Apurações sobre plano para matar autoridades se aproximam
um pouco mais a cada etapa de nomes do círculo mais próximo do ex-presidente,
como Braga Netto e Augusto Heleno
Se, na semana passada, o ataque de um extremista à Praça dos
Três Poderes foi o ato tresloucado que explodiu
as conversas para uma anistia aos golpistas do 8 de Janeiro, as revelações
estarrecedoras desta terça-feira sepultam qualquer tentativa de minimizar as
tentativas de supressão da democracia naquele dia e nos meses que o
antecederam. Os subordinados diretos de Jair Bolsonaro urdiram o assassinato de
autoridades de primeiro escalão da República para manter o ex-capitão no poder.
A gravidade do que se tem até aqui é inaudita. Mas, como as
investigações insistem em demonstrar, não é possível assegurar que tenhamos
chegado a todos os fatos e a todos os envolvidos na trama. Os novos depoimentos
do tenente-coronel Mauro Cid — personagem que permitiu que se desenrolasse o
fio da meada da tentativa de melar a eleição e empastelar a democracia — e
também dos cinco presos ontem mostrarão quem mais estava no plano, a mando de
quem e com que grau de anuência e deliberação de Bolsonaro e de seus ministros
mais próximos.
Como informei em meu blog, a
prisão do ex-ministro da Defesa Walter Braga Netto ainda não foi pedida,
mas por excesso de zelo da Polícia Federal em preencher os requisitos técnicos
e jurídicos para embasá-la. Até aqui, a evolução das investigações tem se dado
de fora para dentro, descrevendo círculos que vão ficando menores, até chegar
ao núcleo decisório e político do golpismo.
Na operação de ontem, se chegou pela primeira vez à prisão
de um general da reserva, Mário Fernandes, mas ainda com menos poder e
proximidade com Bolsonaro que Braga Netto ou Augusto Heleno, de quem as
apurações se aproximam um pouco mais a cada etapa. Diante do que veio à tona
até aqui, com um plano impresso nas dependências do Palácio do Planalto em que
se admitia a eliminação do então presidente eleito Lula, do vice-presidente
eleito, Geraldo Alckmin, e do presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre
de Moraes, é impossível dizer se haveria um limite ao que os bolsonaristas
inconformados com a derrota estavam dispostos a perpetrar.
O ministro Paulo Pimenta foi feliz na escolha da palavra:
foi por um detalhe que o Brasil, menos de 40 anos depois de reconquistar sua
democracia, não assistiu a uma nova quartelada para suprimi-la. A extensão das
tratativas e a abundância de rastros deixados explicam o nervosismo que se
abateu sobre Bolsonaro, familiares e aliados nos últimos meses, desde a
mobilização para o reiterado sequestro do Sete de Setembro para pregar contra o
Judiciário até a campanha indecente pela injustificável anistia aos bagrinhos
do 8 de Janeiro — mirando, evidentemente, não neles, mas nos fardados e em seus
superiores, que estavam mergulhados até a cabeça na articulação para assassinar
adversários e reinstalar o arbítrio no país.
Muito se tem discutido, também neste espaço, a respeito da
extensão dos inquéritos sob a relatoria de Alexandre de Moraes. É possível
encontrar argumentos jurídicos para questionar o fato de, sendo vítima dessa e
de outras tramas sob investigação, ele continuar relatando os inquéritos. Nada
disso, no entanto, é capaz de desviar o debate do que é central: não fosse a
atuação firme e articulada da Polícia Federal, do Ministério Público Federal e
do Judiciário, a democracia teria soçobrado.
A Justiça formou sucessivas barreiras, primeiro no TSE,
depois no Supremo, às ações do ex-presidente para se perpetuar no poder,
primeiro tentando evitar as eleições de 2022 , depois com as maquinações que
até aqui já têm as digitais de nomes de alta patente de seu entorno para
impedir a diplomação, a posse e o governo de Lula.
O inquérito da tentativa de golpe pré-8 de Janeiro será
concluído até o fim do ano. Não só não haverá anistia, como parece claro que os
próximos alvos estão num círculo ainda mais restrito e nuclear.
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