No momento em que anuncia o tarifaço ao Brasil, usando como
justificativa uma inventada “caça às bruxas” a Jair Bolsonaro, Donald Trump
está enredado, para variar, numa teia de enroscos domésticos e internacionais,
que vão da complicação da guerra da Rússia contra a Ucrânia às decisões da
Justiça cassando outras de suas decisões arbitrárias, passando pela tragédia
das mortes no acampamento de férias no Texas.
Usa o Brasil, com outras bazófias, como uma de suas
habituais cortinas de fumaça para tentar obscurecer assuntos que lhe são
desconfortáveis. Não está nem aí para o Brasil, nem mesmo para Bolsonaro. Mas o
ex-presidente, seus apoiadores e a parcela mais fanatizada do eleitorado que
ainda lhe é fiel reverberam uma comemoração estúpida, por não levar em conta
que todos no país serão afetados negativamente por essa chantagem absurda, que
desconsidera a soberania brasileira.
Mais uma vez, Trump prova ser feito do
mesmo material que o próprio aliado de conveniência, seu genérico brasileiro:
age sempre pelos impulsos mais comezinhos, que atendem única e exclusivamente à
sua lógica pessoal torpe de dilapidação das instituições, dos consensos
políticos e da previsibilidade na gestão pública. No caso da decretação de uma
tarifa de importação absolutamente arbitrária para produtos brasileiros, também
manda às favas o Direito internacional, as práticas comerciais mais elementares
e a diplomacia, numa agressão que nenhum político brasileiro, seja do campo
político que for, deveria admitir, sob pena de ser rechaçado de pronto por seus
próprios eleitores.
Mas trumpismo e bolsonarismo operam no caos, crescem na
desinformação e tentam, sempre, substituir a racionalidade na avaliação das
decisões — políticas, judiciais, comerciais, de toda natureza — por um misto de
empulhação ideológica com messianismo, que lamentavelmente ainda consegue
arrastar desavisados.
Não se justifica que governadores, prefeitos e
parlamentares, eleitos para representar os interesses da sociedade brasileira,
se ajoelhem no altar da sabujice política para aplaudir bovinamente a agressão
gratuita e injustificável ao governo, ao Judiciário e também ao Congresso
brasileiro. Todos sabem que não há nada de ilegal nos processos contra
Bolsonaro e seus ex-auxiliares. Durante anos eles agiram deliberadamente para
tentar minar o processo eleitoral, perseguir o Judiciário, manietar o
Ministério Público e espionar adversários, tudo com o objetivo final de
impedir, a qualquer custo, a alternância de poder caso ele perdesse a eleição,
como de fato perdeu.
Trump também não acalenta a ilusão de que há a tal
perseguição. Na verdade, mal conhece Bolsonaro e não está nem aí para seu
destino. Ao se arrogar o papel de seu defensor tanta, antes, pressionar a
Justiça brasileira por ter feito o que a americana não fez: levar a cabo, sem
ceder a pressões, o julgamento daqueles — políticos e também seus seguidores
fanatizados nas ruas — que tentaram fazer sucumbir a democracia. Num de seus
muitos surtos autoritários e megalômanos, parece acalentar a ilusão de que com
sua chantagem fará o Supremo Tribunal Federal recuar e provará que tudo bem
tentar dar um golpe, em Brasília ou em Washington.
Por óbvio, isso não acontecerá, mas os prejuízos econômicos
e diplomáticos podem ser violentos, em muitas esferas, para o Brasil, mas
também para o país que o próprio bravateiro comanda. Bolsonaristas que deram
vivas a esse desatino devem pagar nas urnas o preço por levar em conta antes o
interesse de seu guru que do país a que têm a missão, conferida pela
Constituição e pelo restante do ordenamento jurídico, de servir. Só um
lembrete: este país é o atacado, não o que ataca.


Nenhum comentário:
Postar um comentário