defende que o limite aceitável para essa liberdade fundamental é o dado pela lei. O cerceamento deve estar circunscrito a manifestações que incorram em crimes tipificados pela legislação; o mesmo vale para o comércio de produtos na rede.
Já as ideias ruins devem desvanecer-se pela própria fragilidade, e as mentiras precisam ser desmontadas, não impedidas de circular.
Nesse tópico, é bem-vindo o posicionamento de Musk. "Sou contrário à censura que vá muito além do que está na lei", afirmou.
O negócio bilionário ainda expõe, uma vez mais, a morosidade do poder público em relação ao assunto. Legislações que poderiam controlar o poder das big techs pouco avançaram ao longo dos últimos anos em diferentes países, sendo a Austrália um notório contraexemplo a esse padrão —espera-se que a União Europeia seja outro mais à frente.
No Brasil, a possibilidade de abusos nas campanhas eleitorais motivou acordos de procedimento firmados entre as empresas e o Tribunal Superior Eleitoral, um paliativo que não elimina a necessidade de uma legislação coerente e estável para a conduta nas redes.
A capacidade dessas megacorporações de influenciar imensa e imediatamente a sociedade está mais do que demonstrada. A régua sobre o que elas podem e devem fazer tem de ser dada pela lei, não por seus acionistas. A entrada da pessoa mais rica do mundo nesse universo só torna ainda mais urgente agir nesse sentido.
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