quinta-feira, 26 de junho de 2025

EDUARDO BOLSONARO, DONALD E PATETA

Editorial O Estado de S. Paulo

Filho de Bolsonaro amarga ‘exílio’ nos EUA que inclui passeio na Disney, participação em rodeio e hospedagem luxuosa. É assim que ele pretende denunciar uma suposta ditadura no Brasil

Pateta é aquele personagem abobalhado da Disney, e é também todo aquele que acredita que Eduardo Bolsonaro, filho de Jair Bolsonaro, foi aos EUA para, dali, “resgatar liberdades perdidas” no Brasil. Há poucos dias, este jornal mostrou o dolce far niente do deputado federal licenciado em sua rotina de “exilado político” – que incluiu um passeio com a família num parque da Disney, onde certamente estavam o Pateta e Donald, o famoso pato.

Donald – não o pato, mas o presidente dos EUA, que de pato não tem nada – vem até agora ignorando olimpicamente os esforços de Eduardo Bolsonaro para parecer um exilado político. Deveríamos fazer o mesmo, mas é irresistível constatar quão rapidamente a farsa bolsonarista de perseguição política se converteu numa fantasia típica da Disneylândia.

As maquinações internacionais do deputado licenciado se resumem a manifestações de cunho político por meio de postagens nas redes sociais, gravações de vídeos, entrevistas concedidas a sites e canais bolsonaristas e, ora vejam, um roteiro festivo com cara de férias familiares prolongadas: desde março, momento em que se afastou oficialmente da Câmara dos Deputados, seu roteiro incluiu, além da diversão na Disney, uma participação num campeonato de rodeio da Professional Bull Riders, realizado em Arlington, no Texas, onde Eduardo mora, além de vídeos exibindo uma casa de alto padrão onde ele e a família se hospedaram, em Orlando, na Flórida, ou apresentando a rotina doméstica no Texas. É, em resumo, um doce exílio – oficialmente bancado pelo pai, que disse ter enviado ao desafortunado pimpolho cerca de R$ 2 milhões.

É assim que Eduardo Bolsonaro pretende mobilizar o “amigo” Donald Trump e os porta-vozes da extrema direita internacional para liderar uma campanha contra o Supremo Tribunal Federal (STF), a Procuradoria-Geral da República e a Polícia Federal, instituições tidas como algozes de seu pai e aliados – réus em ação penal por suspeita de envolvimento até o último fio de cabelo numa tentativa de golpe de Estado.

A permanência de Eduardo em solo norte-americano tem sido adornada por alguns encontros e gestos políticos, como as visitas que o parlamentar fez à Casa Branca ao lado do youtuber bolsonarista Paulo Figueiredo Filho – foram ao menos duas, e uma delas registrada por um ex-assessor de Trump; viagens obscuras a Washington e encontro com os deputados Brian Mast, presidente do Comitê de Relações Exteriores da Câmara dos EUA, e Cory Mills – o mesmo que já questionou publicamente o secretário de Estado, Marco Rubio, sobre possíveis sanções ao ministro Alexandre de Moraes, do STF. Mas isso nem de longe revela uma rotina de um perseguido político que conspira contra o Brasil – o que, inclusive, desabona o inquérito policial aberto a pedido do procurador-geral da República, Paulo Gonet, e autorizado por Alexandre de Moraes, sob o argumento de que o parlamentar estaria em “enérgica” campanha para que o governo dos EUA imponha sanções a autoridades brasileiras.

Ainda que o clã Bolsonaro tente mobilizar mundos e fundos sempre que seus interesses estão ameaçados – e isso significa dar vazão ao golpismo que corre nas veias da família –, o fato é que a agenda norte-americana do deputado licenciado se mostra incapaz de dar sequência à longa trajetória de desrespeito do bolsonarismo à ordem democrática brasileira. O Brasil ganha quando Eduardo Bolsonaro dedica suas muitas horas livres nos EUA à rotina de rodeios, parques temáticos e exibicionismos domésticos. Não é à toa que Trump não pareça particularmente comovido com o tal “exílio” do deputado – não por qualquer vocação do presidente dos EUA para o respeito institucional e diplomático, mas porque Trump certamente tem mais o que fazer.

Enquanto Eduardo estiver confundindo férias com exílio, o Brasil estará mais protegido dos delírios dos Bolsonaros. E é melhor ainda que o faça financiado não por verbas públicas, mas pelo dinheiro do papai – arrecadado entre os apatetados devotos que acreditam que Bolsonaro e sua família são campeões da democracia.

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