Governo precisa é de uma mudança mais ampla, que aumente
sua base social para além dos convertidos
De que forma o anúncio da guinada de política de moderação
de conteúdo feita por um gigante como a Meta e a troca da guarda no comando da
comunicação do governo Lula se conectam neste tenso início de ano, e o que a
prevalência desses assuntos demonstra?
A resposta parece ser que, de qualquer ângulo que se olhe,
as mudanças vertiginosas na comunicação e seu impacto imediato na vida de
pessoas, sociedades e países são a grande moeda política e econômica dos tempos
que vivemos.
A mudança feita por Lula na Secom parece até pueril diante
do potencial de estrago causado pela demonstração, a partir do anúncio feito
por Mark Zuckerberg, de que agora vale tudo para que as chamadas big techs se
alinhem ao Zeitgeist da volta de Donald Trump ao poder, apesar de tudo o que
perpetrou em seu primeiro mandato e depois que foi derrotado.
Trocar Paulo Pimenta por Sidônio Palmeira,
nesse contexto, se assemelha à tentativa desesperada de um técnico quando o
time enfrenta uma equipe infinitamente mais preparada e vence por um placar
dilatado.
A verdade é que há muito pouco que se possa fazer a partir
do Palácio do Planalto para conter o que o novo titular da comunicação estatal
definiu como “faroeste digital”. Portanto não é a troca de nomes que fará com
que o governo deixe de perder a batalha da opinião pública, que decorre de
muitos outros fatores além da difusão de fake news ou a suposta inoperância
desse ou daquele.
Uma coisa é a necessidade óbvia de regulamentar a
responsabilidade das gigantes de tecnologia pelos conteúdos de informação por
elas veiculados. E cabe, sim, ao governo definir uma posição clara para que o
debate não fique, de novo, a cargo apenas do Judiciário.
A defesa de que o que configura crime, manipulação política
ou incitação ao ódio e à discriminação seria apenas exercício da liberdade de
expressão seria ingênua, se não fosse cinismo deliberado na grande maioria dos
casos.
Outra coisa, no entanto, é creditar os desacertos do governo
à incompetência de fulano ou sicrano ou apenas à guerrilha digital que precisa
ser contida pela lei e pela Justiça. O caso da “taxação do Pix” é emblemático:
uma mentira dessa natureza só prospera e se difunde graças a uma série de
incompetências de diferentes níveis do governo, da norma da Receita sem a
devida explicação à divisão interna e eterna quanto à necessidade de conter
gastos, e não apenas aumentar a arrecadação
Lula já foi aclamado aqui e alhures por ser um comunicador
nato, mas o fato é que a mágica não se repetiu desde o primeiro dia de seu
terceiro governo. Pelo contrário: muitas das enrascadas em que sua gestão se
meteu e da impopularidade em igual medida à aprovação decorrem de suas próprias
escolhas, da forma como fala de improviso e comete de gafes a erros crassos que
elevam a cotação do dólar e do fato de que o grupo de pessoas que têm lastro
para dizer a ele que está errando é cada vez mais restrito.
Com essa configuração, que transforma até atos talhados para
melhorar a imagem do governo em pequenos desastres, como o relativo aos dois
anos do 8 de Janeiro, nem a mudança na Secom nem a mais draconiana regulação
das redes sociais sanarão o problema.
O que o governo precisa é de uma mudança mais ampla, que
aumente sua base social para além dos convertidos de sempre e devolva ao
presidente a aura de alguém capaz de promover justiça social ao mesmo tempo que
preserva a austeridade fiscal — este sim o cerne da dificuldade que enfrenta
hoje, que é uma crise de confiança grave e em grande medida enraizada.
Sem isso, nem sequer uma reforma ministerial ainda mais
ampla nem a necessária contenção ao vale-tudo digital serão capazes de mudar a
impressão de ineficiência, que prevalece a despeito dos bons indicadores
sociais e macroeconômicos, outra discrepância que não se explica só por
fracasso da coitadinha da Secom nem pela vilania de Zuckerbergs e Musks.
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