Tudo indica que há uma maioria consistente no Congresso para
alterar a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de autorizar a prisão de um
réu apenas após o trânsito em julgado do processo. Mas a aprovação da prisão em
segunda instância, que a pressão da opinião pública pede, não se dará sem troca
de concessões.
Deputados estão convencidos de que não é possível resistir
ao clamor das ruas, mas querem proteção contra delações premiadas no pacote
anticrime do ministro da Justiça, Sérgio Moro.
As mudanças, já aprovadas por um grupo de trabalho,
pretendem deixar claro que as delações são instrumentos para obtenção de prova,
não podendo ser utilizadas como a única prova para incriminar alguém. Não é
novidade, mas não está em lei alguma. A definição já foi feita pelo Supremo
Tribunal Federal (STF), e consta de cartilhas do Ministério Público Federal.
Querem também proibir os juízes de decretarem de oficio
medidas cautelares sem que haja solicitação de autoridade policial ou do
Ministério Público. Mesmo assim, para impor essas medidas, desde prisão até
proibição de saída noturna ou uso de tornozeleira, o juiz terá que demonstrar
que não é cabível uma medida mais branda, devendo a decisão ser baseada em
provas do crime, indícios de autoria e comprovação de perigo em função de
manter o acusado em liberdade.
O acordo e os depoimentos deverão ser mantidos em sigilo até
o recebimento da denúncia ou da queixa-crime, não tendo o juiz mais o poder de
divulgá-los.
O ex-presidente Lula está prestes a provar o gosto amargo de
uma derrota que poderá representar sua volta para a cadeia. Com a probabilidade
aumentada de o Congresso aprovar a prisão em segunda instância, Lula tem se
esforçado nos bastidores para conseguir votos para manter a decisão do Supremo
Tribunal Federal de só permitir a prisão após o trânsito em julgado.
Para se transformar em alternativa viável para a campanha de
2022, não basta a Lula, porém, recuperar a capacidade de mobilização popular,
que, no momento, parece abalada. Terá que lutar contra a prisão em segunda
instância, e também contra a Lei da Ficha Limpa.
No caminho tortuoso da política, uma coisa tem a ver com
outra, embora a primeira seja da esfera criminal, e a outra da eleitoral. Nada
impede que a lei eleitoral exija como condição para ser elegível que o
candidato não tenha condenação por órgão colegiado, e que a prisão só seja
permitida com o trânsito em julgado do processo.
Mas a defesa de Lula pretende argumentar que se a culpa só
se verifica no final de todos os recursos, por que um candidato pode ser
barrado quando ainda tem recursos aos tribunais superiores? É a mesma coisa de
argumentar que se uma pessoa pode votar aos 16 anos, por que não pode beber ou
dirigir automóvel?
Além dessas atribulações, o ex-presidente tenta adiar uma
eventual nova condenação em segundo grau, desta vez no caso do sítio de
Atibaia. O julgamento no TRF-4 está previsto para amanhã, mas é possível que o
processo retorne à primeira instância, graças à decisão do STF de que os
delatores devem se pronunciar nas alegações finais antes dos demais réus.
Como essa norma nunca existiu, quando a juíza Gabriela Hardt
condenou Lula a 12 anos e 11 meses de prisão por corrupção e lavagem de
dinheiro no processo do sítio, a defesa de Lula se pronunciou ao mesmo tempo
que os delatores, que denunciaram que as obras foram feitas pelas empreiteiras
Odebrecht e OAS em pagamento de favores em licitações.
Se as alegações finais tiverem que ser refeitas, o processo
retrocede cerca de 11 meses, dando mais tempo para Lula. Mas, antes de 2022,
alguns acontecimentos já com data marcada necessariamente serão obstáculos à
sua tentativa de se candidatar novamente à presidência da República.
Em novembro de 2020, se aposenta compulsoriamente o ministro
Celso de Mello, ao completar 75 anos. No ano seguinte, será a vez do ministro
Marco Aurélio Mello. Ambos são contra a prisão em segunda instância, e serão
substituídos por ministros indicados pelo presidente Jair Bolsonaro. Além
disso, o ministro Luis Fux, favorável à prisão em segunda instância, assumirá em
setembro do ano que vem a presidência do STF, para um mandato de dois anos.
Provavelmente por isso Lula pela primeira vez semana passada
admitiu que pode não se candidatar: “Terei 75 anos até lá, a Igreja, na sua
sabedoria, aposenta seus cardeais ao 75 anos
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