O presidente Jair Bolsonaro queria encontrar algo
escandaloso no BNDES para justificar o discurso de campanha, a demissão
espalhafatosa de Joaquim Levy e a nomeação de um amigo dos filhos para o banco.
Gustavo Montezano foi com a missão de encontrar a tal “caixa-preta” para
alegrar o chefe. Não encontrou por vários motivos. Um deles é que o BNDES vinha
aumentando o grau de transparência nas últimas gestões. A auditoria pode ter
encontrado tudo no lugar nos seus pormenores, mas uma visão mais ampla sempre
mostrará que custaram muito caro os erros dos governos do PT no BNDES.
O Tesouro se endividou em R$ 500 bilhões a juros altíssimos
para transferir para o BNDES e ele emprestar para as empresas a taxas mais
baixas. Os beneficiários dos maiores créditos foram escolhidos com o delírio
dirigista que repetia a mesma ideologia da ditadura militar de subsidiar o
capital para que ele fosse a alavanca do crescimento do país.
As operações com o grupo J&F foram escandalosas. Mesmo
que não houvesse corrupção —e houve, pelo que disse Joesley Batista —elas
teriam sido. Os delatores do grupo disseram que não houve ato errado dos
funcionários. Os servidores dizem que seguiram as diretrizes dadas por seus
superiores. Como foram várias dessas operações? O grupo emitia debêntures, o
banco comprava uma grande parte ou quase tudo. Com o dinheiro em caixa, a
companhia adquiria ativos no exterior.
No caso da Pilgrim’s Pride, 99,9% do capital da aquisição
foi do BNDES. Isso é escandaloso em si. Qual o sentido de usar o dinheiro
subsidiado — fruto de endividamento público ou vindo de poupança compulsória do
trabalhador (o FAT) — para que um grupo familiar fique muito mais rico e gere
empregos e renda no exterior? Claro que a empresa pode fazer isso, mas não com
dinheiro público. O resultado foi que o JBS ficou com mais ativos fora do que
aqui dentro. A administração Maria Silvia impediu que o grupo transferisse sua
sede fiscal para a Irlanda. Isso, se consumado na época, seria o golpe final no
bolso do contribuinte.
Jair Bolsonaro errou porque quis perseguir o banco correndo
atrás de uma caixa preta. Ele não tem muito apetite para se debruçar sobre
temas complexos, por isso se esconde atrás do biombo de que não entende de
economia. Queria apenas comprovar a frase da campanha. Ficou agora numa
situação vexaminosa. Prometeu abrir a tal caixa-preta. Atropelou o ministro
Paulo Guedes na demissão de Joaquim Levy. E agora, nada encontrou. Só lhe
restou levantar mais uma suspeita difusa.
Uma auditoria olha os registros do banco, os processos que
são seguidos nas análises de risco das operações, a avaliação da qualidade do
crédito, os documentos exigidos pela burocracia de uma instituição estatal. O
que isso mostra? Que as operações foram corretas do ponto de vista formal. Os cálculos
nunca incluem o custo de oportunidade. Ou seja, qual o ganho para o país se o
dinheiro fosse aplicado, com transparência e fiscalização, em saneamento, por
exemplo?
Qual o tamanho do subsídio com essas e outras opções? Isso
era necessário saber. Não por briga política, mas para que o país não cometa os
mesmos desatinos.
Montezano disse ontem que não foram encontradas ilegalidades
em operações do BNDES, nem nessas nem em outras. A verdade é que há vários
erros. Os empréstimos concedidos para obras de empreiteiras, principalmente a
Odebrecht, em outros países que foram escolhidos não pela capacidade de
pagamento do crédito, mas pela ideologia do governo em questão. A compra de
ações do frigorífico Independência, que quebrou meses depois do aporte de capital.
Tudo ficou depois resolvido porque o JBS comprou o frigorífico quebrado.
Empréstimos concedidos ao grupo Bertin que à beira da falência foi comprado
pelo JBS. O TCU analisou todas essas operações envolvendo o JBS e calculou as
perdas do banco em cada uma delas. As contas estão expostas no site do
Tribunal.
O passo mais importante para acabar com os benefícios do
dinheiro barato para empresas favoritas foi a criação da TLP no governo Michel
Temer. O erro do governo Bolsonaro é tratar o assunto sem a profundidade que
ele exige. Criou a expectativa de que conseguiria revelar algum grande segredo,
mas a verdade já era bem conhecida.
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