E este texto inclui também a abordagem de uma política
monetária alternativa
John Maynard Keynes (1883-1946) foi um economista britânico
considerado o pai da moderna análise macroeconômica. Seu livro mais conhecido
foi publicado em 1936 e em português veio com o título de A Teoria Geral do
Emprego, do Juro e da Moeda (São Paulo, Editora Atlas, 1992).
Anteriormente a Keynes, a teoria macroeconômica
predominante, de influência liberal, era a de que uma economia se
reequilibraria automaticamente se os salários fossem flexíveis. Mas isso não
acontecia e Keynes passou a pregar que uma economia em recessão exigia forte
intervenção estatal mediante mais gastos públicos, inclusive via endividamento
e emissão monetária, para estimular o crescimento econômico e o desenvolvimento
social.
A abordagem expressa no título deste artigo não veio de
Keynes nesse livro, mas sim de um artigo que ele publicou na revista mensal Red
Book, dos EUA, em dezembro de 1934 – note-se que a economia ainda estava sob o
impacto da crise de 1930 –, na qual respondeu à pergunta: “Pode a América
gastar seu caminho na direção da recuperação?”. Ele respondeu sim, em
contraposição a outro economista, Harold J. Laski, que respondeu não e não teve
a fama de Keynes. Num debate sobre o assunto em São Paulo, soube da revista e
consegui comprá-la num antiquário de publicações nos EUA, pelo correio.
No seu artigo, Keynes argumenta que o
governo deve gastar, mas gastar bem. “Produtivas e socialmente úteis despesas
são preferíveis a gastos improdutivos. (...) Não há uma forma melhor pela qual
a América pode gastar em prosperidade do que gastando dinheiro construindo
casas”. E prossegue: “A necessidade está ali aguardando ser satisfeita; o
trabalho e os materiais estão lá aguardando ser utilizados. Isso expandiria o
emprego em todas as localidades. Não há maior benefício econômico e social do
que boas casas.” Quem conhece os EUA sabe do apego que os americanos têm por
casas. E Keynes estava escrevendo em 1934. Hoje, provavelmente, também teria
feito referências a apartamentos.
Agora vamos tratar, recorrendo à internet, de uma medida de
política monetária conhecida no exterior como Quantitative Easing ou
Relaxamento Quantitativo (RQ), pela qual um banco central compra ativos
financeiros de longo prazo como títulos do governo repassando-lhe dinheiro
vindo inclusive de emissão monetária, com o objetivo de ampliar o dinheiro na
economia, inclusive para programas habitacionais.
Ampliando o crédito com juros mais baixos, empresas e
consumidores são incentivados a gastar e investir, impulsionando a atividade
econômica. Em geral, o Relaxamento Quantitativo pode ser usado em recessões,
quando as ferramentas de política monetária convencionais, como a redução da
taxa básica de juros deixa de ser eficaz. Na crise de 2008, e depois dela, o RQ
foi usado pela primeira vez em grande escala em países como EUA, Inglaterra e
Japão, mas este começou antes.
E o Brasil, como fica nesse contexto? Aqui o déficit
habitacional é grande e muitos brasileiros se disporiam a comprar um imóvel se
o financiamento lhes fosse acessível. A mão de obra também existe, a
qualificação dela também ocorre muito no próprio trabalho, o on-the-job
training, e materiais para construção também não faltam.
Mas hoje a inflação está alta e vem caindo vagarosamente.
Não há perspectiva de recessão, mas a taxa de crescimento do PIB deve cair para
um valor próximo de 2% ao ano, uma taxa muito baixa. Acho que já temos uma
“recessão de taxa de crescimento do PIB” e não tem sentido aguardar taxas de
crescimento negativas para pensar em algo como o Relaxamento Quantitativo.
Um agravante é que nosso Banco Central parece só ter um
instrumento de política monetária, a taxa básica de juros, que fica no sobe e
desce dependendo das circunstâncias. Precisaria ser bem menos ortodoxo. Não
pensa no crescimento econômico, que é o que está por trás do objetivo do
Relaxamento Quantitativo, além dos ganhos sociais advindos do grande número de
novas residências.
Mas olhando a discussão sobre macroeconomia, ela está
concentrada no debate sobre a política fiscal expansionista e a alta taxa
básica de juros do Banco Central, hoje, em 15% ao ano. Nem Lula nem o Congresso
se interessam em discutir com profundidade a questão do baixo crescimento. Com
Lula no poder, essa situação pode até se agravar no próximo ano eleitoral,
diante de seu apego a medidas expansionistas do lado fiscal. E hoje o mais
provável é que ele vencerá também a eleição do ano que vem.
Aí ele poderá escolher entre manter-se como um fiscalista
irresponsável, já buscando votos para um petista de sua escolha em 2030. Ou, se
quiser entrar para a história de um modo positivo, adotar uma política
econômica para colocar a casa em ordem, em particular do ponto de vista fiscal.
O que ele fará? Infelizmente, o mais provável é que ele escolherá o primeiro
caminho. E se isso acontecer, um Relaxamento Quantitativo não terá espaço para
se desenvolver.


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