O general Mourão faz um tipo singular de
vice-presidente. De Itamar Franco (governo Fernando Collor) a Michel Temer
(gestão Dilma Rousseff), não falar parecia fazer parte da liturgia do cargo
(sim, um deles, ao final, conspirou, mas isso é outra história). Mourão é ponto
fora da curva: o vice versa e muito. Sem discrepar das diretrizes principais do
governo, tem feito um contraponto sensato aos rompantes erráticos e
conceitualmente inconsistentes do titular.
Há alguma vantagem em se ter um vice que fala: não é o
perfil de conduta de um conspirador (não dizem que todo vice é um conspirador
em potencial?). Ninguém sabe o que o calado quer, mas o que Mourão quer é fácil
ver: destacar o papel que as forças armadas pretendem desempenhar nesse momento
de instabilidade.
A visibilidade que o general adota parece atender a
objetivos complementares: um, representar o compromisso dos militares com suas
atribuições constitucionais, ressaltar seu desapreço a aventuras alheias à
normalidade democrática. O outro, mais pessoal, é dar ao país a tranquilidade
de que, no limite, ele pode ser um elemento de equilíbrio e aglutinação.
E aí se percebe por que a desenvoltura de Mourão tanto
incomoda ao presidente e ao guru de seus filhos, um excêntrico astrólogo que
vende cursos online de filosofia: a maturidade e fundamentação da fala do vice,
concorde-se ou não com ele, expõe ainda mais as inclinações sombrias do titular
em sua atração inconsciente pelo caos.
Sim, temos uma espécie de “governo de oposição”, que age no
espaço da negação: na Educação, combate os professores. Na Cidadania, as
minorias. No Meio Ambiente, a preservação. Na diplomacia, o globalismo. Uma
plataforma paradoxal, que se volta contra a vocação das próprias pastas. E só
há dois tipos de ministros, hoje: os que mandam em quase tudo e os que não mandam
em quase nada. Onde está o ponto de equilíbrio do governo? Fácil: nos
militares.
O que falta a Bolsonaro para tornar irrelevante a frenética
movimentação institucional de seu vice-presidente é simples: competência. É um
homem capaz de procurar microfones para, num dia em que as manchetes se referem
13,4 milhões de desempregados, informar que vai propor a destituição de Paulo
Freyre como Patrono da Educação!
A ele falta tudo: leitura, intuição, trato, timing,
liderança, approach. Aquilo que foi sua força na campanha eleitoral – uma
sincera identificação com o chamado homem comum – é sua maior fragilidade no
exercício do poder. Nessas condições, um vice-presidente não precisa fazer
muito esforço para se tornar ponto de referência.
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