É possível que no
dia em que aceitou o convite do então presidente eleito Jair Bolsonaro para
ocupar o Ministério da Justiça, com poderes sobre o Conselho de Controle de
Atividades Financeiras (Coaf), vital para rastrear lavagem de dinheiro, e para
fazer um pacotaço de combate a todo tipo de crime, o juiz Sérgio Moro tenha
pensado, lá no fundo, que dizer sim o tiraria de uma brilhante carreira na
magistratura, mas o alçaria à condição de uma das principais figuras da
República. Valeria o risco.
No mesmo dia em que
disse sim ao convite de Bolsonaro, um sem-número de analistas políticos, este
repórter também, se concederam a liberdade de achar que Moro ganhava, naquele
momento, condições políticas para se tornar um presidenciável para as eleições
de 2022. Só uma vaga no Supremo Tribunal Federal era muito pouco para a
importância de Moro no protagonismo dos acontecimentos políticos anteriores à
eleição de Bolsonaro. Recordemos alguns: o comando da Operação Lava Jato na
parte referente à Justiça, o vazamento do conteúdo de um telefonema da então
presidente Dilma Rousseff para Lula, peça mais do que chave para o sucesso do
impeachment da petista, e a decretação da prisão do ex-presidente, principal
líder político do PT e único que, de acordo com as pesquisas sobre intenção de
votos, bateria o capitão.
Sem falar que, se
Lula, segundo as pesquisas, era o único nome que venceria Bolsonaro, Sérgio
Moro, de acordo com essas mesmas pesquisas, era o único que bateria Lula.
Acontece que a
política é alimentada por rasteiras, conchavos, recuos, alianças que viram ao
sabor do vento, vitórias, derrotas, alegrias e decepções.
É possível que hoje,
quatro meses e alguns dias depois de assumir a pasta da Justiça, de apresentar
em tempo recorde um pacote de medidas para o combate ao crime organizado, ao
crime violento, ao crime de corrupção e tantos mais, Sérgio Moro esteja um
pouco decepcionado. Para quem se acostumou aos trâmites do Judiciário, em que
uma decisão ditará o futuro de uma pessoa, independentemente de ser essa pessoa
um importante empresário, um ex-presidente da República ou um ladrão de
galinhas, os escaninhos da política podem não ser compreendidos. Neles, uma
decisão não é para ser cumprida à risca. Vai depender do momento, dos humores,
de taxas de popularidade e de rejeição.
Nesse sentido, Moro
tem enfrentado muitos percalços. Além do risco de ficar sem o Coaf, e não ver o
presidente Bolsonaro defender com clareza a permanência do conselho na Justiça,
Moro teve de mastigar sapos. Um que mexeu com a autoridade do ministro foi a
ordem que recebeu de Bolsonaro para desconvidar a cientista política Ilona
Szabó, especializada em estudos sobre a segurança pública, para ocupar uma
suplência do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. O
presidente implicou com ela ao saber que fora ativa na campanha contra sua
candidatura.
Outro exemplo:
Bolsonaro prometeu isentar de pena produtores rurais que atirarem contra
invasores de terra, apesar do que estabelece o Código de Processo Penal. Moro
não teve alternativa a não ser dizer que a discussão sobre armas no campo ainda
é prematura.
Em resumo, enquanto
o pacote anticrime do ministro da Justiça dorme nas gavetas do Congresso,
porque o Congresso tem a reforma da Previdência como prioridade, pautas
periféricas vão ocupando a vida dele, envolvendo-o numa teia que não é sua.
Moro sabe que a
sobrevivência política dele depende da aprovação do pacote anticrime e, depois,
que os efeitos das novas regras sejam sentidos pelos cidadãos. Se ficar ocupado
com coisas de menor importância, como as promessas de Bolsonaro sobre a
liberação de armas, será engolido.
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