Tudo embolado: o julgamento da restrição aos dados da
Receita e do Coaf, a reviravolta na prisão em segunda instância, o pacote
anticrime empacado. E é por isso que o presidente do Sindifisco, advogado e
engenheiro mecatrônico Kleber Cabral, adverte, dentro e fora do País, para os
graves efeitos dessa investida não mais apenas contra a Lava Jato, mas contra
todos os avanços no combate à corrupção e à lavagem de dinheiro.
“Essa é a percepção generalizada e qualquer decisão que
restrinja o trabalho da Receita e o compartilhamento de dados de órgãos de
controle tem impacto inclusive no desenvolvimento. Se o Brasil for carimbado
como ‘não cooperativo’ no combate a ilícitos, isso será um forte obstáculo aos
investimentos internacionais”, diz ele.
O Sindifisco, Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais, já
entrou com representações em quatro órgãos internacionais para denunciar e
tentar brecar os avanços contra os órgãos de controle, Receita, Polícia Federal
e UIF (Unidade de Inteligência Financeira, ex-Coaf). E esses ataques não se
limitam a apenas um Poder.
Além dos julgamentos do Judiciário sobre segunda instância e
compartilhamento de dados, há também decisões do Executivo e do Legislativo
atravancando todo um processo que havia jogado luzes positivas sobre o Brasil,
criando uma expectativa do fim da impunidade e uma onda de confiança nos
brasileiros. Com tudo isso em risco, a decisão do Congresso sobre segunda
instância também se torna crucial. A ver.
Não apenas os recuos no combate à corrupção, porém,
preocupam, incomodam, irritam. Um professor universitário xingado de “macaco” e
esfaqueado na rua por ser negro em plena semana da Consciência Negra? Um
deputado federal vandalizando uma exposição contra o racismo? Um outro falando
em “negrinhos bandidinhos”?
Depois da ditadura, destampou-se no Brasil a panela de
pressão política e o vapor da democracia trouxe ao ambiente os grupos,
interesses e confrontos tão reprimidos em duas décadas. A unidade de esquerda,
centro e parte da direita para recuperar a normalidade perdida foi aos poucos
cedendo terreno às divergências e nuances próprias das democracias.
Agora, o fim da era PT com a sucessão de mensalão e petrolão
destampou uma nova panela de pressão: o que há de pior na pior direita, o
discurso assassino das armas, a falsa religiosidade que rouba dos pobres e
infelizes, a crueldade contra negros e a comunidade LGBT, a posição retrógrada
sobre gênero disfarçada como defesa da família. Os recuos no combate à
corrupção e essa barafunda vieram acompanhados de retrocessos em Meio Ambiente,
Cultura, Direitos Humanos, pesquisa, educação, política externa. E não se fala
aqui do governo, ou não apenas do governo, mas de toda uma classe média que
saiu do armário para se assumir armamentista, racista, homofóbica… cruel.
Em meio à balbúrdia, sobressai-se o Ministério da Economia
de Paulo Guedes. Ele e Rodrigo Maia trazem racionalidade a um ambiente de
preocupante irracionalidade, mas eles podem muito, não podem tudo. A economia
tem enorme peso na política e os índices inegavelmente favoráveis escamoteiam
os demais problemas, mas a economia também depende da política, da percepção,
dos ventos e da sociedade, tanto quanto a sociedade depende da economia.
O Brasil é um país imenso, amistoso, cheio de
potencialidades, que tem tudo para se desenvolver e incluir os milhões de
miseráveis que sobrevivem por aí não se sabe como. Mas, para isso, é preciso
andar para frente, não para trás. Avançar na economia, no combate à corrupção,
na igualdade de oportunidades, no respeito às diferenças, na dignidade de
todos, não importa o sexo, a cor, a religião, o saldo bancário. Aliás,
princípios básicos de humanidade.
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