Da BBC Brasil
Como esperado, a Câmara dos Deputados negou o prosseguimento
da segunda denúncia contra o presidente Michel Temer. Foram 251 votos
favoráveis a Temer e 233 contrários. Dois deputados se abstiveram e outros 25
se ausentaram.
A vitória do peemedebista, porém, foi mais apertada do que
na primeira denúncia barrada pela Câmara - foram 263 votos favoráveis a Temer e
227 contrários.
A segunda denúncia contra Temer, apresentada pela
Procuradoria-Geral da República ao Supremo Tribunal Federal (STF), acusa o
presidente de obstrução de Justiça e formação de quadrilha. Com a decisão da
Câmara, a denúncia fica suspensa até que Temer conclua seu mandato. A Justiça
poderá, no entanto, julgá-lo quando ele deixar de ser presidente, caso
considere as acusações consistentes.
Embora favorável ao presidente, o resultado indica que ele
terá dificuldades em reunir o apoio necessário (308 deputados) para aprovar sua
ambiciosa proposta de reforma de previdência.
"Mesmo com todo o esforço do governo, perderam votos.
Com esse resultado, sem chance de conseguirem aprovar a reforma da previdência.
Os deputados da base não vão encarar mais esse desgaste", disse o líder do
PSB, Julio Delgado, deputado de oposição ao governo.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que tem assumido uma
postura mais conflituosa com Temer, voltou a manifestar total compromisso com a
aprovação das mudanças na previdência, mas apontou certo desgaste na relação
entre governo e a Casa após as duas denúncias. "O presidente saberá
refletir qual o melhor caminho para restabelecer sua relação com os
deputados", afirmou.
Novo cronograma do governo
Já aliados de Temer minimizaram a perda de votos. Para o
ministro da Secretaria de Governo, Antônio Imbassahy, que deixou
temporariamente o cargo para votar como deputado, o governo só perdeu de fato 6
votos, que foi o número de deputados a mais que foram favoráveis ao andamento
da denúncia. Os outros que deixaram de votar com o governo dessa vez optaram
por se ausentar, ressaltou.
"A primeira denúncia foi muito mais difícil que
essa", disse ainda, evitando, porém, fazer prognósticos sobre a reforma da
previdência.
Vencida a denúncia, essa será a nova prioridade do Palácio
do Planalto, que argumenta que as mudanças nas regras de aposentadoria são
imprescindíveis para reverter o rombo bilionário das contas públicas.
No cenário ideal do governo, a reforma será aprovada em
novembro na Câmara dos Deputados e até março no Senado, onde precisa do apoio
de 49 dos 81 senadores.
Depois disso, a fervura eleitoral tende a inviabilizar
qualquer pauta mais sensível, reconhecem políticos da base. Eles admitem também
que a reforma só será aprovada se o governo ceder em pontos polêmicos, como a
criação de uma idade mínima para aposentadoria, que deseja fixar em 65 anos
para homens e mulheres.
O líder do governo na Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro
(PP-PB), argumentou que o resultado desta noite não serve de parâmetro para a
votação da reforma, já que alguns parlamentares favoráveis às mudanças na
previdência ficaram contra Temer na votação da denúncia - foi o caso de parte
da bancada tucana.
Ele acabou reconhecendo, porém, que o governo terá que
negociar uma proposta mais modesta: "Mesmo que se vote esse ano (a reforma
da previdência na Câmara), não será suficiente para o que o Brasil
precisa".
Votação à noite
As semanas anteriores à votação foram marcados por intenso
contato de Temer com deputados da base, que foram agraciados com a liberação de
dinheiro para obras, por meio do empenho de emendas parlamentares - quase R$ 1
bilhão em setembro e outubro - e uma série de nomeações de aliados para cargos
do segundo escalão.
Sem votos para aprovar o andamento da denúncia - que
exigiria 342 dos 513 deputados - a oposição passou o dia tentando impedir que
fosse atingido o quórum necessário de 342 deputados para abertura da votação.
Não conseguiu, mas, com ajuda de alguns insatisfeitos da base governista, foi
capaz de empurrar a votação para a noite, quando supostamente mais pessoas
poderiam acompanhar a sessão de casa, gerando mais desgaste para os aliados de
Temer.
Durante o dia, com um pequeno caixote e um megafone,
improvisaram um palanque do lado de fora do plenário, onde se revezaram em
ataques ao governo.
"Somos minoria aqui na Casa, mas somos maioria na
sociedade. Mais de 90% do povo brasileiro quer Temer fora do governo. Essa
casa, por força de manobras e da corrupção da compra de votos, é a única
instância em que esse governo tem maioria", discursou a deputada Luiza
Erundina (PSOL-SP).
Deputados fiéis ao presidente, por sua vez, lançaram
novamente mão do discurso da "estabilidade", argumentando que a
continuidade do governo era fundamental para a recuperação da economia.
"Deixe o homem trabalhar", brandou da tribuna o
polêmico deputado Wladimir Costa (SD-PA), que na primeira denúncia fez uma
tatuagem falsa com nome de Temer no ombro.
Além disso, aliados do presidente repetiram o discurso
contra a "inépcia" da denúncia apresentada pelo ex-procurador-geral
Rodrigo Janot - críticas que ganharam novo fôlego depois que foram revelados no
início de setembro indícios de ilegalidade na condução da delação da JBS pela
Procuradoria-Geral da República (PGR).
"Essa denúncia é inepta, fruto de uma armação sórdida
para derrubar o presidente da República, o que seria uma
irresponsabilidade", defendeu o líder do PMDB, deputado paulista Baleia
Rossi.
Legado de Janot
Na segunda denúncia, Janot acusou o presidente de ter
tentado parar a Lava Jato. Ele teria feito isso ao dar o aval para que o
empresário Joesley Batista, do frigorífico JBS, "comprasse" o
silêncio do ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e
do suposto operador do PMDB, o empresário Lúcio Funaro.
Além disso, Janot acusa Temer de ser o chefe de um grupo
criminoso, que seria formado por políticos do PMDB na Câmara dos Deputados.
Para a PGR, Temer era o braço político da suposta quadrilha, responsável por
viabilizar os interesses de empreiteiras e outras empresas dentro do Congresso
em troca de subornos.
Além da delação da JBS, o acordo de delação de Lúcio Funaro
também forneceu elementos para a nova denúncia.
Em sua defesa, Temer se diz vítima de uma
"conspiração" e cita os indícios de possíveis ilegalidades na
condução da delação da JBS pela Procuradoria. Informações reveladas em
setembro, a partir de gravações entre os delatores, indicaram que procuradores
podem ter orientado os delatores ilegalmente a gravar o presidente.
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