Desde a transição democrática, há 34 anos, a articulação
política não se concentrava tão ostensivamente nas altas patentes militares. A
demissão do ministro Gustavo Bebianno isola o ministro Onyx Lorenzoni no quarto
andar do Palácio do Planalto, ante a ascensão do general Floriano Peixoto à
Secretaria-Geral da Presidência. Considerando-se o vice-presidente, Hamilton
Mourão, e o porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros, são cinco generais
e um civil no primeiro escalão do palácio, elevando as Forças Armadas ao
patamar de quarto poder da República.
Na última semana, foi uma dupla de generais que entrou em
campo com a espinhosa missão de aconselhar o presidente, apaziguar as relações
no entorno familiar e político e evitar a demissão de Bebianno, vista como um
gesto temerário neste começo de governo. Por acaso, um desses generais exibe no
currículo um curso de combate na selva, que talvez faça a diferença neste
início bélico, com o abate do primeiro ministro em 50 dias de gestão.
Essa dupla é formada pelos ministros do Gabinete de
Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, e da Secretaria de
Governo, general Carlos Alberto Santos Cruz, que integram o núcleo mais próximo
a Bolsonaro. Eles se reuniram quase diariamente com o presidente desde o seu
retorno a Brasília, na fase aguda da turbulência, quando o vereador Carlos
Bolsonaro (PSC-RJ) foi a público chamar Bebianno de “mentiroso”. Naquela hora,
Bolsonaro já havia gravado entrevista para a televisão endossando as acusações
do filho.
Heleno recebeu Bolsonaro na Base Aérea, e o acompanhou até o
Alvorada, de onde saiu horas depois. No dia seguinte, uma quinta-feira, o
general Santos Cruz chegou às 8 horas para despachar com Bolsonaro no Alvorada,
e uma hora depois foi a vez do general Heleno. Na sexta-feira, a reunião que
selou o destino de Bebianno contou com Heleno e Mourão, que foi acionado quando
estava a caminho do Palácio do Jaburu, retornando de uma agenda no Mato Grosso.
Era o segundo despacho de Heleno com Bolsonaro naquele dia.
No entorno de Bolsonaro, a intervenção dos generais na
gestão da crise política foi comparada ao exercício do poder moderador, a
principal novidade da Constituição do Império, outorgada por dom Pedro I em
1824. Tratava-se de um quarto poder que se sobrepunha e arbitrava eventuais
divergências entre o Executivo, Legislativo e Judiciário. Era a “chave de toda
a organização política”, dispunha o texto constitucional.
O poder moderador era privativo do imperador, a quem cabia
nomear e demitir livremente os ministros, e até mesmo dissolver a Câmara dos
Deputados. Entre 1824 e 1889, dom Pedro I e dom Pedro II invocaram o quarto
poder 12 vezes para dissolver a Câmara – em média, uma vez a cada cinco anos.
Inspirado nas ideias do pensador franco-suíço Henri-Benjamin
Constant de Rebecque, o poder moderador foi concebido para que o soberano
mediasse e evitasse o choque entre os poderes. A proposta era velar pela
independência, equilibrio e harmonia dos outros três poderes. Passados 195 anos
da Constituição do Império, o quarto poder agora é atribuído aos generais. Com
interlocução de respeito e confiança com o presidente, os oficiais
investiram-se da missão de zelar pela estabilidade do governo. Uma das
condições era de que o presidente botasse limites na ingerência dos três filhos
mais velhos – Flávio, Carlos e Eduardo – sobre o governo.
“Os generais Heleno e Santos Cruz são os sustentáculos do
Bolsonaro no palácio”, afirma um oficial com trânsito na cúpula do governo. A
afinidade e a sintonia entre ambos – dois ex-comandantes das forças de paz da
ONU no Haiti – somadas à proximidade de Bolsonaro, os credencia, segundo este
oficial, como conselheiros presidenciais no cenário de instabilidade, num
momento em que o governo precisa consolidar a formação da base parlamentar e
concentrar-se na votação da reforma da Previdência.
Os generais Hamilton Mourão e o ex-comandante do Exército
general Eduardo Villas Bôas – que já começou a despachar no Planalto, na equipe
do general Heleno – despontam como forças auxiliares na missão encabeçada por
Heleno e Santos Cruz. Na sexta-feira, Mourão declarou, após uma solenidade em
Sorriso (MT), que “os filhos são um problema de cada família”, e que Bolsonaro
saberia impor limites. “Tenho certeza de que o presidente, em momento aprazado
e correto, vai botar ordem na rapaziada dele”.
Até agora, entretanto, o chefe do Executivo resiste ao
quarto poder. Apesar da articulação dos generais para evitar ou adiar a
demissão de Bebianno – cenário que prevalecia até a tarde de sexta-feira – a
implosão provocada por Carlos Bolsonaro culminou na baixa do soldado. “As
consequências virão depois”, era a advertência que ecoava de um núcleo militar
do governo no fim de semana.
Na entrevista concedida na quarta-feira, Bolsonaro colocou-se
ao lado dos filhos. “Parte da mídia tenta me jogar contra meus filhos e meus
filhos contra mim, não existe isso”, rechaçou. Os sinais até agora são de que
os filhos estarão cada vez mais presentes nas articulações governistas. Após a
mediação dos generais, Carlos baixou o tom nas redes sociais, mas continua
gerenciando as contas de Bolsonaro.
O senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) – sem cargo de liderança, e ainda implicado na investigação do Ministério Público do Rio de Janeiro sobre o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) – tornou-se assíduo em reuniões no Planalto. Na quinta-feira, Flávio participou de reunião para discutir a reforma da Previdência com Onyx Lorenzoni, o general Santos Cruz e o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL). Na sexta-feira, Flávio acompanhou o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (PSL-AP), na primeira audiência com Bolsonaro após sua eleição.
O senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) – sem cargo de liderança, e ainda implicado na investigação do Ministério Público do Rio de Janeiro sobre o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) – tornou-se assíduo em reuniões no Planalto. Na quinta-feira, Flávio participou de reunião para discutir a reforma da Previdência com Onyx Lorenzoni, o general Santos Cruz e o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL). Na sexta-feira, Flávio acompanhou o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (PSL-AP), na primeira audiência com Bolsonaro após sua eleição.
Por fim, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-RJ) articula para
ser eleito presidente da Comissão de Relações Exteriores na Câmara. O cargo o
credenciará para acompanhar as viagens internacionais do presidente: Estados
Unidos e Israel estão no horizonte. Eduardo também é padrinho de dois
assessores palacianos: o secretário de Comunicação Social, Floriano Barbosa, e
o subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Jorge Antônio de Oliveira, que
antes despachavam em seu gabinete.
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