CPMF não era ideia só de Marcos Cintra
A nova CPMF não era uma ideia apenas do ex-secretário da
Receita Marcos Cintra, demitido ontem. O próprio ministro Paulo Guedes a
defendeu na entrevista que concedeu ao “Valor” esta semana e até revelou que
foram feitas simulações de arrecadação em cada alíquota. O problema é que esta
reforma vem sendo anunciada antes de ser formulada. Vários assessores do
ministro também falaram do assunto.
No evento do BTG Pactual, o ministro Paulo Guedes disse que
tinha escolhido Marcos Cintra para dar uma sinalização clara de redução e
simplificação de impostos. Não conseguiu dar esse sinal. Cintra é visto como o economista de uma nota só. Ele sempre defendeu o imposto único, o
que nunca convenceu a maioria dos economistas e tributaristas. A ideia é vista
como um equívoco.
Mesmo assim ele foi escolhido para fazer a proposta de
reforma tributária. Desde o princípio ele contava com a volta da CPMF como um
embrião de um imposto único. Inicialmente substituiria a contribuição patronal
para a Previdência. Depois, a ideia era subir a alíquota para eliminar outros
impostos. Quando eu entrevistei Marcos Cintra em abril, ele disse que o imposto
cobriria uma arrecadação previdenciária de R$ 300 bilhões. Esta semana o
ministro Paulo Guedes falou em R$ 150 bilhões.
Na entrevista para a jornalista Claudia Safatle, do “Valor”,
o ministro Paulo Guedes chamou o tributo de Imposto sobre Transações
Financeiras (ITF). “Tem uma escadinha na proposta de reforma que é assim: se
quiser 0,2% de imposto pode baixar a desoneração da folha para 13%, se quiser
pagar 0,4% você já consegue derrubar a CSLL, se quiser pagar 1% você acaba com
o IVA.” Defendeu o imposto porque todos pagariam. “Sonegadores pagam,
traficantes de droga pagam.” Sobre a posição contrária do presidente Bolsonaro,
Guedes disse que na reforma da Previdência o presidente inicialmente não
gostava. Depois definiu o tributo: “É feio, é chato, mas arrecadou bem por 13
anos.”
Portanto, mesmo que inicialmente fosse uma ideia de Cintra,
ela passou a ser defendida pelo próprio ministro, de forma explícita. E sobre
ela falava-se abertamente na Secretaria de Política Econômica. O secretário
adjunto da Receita, Marcelo Silva, detalhou-a na terça-feira. Na ocasião,
referiu-se inclusive a um fato que nunca ocorreu: “O ministro Delfim Netto, na
época que era ministro da Fazenda, usava a arrecadação da CPMF, que era de 10
em 10 dias, para calcular o PIB de forma rápida e mais acurada”. Impossível. A
CPMF foi criada quase uma década depois que Delfim deixou de ser ministro.
A afirmação do presidente Bolsonaro em sua conta no Twitter
de que a “tentativa de recriar CPMF derruba chefe da Receita” não faz sentido.
Cintra não caiu por causa da CPMF, ou pela maneira como estava se dando a
comunicação da reforma tributária. Já que se falava nela abertamente, e todos
falavam. E não é de hoje.
Uma reforma como esta, desta gravidade e importância, não
pode ser tocada de ouvido e ser divulgada antes de estar madura. É preciso
apresentá-la com simulações confiáveis. Um erro e aumenta-se a carga tributária
ou derruba-se a arrecadação. As empresas precisam se planejar para o ano
seguinte. Como fazer isso se a cada dia sai uma notícia diferente sobre
tributos? Será ou não criado o imposto sobre dividendos? O governo também falou
várias vezes em acabar ou reduzir as deduções da pessoa física. Há muito ruído
no assunto.
Há um mês, o presidente Bolsonaro reclamou com Marcos Cintra
que a Receita estaria perseguindo a sua família. Depois, disse publicamente que
a Receita estaria fazendo uma “devassa” na sua família e que tinha feito isso
na campanha na vida financeira dele. O risco é ele fazer agora uma escolha para
o cargo por razões familiares. Para o BNDES foi um amigo dos filhos, quando
caiu Joaquim Levy. Para a Polícia Federal ensaia-se também a escolha dos
filhos, se cair Maurício Valeixo.
No Congresso, dois projetos tramitam, um na Câmara e outro
no Senado. Eles tratam apenas da criação de um Imposto sobre Valor Agregado,
juntando IPI, PIS, Cofins, ICMS, ISS. O governo proporia um IVA dual, que
fundiria num primeiro momento os impostos federais. E depois a eles se
juntariam o estadual e o municipal quando houvesse acordo sobre como recolher e
como distribuir.


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