Por atuar deliberadamente para prejudicar o Brasil, o
deputado não pode continuar como parlamentar. Que a Câmara não repita com ele o
erro que cometeu há 25 anos, ao deixar impune o pai dele
Diante das barbaridades protagonizadas pelo então deputado
federal Jair Bolsonaro, este jornal pediu a sua cassação em janeiro de 2000,
classificando-o pelo que ele era – um dejeto da democracia, alguém
desqualificado que se servia das mesmas liberdades democráticas que sempre
desejou eliminar. Passados pouco mais de 25 anos, é preciso dizer o mesmo sobre
seu filho Eduardo Bolsonaro. Por atuar deliberada e sistematicamente para
prejudicar o Brasil, em nome dos interesses particulares de sua família, Eduardo
Bolsonaro precisa ter cassado seu mandato de deputado federal. Trata-se da
única reação cabível por parte de uma democracia digna do nome.
Eduardo já fez de tudo, mas não há afronta à democracia que
não possa ser superada por outra maior. Não lhe pareceu suficiente, por
exemplo, regozijar-se do lobby que fez junto ao governo dos EUA como forma de
pressionar o Supremo Tribunal Federal (STF) a desistir dos processos contra seu
pai, tornando-se responsável, em grande medida, pelo tarifaço convertido em
chantagem explícita do presidente americano, Donald Trump, contra o Brasil e a
favor de Jair Bolsonaro. Também não lhe bastou arvorar-se em negociador
diplomático e pedir sanções contra autoridades brasileiras, entre as quais os
presidentes da Câmara e do Senado, o ministro do STF Alexandre de Moraes e o
presidente Lula da Silva. Era preciso, como fez o pai durante as décadas que
passou no Congresso, enxovalhar a instituição parlamentar que ele mesmo
integra: nesta semana, o deputado admitiu na caradura que está sabotando o
esforço da comitiva de senadores brasileiros que viajou aos EUA para tentar
abrir algum canal de diálogo com o Congresso e o governo americanos a fim de
evitar as tarifas impostas por Trump.
Dias antes, reclamou dos governadores de São Paulo, Tarcísio
de Freitas (Republicanos), e do Paraná, Ratinho Junior (PSD), por se
pronunciarem sobre o tarifaço sem mencionar o que realmente importa para os
Bolsonaros – a liberdade de Jair Bolsonaro. Ainda acusou Tarcísio de tê-lo
desrespeitado por dialogar com empresários paulistas e com o encarregado de
negócios dos EUA no Brasil, Gabriel Escobar, para discutir a crise. Segundo a
cartilha bolsonarista, qualquer ação que se afaste da defesa direta da impunidade
para o ex-presidente e outros golpistas equivale a uma declaração de guerra.
A lista de suas imposturas também envolveu uma live nas
redes sociais, na qual o irascível “Zero Três” não só manteve o diapasão alto
nos ataques ao STF como recorreu a uma intimidação de fazer corar vítimas de
gângsteres, milicianos e contraventores do gênero. Ao mencionar a Polícia
Federal e citar o delegado responsável pelos principais inquéritos contra
Bolsonaro, subiu alguns graus do “jus sperniandi” de quem se enxerga um
injustiçado para fazer ameaça explícita: “Vai lá, cachorrinho da Polícia
Federal que tá me assistindo, deixa eu saber não”, avisou. “Se eu ficar sabendo
quem é você, eu vou me mexer aqui. Pergunta ao tal delegado Fábio Alvarez Shor
(que investigou Bolsonaro em diversos inquéritos) se ele conhece a
gente”. Um assombro.
Com o prazo expirado da licença que o deputado tirou para
sabotar o Brasil em solo americano, e sem planos imediatos de retornar ao País,
esperava-se que ele renunciasse ao mandato que os paulistas infelizmente lhe
deram. Nos últimos dias, difundiu-se na imprensa a possibilidade de a Câmara
adotar o mesmo artifício usado no caso do deputado Chiquinho Brazão, réu pelo
assassinato da vereadora carioca Marielle Franco: deixar que as faltas às
sessões cumprissem a função da perda do mandato. Será um erro gravíssimo. A fim
de cuidar da própria imagem, não bastará ao Legislativo federal recorrer a essa
solução. Afinal, Eduardo Bolsonaro passou dos limites e merece não a inércia
corporativista da Casa, mas uma punição dura, real e imediata.
Há 25 anos, quando poupou o então deputado Jair Bolsonaro, a
Câmara escolheu desmoralizar-se. Que não repita esse erro agora com Eduardo
Bolsonaro.


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