Os problemas da expansão urbana estão na conversa cotidiana
dos milhões de brasileiros que vivem em grandes cidades e sabem “onde o sapato
aperta”. São reféns do metrô e do ônibus, das enchentes, da violência, da
precariedade dos serviços públicos. No vestibular, todo estudante depara com a
“questão urbana” e os pesquisadores se debruçam sobre o assunto, que também é
parte significativa da pauta nos meios de comunicação.
Não poderia ser diferente: com 85% da população nas cidades
(chegará a 90% ao final desta década), quem pode esquecer a relevância do tema?
Parece incrível, mas os grandes operadores do sistema
econômico e político tratam os problemas das cidades como grilos que irritam ao
estrilar. Passados os incômodos de cada crise, quem ganha dinheiro no caos
urbano toca em frente seus negócios e quem ganha votos, sua campanha. Só alguns
movimentos populares e organizações civis –Passe Livre, Nossa São Paulo e
outros– insistem em plataformas, debates e campanhas para enfrentar os
problemas e encontrar soluções sustentáveis.
A criação do Ministério das Cidades, no governo Lula, fazia
supor que o Brasil enfrentaria o desafio urbano, integrando as políticas
públicas no âmbito municipal, estabelecendo parâmetros de qualidade de vida e
promovendo boas práticas. Passados quase 12 anos, o ministério é mais um a ser
negociado nos arranjos eleitorais.
A gestão é fragmentada, educação para um lado e saúde para
outro, habitação submetida à especulação imobiliária, saneamento à espera de
recursos que vão para grandes obras de fachada, transporte inviabilizado por um
século de submissão ao mercado do petróleo. A fragmentação vem do descompasso
entre União, Estados e municípios, desunidos por um pacto antifederativo,
adversários na disputa pelos tributos que se sobrepõem nas costas dos cidadãos.
Os recentes conflitos em várias capitais, o protesto nos
trens do Rio e agora no metrô de São Paulo indicam que a paciência da população
já esgotou e as autoridades nem percebem, pois atribuem o caos à ação de
sabotadores e continuam complacentes com o mau serviço.
Precisamos superar essa lógica restrita. Temos que construir
um novo federalismo feito de autonomia e responsabilidades compartilhadas no
enfrentamento dos problemas reais, entre eles a qualidade de vida nas cidades.
Uma nova gestão urbana pode nascer com a participação das
organizações civis e movimentos sociais que acumularam experiências e
conhecimento dos moradores das periferias e usuários dos serviços públicos.
Quem vive e estuda os problemas, ajuda a achar soluções.
Com urgência, pois, ao contrário do que dizem, pior do que
está pode ficar.
Marina Silva, ex-senadora, foi ministra do Meio Ambiente no
governo Lula e candidata ao Planalto em 2010. Escreve às sextas na Folha de
S.Paulo.
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