Inflação resistente da comida e gasto público mais
contido no primeiro semestre fazem efeito
O processo de Jair Bolsonaro e seus desdobramentos,
como o tarifaço, abafaram a conversa política da primeira metade do ano.
Também se presta ainda menos atenção à economia e
seu efeito sobre o prestígio presidencial e o Congresso. Inflação,
gasto público (com emendas inclusive) e um início de desaquecimento do PIB
merecem atenção.
O primeiro semestre foi de vazio de decisões no Congresso,
travado também por negociação de emendas. Terminou com a querela
do IOF, outra revolta contra impostos, que encurralava o governo e será
tema eleitoral de 2026.
No primeiro trimestre, atormentado pela baixa na
popularidade e pela inflação de
alimentos, que passara de 8% ao ano em 2024, o governo prometia providências.
Em março, o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva dizia
procurar o "pilantra" da carestia do ovo. Não achou.
A falação e as poucas medidas deram em
nada. O grosso da inflação da comida derivava de problemas mundiais,
dificuldades incontornáveis no curto prazo em certos produtos (carne, café
etc.) e do dólar caro, em parte por causa da lambança fiscal.
A carestia da comida ("alimentação no domicílio",
para o IBGE) ainda anda a 7,1% ao ano. Não seria ritmo crítico não fosse o
efeito da grande inflação que apareceu no final da epidemia, o que ajudou a
eleger Donald Trump.
Nos últimos seis anos, o salário médio nominal no Brasil
cresceu 53,2%, além dos 40,2% do IPCA. Mas a inflação da comida aumentou 68,1%.
O alívio relativo de meados de 2023 a meados de 2024 passou, o povo miúdo
voltou a passar mal.
A baixa mundial do dólar ajudou a acalmar mercados e a
atenuar a inflação média, com a contribuição de preços de commodities e bens
industriais comportados. As taxas de juros de
prazo além de dois anos estão no rumo de baixa desde fevereiro, no mercado.
Ainda assim, a taxa real de um ano está perto de 9,5% ao
ano. Era de 6% em março de 2024 (antes da lambança da mudança da meta fiscal) e
de 8% em outubro de 2024 (antes da lambança do pacote fiscal). O crédito
bancário encarece, cresce menos e há mais inadimplência
A economia desacelerou no segundo trimestre: queda de 1,7%
no comércio, estagnação na indústria, alta de 1,1% nos serviços. Parecem
números compatíveis com um crescimento do PIB que passaria do 3,4% de 2024 para
perto de 2,3% neste ano.
O desaquecimento mal afeta o mundo de emprego e salário —em
geral, essa mudança aparece mais tarde no ciclo econômico, talvez em 2026. Por
outro lado, um aumento da execução orçamentária neste resto de 2025 daria algum
gás à atividade econômica.
O gasto federal no primeiro semestre aumentou 2,4%, em
termos reais (ante a primeira metade de 2024). No ano passado, crescera 10,5%.
A aprovação tardia do Orçamento, o parcelamento mais rigoroso do gasto ao longo
do ano, a postergação do pagamento de precatórios e o temor de receita menor
pesaram na execução da despesa que o governo ainda controla (discricionária).
Foi o caso em saúde e educação, Bolsa Família (por revisões), investimento e,
por tabela, em emendas.
Além da pressão do STF para limitar a mutreta, menos
dinheiro para emendas explica em parte revoltas no Congresso. O outro assunto
parlamentar central é a mudança de foro de julgamento. Emendas, a tentativa de
fugir da Justiça, regulação de "big techs" e, claro, a insurreição
permanente dos golpistas dominam o cenário.
Em resumo, conviria não esquecer do efeito político do ruído
de fundo da economia.


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