Quantos mais participaram da tentativa do golpe, além dos
militares já presos? O inquérito tem que chegar a todos os envolvidos na trama
Dois anos depois de terem tramado matar o presidente da
República, o vice-presidente e o então presidente do Tribunal Eleitoral, eles
estavam todos soltos. Três dos militares presos na terça-feira são da ativa no
Exército. Um deles, o tenente-coronel Rodrigo Azevedo, é oficial do Estado
Maior e do Comando das Operações Especiais. Veio ao Rio e pediu para “visitar o
planejamento” da GLO do G20. Tudo é estarrecedor nos documentos divulgados na
operação "Contragolpe", mas esse detalhe de Azevedo é inquietante.
Ele permanecia dissimulado com poder e influência. Quantos mais?
“Os investigados continuam a exercer seus postos no Exército
e na Polícia Federal, salvo o general da reserva Mário Fernandes, que,
entretanto, possui grande ascendência em relação aos kids pretos”, diz o texto
da decisão de Alexandre
de Moraes, citando o pedido de prisão da Polícia Federal.
Exceto Azevedo, os outros presos de
terça-feira já estavam sob investigação desde a operação “Tempus Veritatis”. O
general Mário Fernandes também estava no Rio. O tenente-coronel da ativa Hélio
Ferreira Lima tinha vindo de Manaus para o Rio. Quando passou a ser investigado
em fevereiro deste ano, ele era o comandante da Companhia de Forças Especiais
de Manaus. Foi afastado e ficou em funções burocráticas. O tenente-coronel
Rafael Martins Oliveira foi preso na “Tempus Veritatis”, depois passou a usar
tornozeleira eletrônica e estava afastado do serviço. Ele também tinha vindo
para o Rio. Todos vieram dizendo que queriam participar da formatura das Forças
Especiais. Coincidentemente quando o Rio recebia as pessoas mais poderosas do
planeta.
Algumas das informações já eram conhecidas, mas o que saiu
agora foi o plano detalhado contra Lula, Alckmin e Moraes. O ministro do STF era
vigiado a cada passo e houve até o dia em que quase executaram o plano de
“neutralizar” Moraes. No dia 15 de dezembro de 2022, oficiais da ativa do
Exército, com posições de poder nas Forças e no governo, identificavam-se com
nomes de países, numa fictícia “Copa 2022” e prepararam uma emboscada ao
ministro do Supremo Tribunal Federal.
“Às 20h57, Áustria diz: ‘Tô perto da posição. Vai cancelar o
jogo?’”, Cerca de dois minutos depois, ouve a resposta de “Alemanha”: “Abortar
Áustria. Volta para o lugar de desembarque”. E, assim, dessa forma não se
consumou o plano. Motivo, naquele dia os ministros tiveram, felizmente, a ideia
de encerrar mais cedo a sessão. A propósito, o tenente- coronel Rodrigo
Azevedo, que até a segunda-feira tinha poder no Exército, era, aparentemente, o
país “Brasil” naquele jogo macabro.
O general Mário Fernandes, que ocupava o segundo posto na
Secretaria geral da Presidência no governo Bolsonaro, imprimiu no próprio
Planalto, o plano “Punhal Verde e Amarelo”, de matar autoridades. A reunião de
5 de julho de 2022 em que Mário Fernandes pede a Jair
Bolsonaro que execute o “plano" antes das eleições era já
conhecida. Mas é sempre espantoso constatar a quantidade de cúmplices naquela
reunião ministerial de uma conspiração para um golpe de Estado que se fazia à
luz do dia.
A ideia dos golpistas presos na terça- feira, de acordo com
farta documentação incluída no inquérito, era a de provocar uma crise a partir
dos assassinatos de autoridades, criar um gabinete de crise que seria comandado
pelos generais Heleno e Braga Netto. O golpe tinha decreto escrito, como se
sabe. E teve a revisão feita pelo próprio Jair Bolsonaro. Na casa de Braga
Netto, foi feita a primeira reunião desses kids pretos, que detonou uma série
de conspirações. Mário Fernandes trabalhava sob as ordens do general Luiz
Eduardo Ramos, que era o ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência.
Ramos, antes disso, havia sido chefe da Casa Civil e ministro da Secretaria de
Governo.
Bolsonaro foi o inspirador desde o começo de tudo isso. Foi
Bolsonaro que alimentou insistentemente a mentira de que as eleições seriam
fraudadas, foi ele que rondou os quartéis cooptando apoio para a trama
golpista. Foi ele que instilou ódio contra o STF, foi ele que gritou
xingamentos contra o ministro Alexandre de Moraes em praça pública. O inquérito
do golpe tem que chegar a todos os que participaram da trama golpista.
Bolsonaro, Braga Netto, Heleno, Ramos, Almir Garnier e tantos outros que
estejam envolvidos. É isso ou veremos a repetição da história. Aquela em que a
democracia morre no fim.
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