Os três compromissos sobre o cessar-fogo em Gaza têm a
marca de Trump
O acordo oficial de cessar-fogo em Gaza, que está nas
manchetes, oculta os dois acordos ocultos sobre os quais se sustenta. Os três
têm a marca de Trump.
O primeiro, formal, assinala derrotas para Israel e
para o Hamas. Israel aceita retirar parcialmente suas forças sem destruir o
Hamas, objetivo declarado pelo governo de Netanyahu, e paga um preço elevado
com a libertação de centenas de valiosos presos palestinos. O Hamas, degradado
à condição de insurgência guerrilheira, fica isolado regionalmente após a queda
da ditadura síria, a derrota militar do Hezbollah e a humilhação do Irã.
Desse acordo, emergem dois vitoriosos. Os palestinos de Gaza
ganham um respiro em meio à colossal tragédia humanitária que se estende por 15
meses. Trump surge como patrocinador da paz, antes ainda de sua posse. Mas a
guerra está nas cartas dos acordos subterrâneos.
O segundo acordo é entre Netanyahu e os ministros
supremacistas que mantêm seu governo à tona. Smotrich e Ben Gvir obtiveram do
primeiro-ministro as promessas de expandir os assentamentos israelenses na
Cisjordânia e, além disso, de retomar a ofensiva em Gaza após a fase 1 do
cessar-fogo.
Os dois supremacistas votaram contra o
acordo, mas não derrubarão o governo. No lugar disso, farão gestos vazios
dirigidos à sua base política —e, sobretudo, oferecerão as promessas informais
extraídas de Netanyahu. A meta final deles é a limpeza étnica em Gaza e a
recolonização israelense do território palestino.
O terceiro acordo é entre Netanyahu e Trump. Basicamente,
trata-se de um compromisso pela derrota total do Hamas —ou seja, de deposição
das armas e exílio de seus combatentes ou de extermínio físico deles.
Os sinais estão em declarações públicas dos dois lados.
Lado israelense. Um "oficial sênior", senha
utilizada por Netanyahu para dizer aquilo que não pode dizer, emitiu um
comunicado com a seguinte passagem: se, nas negociações da fase 2, "o
Hamas não concordar com as exigências de Israel para o fim das hostilidades (os
objetivos da guerra), Israel permanecerá no Corredor
de Philadelphi até nova notícia". Tradução: Israel retomará a
ofensiva caso não obtenha a rendição completa do Hamas.
Lado dos EUA. Pete Hegseth, o indicado por Trump para o
Pentágono, afirmou o seguinte na sua audiência de confirmação no Senado:
"Eu apoio Israel destruir e matar até o último integrante do Hamas".
Quase simultaneamente, Mike Waltz, novo conselheiro de Segurança Nacional,
esclareceu: o Hamas "deve ser destruído até o ponto em que não possa mais
se reconstruir". Foi ainda mais explícito numa entrevista à Fox News. Na
hora em que o cessar-fogo era anunciado por Biden, pediu a atenção do
"povo de Israel": "se precisarem voltar para dentro, estaremos
com eles".
Trump jamais criticou Israel pela ausência de um plano
político para o "day after". Essa é a crítica impotente mantida por
Biden e Blinken. Do ponto de vista de Trump, o erro de Israel foi conduzir uma
guerra lenta que se converteu num desastre de relações públicas. O novo
ocupante da Casa Branca aposta na rendição completa do Hamas —e, na falta
disso, numa etapa decisiva de ações militares.
Assinando o cessar-fogo, Netanyahu assume o risco da queda
de seu governo. Mas enxerga uma porta de saída na qual está pintado o nome de
Trump.
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