Começou a contagem regressiva para a 30ª Conferência
da ONU para
Mudanças Climáticas, a ser realizada em Belém (PA), de
10 a 21 de novembro. Já germinaram duas correntes. Uma privilegia as discussões
técnicas e a negociação diplomática. A outra estimula eventos folclóricos. Elas
podem conviver, mas basta perder a mão para se produzir situações ridículas,
como a da recente passagem do presidente americano Joe Biden por Manaus (AM).
Os eventos têm a virtude de distrair a atenção de quem quer
debates sérios. Como a Amazônia é
um prato cheio para encenações, a marquetagem tende a privilegiar eventos
cenográficos. Eles darão brilho às figuras de penetras infiltrados no cenário
de uma reunião diplomática.
Belém já tem problemas de infraestrutura
suficientes para ocupar os çábios do governo. Brasília anunciou
R$ 4,7 bilhões de investimentos na cidade. É um bom dinheiro e pode mudar a
cara da cidade. Valeria a pena incluir na equipe que planeja as iniciativas
alguém que conheça o desastre dos investimentos feitos no Rio para as
Olimpíadas de 2016. (A Olimpíada de 2012 de Londres revitalizou uma parte da
cidade. A do Rio engordou investimentos imobiliários em Miami.)
As COPs, como quase todas as grandes reuniões da ONU, têm
uma tradição de muito palavrório e poucos resultados. Se a conferência de Belém
for nessa linha, o Brasil e a
Amazônia serão associados a um fracasso.
Palavras ao fogo
O Brasil fechou 2024 com 278 mil incêndios na mata, um
aumento de 46% em relação a 2023 e o pior resultado desde 2007. Diga-se que
esses são fogos passados.
Com o novo ano, o relógio corre para que se meça o tempo de
hibernação da promessa de criação de uma Autoridade Climática, reiterada
por Lula em
setembro do ano passado. A criação desse novo organismo era uma promessa de
campanha.
Os agrotrogloditas são contra qualquer iniciativa para a
proteção do meio ambiente, mas a Autoridade Climática não sai por causa de
quizilas dentro do próprio governo. Cada quadrado da burocracia ambiental
defende quaisquer iniciativas, desde que não se mexa no seu mundinho de poder.
Se a Autoridade Climática for criada amanhã, será possível
que em novembro tenha resultados a oferecer.
O PT e a
economia
Se o comissariado petista abandonar o modo triunfalista de
tratar a economia, vendo conspirações em cada esquina da Faria Lima, o governo
poderá mostrar que, apesar dos tropeços, produziu bons resultados. Se persistir
no jogo do contente, 2025 será um mau ano, servindo de prelúdio para a campanha
eleitoral de 2026.
Até agora os governadores Ronaldo
Caiado (GO) e Tarcísio
de Freitas (SP) tiveram a sabedoria de cultivar atitudes racionais.
(Salvo na segurança pública, onde cultivam a demagogia do estímulo à violência
policial.)
Se Lula resolver jogar Nísia
Trindade na frigideira, os problemas do Ministério da Saúde e a
administração da cobiça por seu orçamento continuarão do mesmo tamanho.
Em silêncio, o PT aparelhou um bom pedaço da pasta.
Rio 2025
Enquanto o prefeito Eduardo Paes anunciava
que pretende criar e armar uma Força Municipal de Segurança, o vídeo de um
menino de 6 anos reclamando do abandono do Parque das Crianças, no Aterro,
viralizou. Teve mais de 35 mil visualizações.
O problema do Rio não é falta de polícia, mas falta de quem
faça honestamente o seu serviço. O Aterro do Flamengo vem sendo canibalizado há
décadas. O doutor Eduardo Paes está no seu quarto mandato.
Maduro levou
Com a eleição fraudada, Nicolás
Maduro começará seu novo mandato como presidente da Venezuela. Não
mostrou as atas eleitorais, desprezou as críticas e ofereceu 100 mil dólares em
dinheiro para quem o ajudar a capturar o candidato da oposição.
Edmundo González ficará na Argentina, onde Javier Milei considera-o
presidente eleito.
Esse jogo ficará no campo do palavrório até o dia 20,
quando Donald
Trump assumirá o governo dos Estados Unidos.
No caldeirão do trumpismo cozinha-se alguma surpresa para a
América Latina.
Noves fora os imigrantes, Cuba e Venezuela,
Trump já mostrou os dentes para o Panamá e, de
leve, para o Brasil.
EUA cucarachas
Os presidentes americanos pegaram um vírus de alguns de seus
similares latino-americanos e desaprenderam a arte de sair com elegância da
Casa Branca. Em 2021, Trump tentou um golpe. Já Joe Biden perdoou os crimes do
filho atacando o Judiciário e soltou a notícia de que cogita atacar as
instalações nucleares do Irã. Elas estão lá há mais de dez anos.
Em 1801, o presidente John Adams saiu de Washington para não
passar o cargo a Thomas Jefferson, mas não aporrinhou os outros.
Delírio palaciano
Pelo menos um ministro do Supremo Tribunal Federal com
tradição de amor à intimidade palaciana teve uma conversa impertinente com Jair
Bolsonaro nos últimos meses de 2021.
A impertinência esteve no que o doutor aceitou ouvir.
A habilidade de Carter
Nos últimos dois anos morreram dois personagens do século
passado, ambos centenários. Henry Kissinger, um diplomata que se tornou figura
pop enquanto esteve no poder, foi-se em 2023. Teve um funeral de segunda,
assombrado pelos fantasmas de seu apoio ao golpe do Chile e pela inutilidade de
seus bombardeios no Vietnã. No final de 2024, morreu Jimmy Carter. Derrotado na
eleição de 1980, parecia um político fracassado. Teve um funeral de primeira
pela firmeza com que defendeu a democracia e os direitos humanos.
Kissinger e Carter eram frios como cobras. Um (Carter)
gostava da vida e tinha senso de humor. O outro (Kissinger) era um atormentado.
Uma cena de 1978 ilustra a leveza com que Carter levava a
vida.
Depois de muita costura, o primeiro-ministro de Israel,
Menachem Begin, e o presidente do Egito, Anwar Sadat, desceram em Camp David, a
casa do presidente dos Estados Unidos nas montanhas. Era a primeira vez que
isso acontecia. Begin era um radical e Sadat havia atacado Israel em 1973.
Na primeira reunião, Sadat puxou um texto de exigências e o
leu por 90 minutos. Queria um Estado Palestino com capital em Jerusalém, a
retirada dos israelenses para as fronteiras de 1967 e o desmanche dos
assentamentos em áreas contestadas. Só faltava exigir que se convertessem ao
islamismo.
Begin ouviu calado e parecia estar a um passo de uma
explosão. A reunião começava da pior maneira possível.
Carter quebrou o silêncio e, sério, dirigiu-se a Begin.
Disse-lhe que endossasse a proposta de Sadat. Assinando-a, dispensaria maiores
discussões.
Os três deram uma grande gargalhada e começaram as conversas
que durariam 13 dias.
O acordo de Camp David esfriou a tensão no Oriente Médio,
mas, como se viu, deu em pouca coisa.
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