Câmara e Senado impõem suas condições para votar os temas
importantes para o governo
A reforma ministerial prometida por Lula tem o objetivo de
dar ao governo uma eficiência que o país exige, mas não alcançará o objetivo
principal, construir uma maioria parlamentar que permita a ele governar com
mais tranquilidade. A tarefa de criar uma maioria no Congresso já foi mais
fácil e foi ganhando mais complexidade à medida que o Congresso foi ganhando
maior autonomia.
As emendas parlamentares, hoje objeto de crises
institucionais que envolvem os três Poderes — Executivo, Legislativo e
Judiciário —, já foram instrumentos de negociação política que beneficiavam o
governo. Tínhamos um sistema de hiperpresidencialismo em que o Executivo dava
as cartas, liberava as emendas a seu bel-prazer, contingenciava valores
necessários para equilibrar suas contas.
Fernando Henrique Cardoso foi o primeiro presidente da
redemocratização que usou as emendas como moeda de troca com o Congresso, mas
nunca perdeu o controle. Lula, em seus primeiros governos, também usou o
presidencialismo de coalizão para tirar votos do Congresso, mas fazia mais
favores do que pagava direitos dos partidos políticos. Os parlamentares, por
seu lado, não queriam poder além das benesses governamentais.
O regime de coalizão de Lula não tinha nada
a ver com questões ideológicas, apesar de ter colocado na Vice-Presidência no
primeiro governo o empresário José Alencar, mais para mandar um recado à
opinião pública que para os partidos, mais preocupados com o que tirariam do
novo governo que com as tendências esquerdistas vitoriosas. Tanto que o acerto
de contas para a candidatura de Alencar, do PL, foi fechado não por ele nem por
Lula, mas por José Dirceu. Os dois não quiseram ouvir o que se tratava no quarto
ao lado da sala em que estavam. Mas sabiam justamente o que era negociado.
À medida que os governos se sucederam, o Congresso foi
ganhando mais espaço, seja porque o presidente da República Michel Temer era
oriundo da Câmara, que presidiu por vários mandatos, seja porque o presidente
Jair Bolsonaro desistiu de negociar para delegar praticamente todo o poder ao
presidente da Câmara, Arthur Lira. As mudanças foram acontecendo
paulatinamente, até que quase todas as emendas passaram a ser impositivas, a
ponto de estarmos vivendo uma crise institucional séria em torno de liberações
sem transparência nem destino certo.
A verdade é que o Executivo já não tem as emendas como ponto
de negociação, ao contrário. Agora, Câmara e Senado impõem suas condições para
votar os temas importantes para o governo. Embora o ministério de coalizão de
uma suposta aliança democrática não reflita de maneira nenhuma essa promessa de
campanha presidencial, sua formação já não tem o poder de alinhar partidos
políticos aos desígnios do governo.
O fato de partidos com ministérios e cargos no governo
votarem contra ele em diversas oportunidades já se tornou corriqueiro e não
permite nem mesmo que os líderes chamem a atenção de seus aliados. Resta ao
governo melhorar sua representação e abrir espaço a aliados que possam
retribuir com eficiência a sua confiança.
Se esse ganho de eficácia favorecerá o cotidiano do governo,
não será a garantia de votos no plenário do Congresso. Os petistas mais
radicais consideram que o governo Lula está mais ao centro do que deveria. Os
integrantes de uma desejada aliança democrática julgam-se desconsiderados na
formação do governo, já que o PT tem mais da metade dos ministérios e postos
importantes. Lula é mais propenso a uma aliança ampliada do que seu partido,
mas, como ele é maior que o PT, tem de partir dele a decisão de ampliar sua
margem de manobra para reconquistar espaço no Congresso.
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